Flori Tasca
Quando uma aluna do Rio Grande do Sul decidiu ir à escola usando maquiagem gótica, não imaginava os transtornos a que estaria sujeita. Na primeira aula, a professora de Geografia estranhou a maquiagem e percebeu que os demais alunos estavam rindo muito dela. A situação continuou nas aulas seguintes, a ponto de a professora de Artes pedir que ela retirasse a maquiagem, pois estava sendo alvo de chacota pelos demais alunos e isso estava perturbando o andamento da aula. A aluna foi então ao banheiro.
Lá, tentou tirar a maquiagem, mas, como se tratava de uma tinta forte em formato de cruz, ela ficou com o rosto todo borrado, chamando ainda mais a atenção quando voltou à sala de aula. Diante disso, a professora levou a aluna à direção, para que fosse tomada alguma providência. A diretora passou um produto para remover a maquiagem, conseguindo limpar o rosto da aluna, que então pôde retornar outra vez para a sala.
Embora tudo parecesse normal a partir de então, naquela mesma noite a aluna buscou atendimento médico por conta de uma irritação que apresentava no rosto. Ela acusou a diretora de ter esfregado um pano ou papel com álcool para remover a maquiagem, o que lhe trouxe queimaduras e sequelas no rosto. As professoras que testemunharam o episódio, no entanto, garantiram que foi utilizado apenas um creme demaquilante.
O caso rendeu uma ação judicial, pois, além da lesão em seu rosto, a aluna alegava ter sido ofendida pela conduta das professoras que a obrigaram a retirar a maquiagem. Ela pedia reparação pelos danos sofridos, mas, em primeira instância, a sua demanda foi considerada improcedente. Recorreu e a Apelação Cível 557693-55.2012.8.21.7000 foi julgada no dia 27.11.2013 pela 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tendo como relator o desembargador Tasso Caubi Soares Delabary.
O relator entendeu que o comportamento da professora de Artes pretendia proteger a aluna dos comentários maldosos de que estava sendo vítima, e não a ridicularizar. Na conduta das professoras, ele declarou não ver nada que possa ter causado algum dano à aluna. Afinal, não havia nenhuma prova contundente que comprovasse que tenha sido usado álcool como meio de remoção da maquiagem. As testemunhas trazidas pela aluna em nada contribuíram, pois apenas narraram o que souberam após o episódio na escola.
Foi observado ainda que houve uma sindicância administrativa no estabelecimento, cujo relatório concluiu pela não responsabilização de qualquer das professoras, tanto mais que, após a retirada da maquiagem, a aluna continuou assistindo às aulas e não apresentou qualquer sintoma e nem manifestou desconforto. Lembrou-se ainda que a aluna teria “matado” a última aula em uma praça perto da escola, o que poderia sugerir a ausência de danos.
O relator ressaltou que não se poderia descartar que a irritação fosse consequência da própria ação da adolescente, quando tentou remover sozinha a maquiagem, ou que tivesse origem em algum episódio fora da escola, pois ela só havia procurado ajuda médica muitas horas depois. Sem entrar no mérito de ser adequado ou não o uso de tal maquiagem em escola, e tampouco das provocações dos colegas, entendeu-se que não havia prova de alguma situação que rendesse prejuízo moral a ser reparado.
Assim, a apelação foi improvida e mantida a sentença de improcedência do pedido.
Educador, Filósofo e Jurista. Diretor do Instituto Flamma – Educação Corporativa. Doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná. fa.tasca@tascaadvogados.adv.br
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