Crise hídrica gera prejuízos no agronegócio e compromete abastecimento no Sudoeste

Aline Vezoli*

A falta de chuvas que o Paraná vem enfrentando desde 2019 gera perdas em áreas importantes para a economia. A seca, que deve continuar até o fim de 2021, fez com que as Cataratas do Iguaçu registrassem nos dias 9 e 10 de junho, sua menor vazão do ano, levando imagens para a internet que retratam a situação enfrentada pelo estado.

Em maio, o Governo do Paraná decretou situação de emergência hídrica para o Sudoeste e para a Região Metropolitana de Curitiba, após ser registrado o mês de abril mais seco da história em várias cidades dessas regiões. O decreto tem validade até agosto, quando completa 90 dias. A iniciativa busca agilizar processos para garantir o abastecimento e qualidade da água consumida.

Também em maio, o Sistema Nacional de Metereologia (SNM) emitiu pela primeira vez um alerta de emergência hídrica para a Bacia do Paraná, prevendo chuvas abaixo da média entre junho e setembro. A área afeta além do Paraná, os estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais.

Após esse alerta, a Agência Nacional das Águas (ANA) publicou uma resolução no Diário Oficial da União, na edição extra de 1º de junho, declarando a situação crítica de escassez dos recursos hídricos na Região Hidrográfica do Paraná até 30 de novembro.

Segundo a ANA, a medida foi tomada “com o objetivo de reconhecer a situação crítica, e subsidiar a adoção de medidas temporárias para assegurar os usos múltiplos da água e buscar a segurança hídrica, podendo ser adotadas medidas como regra de operação temporárias com o intuito de preservar o volume dos reservatórios”. A agência garante que nesse momento não há necessidade de restrição para o uso na irrigação e abastecimento humano.

Sete dos principais reservatórios de hidrelétricas da região estavam, em 1º de maio, com seu pior nível desde 1999, enquanto os demais estavam com níveis entre os cinco piores do período. Os setores que podem sentir o impacto da escassez de água de forma mais rápida, segundo o documento da ANA, são a geração hidrelétrica, turismo, lazer e navegação.

Inverno é o período mais seco

A estação mais fria do ano também é caracterizada pelos menores valores de precipitação acumulada de chuva em diversas regiões do estado. Segundo o Sistema de Tecnologia e Monitoramento do Paraná (Simepar), os meses de julho e agosto são os mais secos do ano e apenas a partir da segunda quinzena de setembro, as chuvas começam a apresentar alterações em seu regime típico de inverno.

Medidas tomadas

A chegada do período de estiagem causado pelo inverno intensifica a crise hídrica já presente em todo o estado. A região do Sudoeste, por exemplo, registrou o maior déficit nas precipitações em abril, quando rios e poços apresentaram redução entre 25% e 60% na quantidade de água disponível para abastecimento.

Para adotar medidas que possam diminuir os impactos da crise, a Sanepar trabalha na ampliação da distribuição de água e no reforço dos sistemas de abastecimento. Os municípios de Pranchita e Santo Antônio do Sudoeste vem enfrentando rodízio de abastecimento, essa medida também está sendo realizada na Região Metropolitana de Curitiba. A assessoria de imprensa da Sanepar afirmou que “a companhia tem um protocolo de gestão de crise que é acionado quando a situação apresenta indicadores irreversíveis. Somente na região do Sistema de Abastecimento de Água Integrado (SAIC), área mais afetada pela crise hídrica, foram realizadas cerca de 20 ações que trouxeram quase 50 bilhões de litros de água ao sistema, sem essas medidas, teria entrado em colapso no mês de novembro de 2020”.

Segundo a Sanepar, a forte estiagem no estado registrou os períodos de março e abril mais secos dos últimos 20 anos e é a maior seca da história do Paraná, por isso, estão investindo em melhorias do sistema em todo o Estado, ampliando a capacidade de produção e preservação, com o intuito de minimizar o impacto da crise. “Os investimentos no setor e melhoria das redes de água e esgoto registraram crescimento, entre 2016 e 2020 foram investidos R$ 4,6 bilhões em sua área de atuação, que abrange 345 municípios”.

A companhia também cita o envolvimento de vários órgãos para diminuir os impactos e a necessidade da população reduzir os gastos de água, orientando um consumo consciente, priorizando o consumo humano e de animais e realizando ações básicas, como diminuição do tempo de banho, reutilização de água para limpar pisos e quintais, fechar torneiras ao lavar a louça, verificar as instalações hidráulicas do imóvel para identificar vazamentos, entre outros.

Impactos na conta de energia elétrica

A escassez de chuva e aumento da crise hídrica, além de elevar as chances de rodízios de água, pode encarecer a conta de energia elétrica. Todos os anos, as concessionárias de energia podem realizar um reajuste, determinado pela Aneel, com base nos custos e investimentos realizados ao longo do ano. A Copel realiza esse reajuste no mês de junho, e à crise hídrica deve impactar no cálculo do reajuste. No entanto, até o momento, o valor ainda não foi anunciado.

Agronegócio

A abundância de água faz do Paraná uma região muito importante para o agronegócio, e como em outros setores, a falta de chuva dos últimos anos já mostra os impactos negativos sofridos pelos agricultores.

De acordo com ANA, “o Brasil usa em média 50% da água captada nos rios para irrigação”. Também foi apontado como um problema para o setor que o período de seca “elevou os preços das commodities, aumentando o valor das rações usadas pelos criadores”.

O técnico agrícola do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento (Seab), Ivano Carniel, comenta que os maiores impactos da crise foram sentidos na safra de 20/21. Na primeira safra de milho a queda de produtividade foi de 30%, enquanto a produtividade da soja caiu 7%, “mas a situação contundente ficou evidenciada na segunda safra, com o ciclo de estiagem a partir de fevereiro.

O milho da segunda safra ainda será colhido, mas segundo ele, há uma estimativa de perda em torno de 50%, pois além da estiagem, também houve geadas e ataques da cigarrinha, “vamos esperar a colheita para ter certeza do rendimento”. O técnico conta que devido à estiagem, muito produtores preferiram destinar o milho para fazer silagem para o gado.

A cultura do feijão também sofreu com os efeitos da falta de chuva na região durante a segunda safra, onde a queda de produtividade registrada foi de 45%.

Com o início da safra de inverno, Carniel afirma que as chuvas da última semana vão fornecer condição ao desenvolvimento inicial das culturas, mas que “ainda tem o desenvolvimento de toda a safra e se a condição de estiagem continuar, por mais que o produtor não deixe de plantar, vamos enfrentar problemas mais para frente.

Produção de leite

Segundo Carniel, a queda na produção de leite começou a se acentuar a partir da estiagem de fevereiro, com diminuição entre 10% a 15% na captação de leite ao mês, desde março. A queda é explicada pelo técnico, que afirma acontecer porque “o período de estiagem fez com que as condições não fossem favoráveis para o desenvolvimento das pastagens naturais, e o período também é de transição de pastagens, onde o produtor passaria a ter a partir de maio a oferta de aveia e isso não foi possível porque não desenvolveu”.

Com pouca condição de fazer silagem, e os custos altos da ração, a atividade não era compensatória para o produtor. “Observamos que muitos produtores, principalmente de menor suporte, desistiram da atividade”.

Sem abastecimento

Outra questão levantada por Carniel é a diminuição acentuada do lençol freático e um grande número de propriedades da região que ficaram sem abastecimento de água. “Muitas fontes secaram e esses produtores enfrentam problemas no fornecimento de água para os animais e até para consumo próprio”.

Sem o abastecimento de água, algumas propriedades rurais dependem das prefeituras municipais que dispões de caminhões pipa para entregar água potável. Ações como essas são possíveis devido ao decreto de emergência no estado, que autoriza órgãos competentes a empregar recursos humanos e materiais, veículos e equipamentos para auxiliar nas operações de abastecimento humano e dos animais. Segundo a Agência Estadual de Notícias, outra medida para conter a crise é que “as empresas que prestam serviços de saneamento nessas regiões ficam autorizadas a executar rodízios de 24 horas, desde a interrupção até a retomada do abastecimento com prazo para normalização dentro de 24 horas”.

*Com supervisão de Marcilei Rossi

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