Dez Estados e o Distrito Federal mantiveram as aulas em escolas estaduais apenas no modelo remoto desde o início da quarentena, em março do ano passado – e só agora, no segundo semestre, autorizaram o retorno à sala de aula. Mesmo em regiões onde o retorno já estava autorizado e as escolas foram abertas, parte das famílias decidiu mandar filhos para o colégio apenas no segundo semestre.
Em Mato Grosso do Sul, a professora Luzimar Fai, há 20 anos na rede estadual, teve um desafio inédito nesta segunda: evitar os abraços dos alunos, as trocas de lanches e a aproximação das carteiras. A rede estadual voltou após um ano e meio de aulas remotas. “Acredito que ter menos alunos vai facilitar o controle, mas é um receio.”
Boa parte das redes de ensino, como a de Mato Grosso do Sul, limitou o número de alunos nas escolas. No Pará, que também reabriu escolas estaduais pela primeira vez desde o início da quarentena nesta segunda-feira, o porcentual máximo de estudantes nas unidades era de 25%. A Bahia autorizou a ocupação de 50% das salas no segundo semestre, mas a frequência, tanto de alunos quanto de professores, tem sido baixa.
“A gente não está 100% seguro. É ruim (o formato de aulas remotas), mas já esperamos muito para agora colocarmos tudo a perder”, disse a estudante do Colégio Central da Bahia, Laís Silva, de 20 anos, que não apareceu nesta segunda na escola. O sindicato dos docentes da Bahia quer esperar a imunização dos professores, o que deve ocorrer no mês que vem. Já o governador Rui Costa (PT) ameaçou cortar os salários dos faltosos.
Em São Paulo, apesar de o governo ter autorizado a volta para todos os alunos, parte das escolas estaduais manteve o revezamento de estudantes nesta segunda-feira. A rede estadual paulista já havia retomado as aulas presenciais no primeiro semestre, mas com baixa ocupação dos colégios.
Na Escola Estadual Professor Djalma Ottaviano, em Campinas, no interior paulista, os alunos eram aplaudidos por funcionários e professores à medida em que entravam na unidade. Estudantes fizeram cartazes comemorando o retorno amplo na Professor Cid de Oliveira Leite, em Ribeirão Preto.
Para vários estudantes paulistanos, esta segunda-feira foi o primeiro dia de aulas presenciais desde o início da quarentena. Nicole, de 12 anos, não conhecia os professores que ela via pelas telas e sentia falta dos colegas. Os pais decidiram autorizar o retorno presencial da menina ao Colégio Visconde de Porto Seguro, na zona sul, após terem se vacinado contra a covid-19. “Foi um ano e meio longe da escola e agora finalmente chegou o dia”, conta o pai, o engenheiro Thomas Martin Diepenbruck, de 49 anos.
Isabella Calil, de 13 anos, chegou a ir uma única vez ao colégio em outubro do ano passado, mas não se sentiu confortável para seguir todos os protocolos e resolveu esperar a vacinação dos pais e a melhora nos indicadores da pandemia. Voltou nesta segunda às carteiras do Pentágono, uma escola particular na zona oeste de São Paulo. Durante o ensino remoto, o rendimento da menina caiu e algumas lições ficaram para trás. “Faltava rotina de acordar, de tomar banho, colocar uniforme.”
Para Isabella, será preciso alinhar os conhecimentos entre os colegas na sala antes de avançar na aprendizagem. “Tem gente que está chegando agora e está bem confusa.”
No primeiro dia de aulas, os professores começaram os trabalhos investigando o que os estudantes se lembravam das matérias do primeiro semestre. Em grupos, os colegas levantavam as dúvidas que não foram respondidas.
Os amigos, que Isabella não via há mais de um ano, mudaram – na aparência e no estilo. E ainda restam questões sobre o tamanho do impacto emocional da pandemia entre os jovens.
Estudos já indicam aumento de quadros ansiosos por causa do isolamento. O luto pela perda de parentes e amigos agrava os transtornos. “Dá para perceber quem está meio triste, mais quieto. Teve gente que não estava indo às aulas e está bem para baixo” , diz Isabella.
Antes da aprendizagem, escola deve acolher
Para Alexandre Schneider, ex-secretário municipal de Educação de São Paulo e presidente do Instituto Singularidades, a escola “precisa compreender que os estudantes vão voltar de um jeito diferente do que eram”. As disparidades dentro de uma mesma sala de aula tendem a aumentar, o que vai exigir trabalhado ainda mais personalizado por parte dos professores.
“Temos estudantes que conseguiram acessar os materiais propostos e os que não conseguiram acessar, todos juntos. Mesmo os que conseguiram não necessariamente tiveram o mesmo aprendizado que se esperaria nas aulas presenciais”, afirma o especialista. O suporte familiar e as condições financeiras e de estrutura foram diferentes em cada família durante a quarentena.
Antes de avançar nas aprendizagens, diz Schneider, as escolas e redes de ensino devem acolher os alunos e estreitar os laços dos estudantes com os professores. Essa recepção, segundo o especialista, não pode ser burocrática – pelo contrário, tem de fazer parte do planejamento da escola. “Não é um acolhimento de 15 minutos. Isso vai levar um mês ou mais.”
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