Quando mergulhamos fundo em nossa sociedade não é tão difícil assim constatar que ela passa por uma grave crise em todos os setores, de vez em quando uma celebração aqui, outra ali, para disfarçar que ela vai muito mal das pernas, nenhuma instituição, nenhum governo parece ser capaz de apontar um rumo seguro, alguns até tentam, mas logo veem seus esforços ruírem, a grande maioria levada por ideias ultrapassadas, métodos arrogantes, como o uso extremo da força e da violência querem nos fazer crer que aniquilar o outro com todo o poderio bélico à disposição, ainda seria a melhor solução. Ainda não nos encontramos no pior cenário, mas com um pouco mais de ferocidade logo chegaremos a tal intento; as zonas cinzentas que a cada dia que passa parecem aumentar, nos deixam assim com muitas doses de preocupação, um gosto amargo de que falhamos.
Situações vem e outras tantas centenas se vão, as que vem chegando nos pegam sempre de surpresa, são quase sempre um duro golpe em nossas mais arraigadas crenças, elas tem sido muito frequentes nos últimos tempos e aquelas que se vão é por que não fomos suficientemente fortes para compreendê-las, aprofundá-las e muitas delas até que poderiam ser postas em prática, mas não o foram. Hoje mais do que nunca, os vendedores de evasão se tornaram a referência para um público cada vez mais infantilizado, cada vez menos ciente de seu papel como comunidade, cada vez menos capaz de compreender que o que vai nos destruir são as nossas conquistas e não os nossos fracassos; enquanto compartilharmos de modo grotesco a indiferença, tendo como meta uma superficialidade profunda, avançaremos muito pouco, seremos sempre ameaçados pelos fantasmas vivos.
Muitos teimam em dizer que o nosso mundo presente é hoje o pior dos mundos, por isso uma onda avassaladora em busca de um futuro, de algo que realmente nos torne importantes novamente, quando na verdade isso só conseguimos de fato vivendo o momento presente com intensidade e não negando as suas contradições, o futuro sempre buscado, desejado e já posto em prática de diversos modos, sempre se revelou algo efêmero e inconsistente, no mais das vezes causou inúmeras dores de cabeça, algumas delas persistindo até hoje, não por acaso uma concepção niilista de vida, ou seja, uma descrença generalizada no ser humano varre todos os cantos do mundo, esse niilismo cria contravalores, isto é, faz com que o homem perca a crença e a confiança em Deus e que em seu lugar venham muitos bezerros de ouro, cada um deles com capacidades “notáveis”.
Uma das capacidades notáveis que os novos bezerros de ouro nos querem fazer crer é que não há crise alguma, seja ela climática, institucional ou governamental, que tudo não passa de invencionices de alguns desajustados, que querem apenas que o ser humano retroceda aos tempos bárbaros, quando na verdade, há evidências de todos os graus e para todos os lados, vinte e quatro horas do dia. Atualmente temos informações demais porém pouca ou nenhuma sabedoria de como reger as crises que estão aí, a orquestra sinfônica humana está desafinada, comum é vermos governantes aparvalhados e atabalhoados, alguns nem mesmo sabendo se é dia ou noite, se faz frio ou inverno; o ser humano da era da técnica possui muitos dispositivos a seu dispor, mas esses o levam para outras regiões, são traidores das nossas expectativas, nos revelam que estamos à deriva.
Bioeticamente, as ambivalências do tempo de hoje são ocasiões para repensarmos nossos estilos de vida, o quanto tem sido prejudicial até agora usar a força, as armas, liquidar populações inteiras, arruinar o nosso meio ambiente, esses e tantos outros eventos mortíferos que pululam nos meios de comunicação, deveriam fazer parte de modo muito mais constante em nossas rodas de conversas, um novo pacto para salvar a vida deveria ser a preocupação não só da população, mas de todos aqueles que se propõem a guiar o povo, seja aqui, seja acolá; o poder selvagem como está distribuído hoje só faz com que os ressentimentos se alimentem mais e mais do desejo de vingança, as armadilhas das reuniões faz de conta, só nos levam a fingirmos que acreditamos nelas e elas fingem que nos convencem; hoje mais do que nunca temos um tempo onde tudo se desfaz em minutos.
Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética, Especialista em Filosofia, ambos pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, Doutor e Mestre em Filosofia, professor titular do programa de Bioética pela PUC-PR. Emails: ber2007@hotmail.com e anor.sganzerla@gmail.com
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