Flori Antonio Tasca
O fenômeno do bullying não pode ser simplificado em termos de “alvos x autores”, pois existe um grupo que ora está em uma posição, ora em outra. Os “alvos-autores”, que também são chamados de “vítimas-agressores”, merecem especial atenção, pois muitas pesquisas sugerem que alguns dos efeitos do bullying podem ser ainda piores para este grupo do que para os demais. Entre elas está “Relação entre bullying e sintomas depressivos em estudantes do ensino fundamental”, de Bruna Garcia Forlim, Ana Carina Stelko-Pereira e Lúcia Cavalcanti de Albuquerque Williams. Essa pesquisa, publicada em 2014 na revista “Estudos de Psicologia”, avaliou 348 alunos de duas escolas públicas no interior de São Paulo e teve como resultado uma maior associação entre o estudante que é alvo-autor e o que sofre de depressão.
De fato, os alunos que tanto agridem quanto são agredidos, na mostra selecionada para a pesquisa, apresentaram cinco vezes mais chances de ter sintomas depressivos do que os outros estudantes. A pesquisa não encontrou a relação que era esperada, isto é, a de que as vítimas apresentam maior probabilidade de ter depressão. É isso o que a literatura em geral indica. Os autores justificaram o resultado pela amostra relativamente pequena que fizeram, cogitando ainda que talvez o bullying ali se configurasse de maneira diversa.
De toda forma, o destaque obtido pelos alvos-autores reforça a necessidade de que sejam investigadas as consequências do bullying em análises separadas para este grupo, empregando tanto instrumentos de vitimização quanto de autoria. Uma metodologia que não considere os alvos-autores ou que leve em consideração apenas instrumentos de vitimização pode resultar em consequências superestimadas para as vítimas.
A pesquisa também procurou verificar a existência de variáveis que tornariam mais propício a um estudante se tornar alvo-autor. Descobriu-se que o contrário também é válido, isto é, que os alunos com depressão são os mais propensos a ser alvo-autor. Entretanto, conforme o aluno envelhece, diminui a probabilidade de que esse alvo-autor se envolva com o bullying. Os pesquisadores cogitam algumas hipóteses para explicar isso, como o aumento da experiência e do desenvolvimento cognitivo, o que faria com que esses alunos avaliassem melhor o contexto social e evitassem situações de bullying.
Outra relação avaliada pelos pesquisadores diz respeito aos alunos repetentes. Assim como os alvos-autores, os alunos que repetiram o ano tendem a apresentar sintomas de depressão. Uma das razões possíveis é a de que o aluno reprovado passa a ser alvo de críticas de familiares, educadores e colegas, o que diminui a sua autoestima. É possível, no entanto, que o contrário também ocorra, ou seja, que um aluno com depressão passe a ter queda no seu rendimento escolar e, em consequência, termine o ano reprovado.
Por outro lado, não foi encontrada correlação entre ser repetente e se tornar alvo-autor de bullying. Ao contrário, o aluno reprovado, na mostra selecionada, tinha quase 50% menos chances de ser alvo-autor. É possível que, sendo mais velho, mais forte e mais experiente que os seus novos colegas de classe, ele deixe de ser alvo para ser somente autor de bullying. No entanto, essas hipóteses ainda demandam mais investigações.
O que se sabe é que a depressão na adolescência também está relacionada à baixa tolerância à frustração, assim como a comportamentos impulsivos e rompantes de agressividade, o que torna o aluno com depressão mais propenso a ser alvo-autor.
Com relação ao gênero e à idade, não houve variáveis de importância para a depressão entre os alunos que foram estudados. Destaque-se que não houve alunos que eram apenas autores de bullying sofrendo de depressão. No total, 6,6% dos estudantes analisados obtiveram indicativo de depressão. Esse estudo se mostra importante porque ainda são poucos aqueles que investigam especificamente as consequências do bullying quando contrastadas às suas várias formas de envolvimento (alvo, autor e alvo-autor).
Educador, Filósofo e Jurista. Diretor do Instituto Flamma – Educação Corporativa. Doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná. fa.tasca@tascaadvogados.adv.br