Estamos cansados é verdade, em muitos pontos da existência humana não vemos com clareza uma amanhã melhor, quando muito rezamos apenas para estarmos vivos me com novas esperanças no ar, sim a esperança nunca não nos abandona, mesmo que o mundo venha a se desmoronar, mesmo que sozinhos não possamos mudar grande coisa, mesmo que aqueles nos quais depositamos nossa confiança não façam seu trabalho a contento temos de ir adiante, temos que lutar, encontrar forças, seguir o nosso caminho. É graças a tantas pessoas que no seu silêncio continuam a jornada da vida que estamos aqui hoje, embora o frenesi do mundo tentar nos confundir a todo instante precisamos estar ainda mais atentos e vigilantes; a vida mudou drasticamente em apenas alguns anos, uma vontade quase ensandecida por um futuro melhor, mergulhou tudo e todos num caos doido.
Quem de nós conscientemente, pode ficar indiferente para com as guerras estúpidas que aí estão, quem de nós pode ficar tranquilo, quando sabemos que nesse exato instante tantas vidas se foram apenas pela imbecilidade humana de ter mais, ser mais, acumular mais, como podemos rir a contento quando sabemos de viva voz que milhões e milhões são lesados assim sem mais nem menos todos os dias? Lesados economicamente, nosso meio ambiente agredido sistematicamente, maldades de crueldade absurda inundam nosso cotidiano e de tão corriqueiras que passaram a ser, nem ligamos mais. A indiferença parece estar ganhando o jogo, ela tem armas poderosas e também muito sutis para desviar a nossa atenção, não precisamos ir longe para disso termos conhecimento, cada um de nós sente isso facilmente no cotidiano mais insosso que possa existir, somos o que somos apenas.
As beatas certezas de hoje de tão badaladas que são, não deixam de trazer dentro de sim muitas incertezas, pouco ou nada se fala de um projeto inovador que possa resgatar-nos da barbárie nua e crua, somos quando muito meros sonâmbulos expectadores de que nos chegue mais mercadorias, essas na maioria das vezes sempre da pior qualidade, democracia parece ser uma palavra cada vez mais gasta pelo tempo e dita por pessoas que realmente não tem nada mais a dizer sobre ela, os pequenos e novos deuses estão a nossa disposição, nos dão um sentido inverso ao que realmente gostaríamos de ter nas mãos, eles nos deixam com a falsa impressão de que somos fortes, mas que na verdade nos deixam a cada dia que passa mais fracos e vulneráveis; temos entre nós muitos que são mestres apenas superficiais em sua profundidade, são os tais cegos guiando cegos.
A era quase bestial das contradições se faz presente de modo inequívoco entre nós, ao invés de estarmos mais conectados com o nosso mundo aqui agora, à realidade que nos circunda, preferimos ir para Marte ou até mais longe se conseguirmos, a intensa urbanização, o uso indiscriminado da técnica, as constantes brincadeiras dos humanos em se tornarem pequenos deuses está mudando a nossa percepção das coisas, somos muito bons em sermos ambivalentes ao extremo, isso não nos envergonha mais, bem nos disse recentemente Luiz Felipe Pondé, “onde o século XXI coloca as suas mãos, tudo morre num instante, vira pó”, nossas leituras que deveriam ser essenciais para esse momento crucial, estão devidamente mortas, enterradas e sem chance de ressurreição; adultos infantis em profusão, é o novo reino da solidão barata, alcançável por qualquer um que queira ser bom.
Bioeticamente, queiramos ou não, estamos todos envolvidos nesse mundo caótico, o mais novo labirinto, facílimo de se entrar nele, porém muito pior do que aquele do Minotauro, para se sair dele, o mundo no qual estamos não é culpa dos deuses do Olimpo, é culpa única e exclusiva do ser humano, ele é o detentor do fogo, que cria e recria quase todas as condições possíveis de vida, mas quase todas desprovidas de sentido, sabemos como ninguém julgar a história, os antigos regimes políticos criminosos de alguma décadas atrás, mas esquecemos ou fingimos não ver que esses mesmos sistemas criminosos estão hoje atuando de forma livre, legalizada, na sua mais completa leveza; o antropoceno nos faz rir, nos faz chorar, com ele amargamos a nossa ousadia de queremos ter tudo para ontem, o presente já não nos basta, ele é enfadonho e miserável, um triste erro de cálculo.
Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética e Especialista em Filosofia pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, é Doutor e Mestre em Filosofia, é professor titular de Bioética na PUCPR.
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