Aos pais de ontem, hoje e sempre

Rosel Antonio Beraldo e Anor Sganzerla

O mundo contemporâneo com todas as suas alegrias, dúvidas, incertezas e tristezas numa coisa não muda, isto é, a figura paterna continua tão presente como séculos atrás, a bem da verdade ser pai variou drasticamente desde que o mundo é mundo, cada filho, cada filha em particular melhor do que ninguém pode descrever seu pai em minúcias. Em especial nesses dois últimos anos em que a humanidade foi e continua assolada pela vinda inesperada, mas prevista de um ser invisível que ceifou a vida de milhares de pais, figuras essas que na grande maioria nada fizeram, num piscar de olhos deixaram esse mundo mais pobre, seus filhos e filhas, esposa, todos órfãos; não entendemos a dinâmica desse vírus, a não ser que por onde ele passa não faz distinção alguma de pessoas, se é pai ou mãe, pobre ou rico, engenheiro ou varredor de rua; ser pai hoje exige competência e acuidade.

Os pais hoje convivem com dilemas até pouco tempo atrás desconhecidos, os filhos do século XXI nasceram mergulhados na era tecnológica, era essa que promete muito, mas cumpre suas promessas apenas pontualmente naquilo que lhe interessa, os pais desses filhos passaram a maior parte de suas vidas sem contato com a tecnologia, basta olharmos para o nosso pai em particular, são muito pouco aqueles que tiveram uma infância regrada por artefatos técnicos, a maioria esmagadora possuía apenas os rudimentos necessários para viver e sobreviver, por outras palavras, sair bem cedo de casa e ir para o trabalho e regressar a noite cansado, mais de uma vez notamos em nossos pais aquele olhar perdido, confuso, trabalho demais e ganho de menos; precisamos ter muito cuidado para julgarmos nossos pais, a história de cada um deles não pode assim ser julgada pelos critérios de hoje.

O vento da mudança colossal tem transformado em muito a figura do pai muitas vezes num ser estranho ao tempo e espaço que ocupa, ou seja, a figura tradicional de pai compete com outras figuras de pai criadas pela tecnologia, temos aquele pai algoritimizado que não vê absolutamente nada além de pixels na tela, temos o pai extremista, que se opõe a qualquer mudança, pais que são ótimos trabalhadores, empresários, mas são péssimos pais dentro das suas famílias, não raro encontrarmos pais tiranos com os filhos e esposa e totalmente benevolentes com seus funcionários e amigos. Pais que só pensam em acumular bens e dinheiro, mas são incapazes de fazer um afago no filho ou na filha; uma coisa é clara: nossos pais são o que são, nunca serão aquele super-herói que idealizamos um dia, descobrir que o nosso pai é desse jeito e não daquele, causa sérios desconfortos.

Na atualidade veloz alguns tipos de pai são notórios: Existem os pais promotores da guerra, do ódio, da matança indiscriminada de inocentes, aqueles que adoram causar o pânico na sociedade, esse tipo de pai tem uma característica violenta e pouco propensa a pensar que um dia ele foi filho, foi uma criança. No outro lado temos os pais promotores da paz, aqueles que apenas procuram dar o melhor de si para a sua família, ou seja, trabalham, se esforçam para que tudo no seio familiar concorra para o bem somente. Também existe uma miríade de pais que não são uma coisa nem outra, são apenas uma massa ao sabor do vento e das ocasiões, pais amorfos, que não sabem desempenhar minimamente o seu papel de pai; não podemos esquecer também todos os pais que por um motivo ou outro ficaram desgostosos com a vida, abandonaram sua família, fugiram ou estão nos hospitais.

Ser pai na era das bolhas digitais é um processo complexo, exigente e muitas vezes penoso, pois além de ser pai, o sujeito precisa estar conectado com outros tantos afazeres da vida e nem todos eles conseguem se adaptar facilmente frente a todas as mudanças aceleradas das últimas décadas. Muitos se tornaram simples seres uberizados ou até mesmo mecanizados, muitos pomposamente intitulam-se empreendedores e utilizam para tanto apenas as velhas fórmulas decadentes, ultrapassadas e fora do contexto, isso expresso de outro modo, mostra pais que apenas estimulam a competição desenfreada entre seus filhos, a eliminação da concorrência e o aniquilamento de possíveis inimigos à vista; um pai afastado dos seus deveres mais básicos, indiferente aos clamores da sua família e também da sociedade como um todo, é algo preocupante, presta um desserviço.

Bioeticamente, hoje a figura paterna está sempre a caminho, se recompondo, se refazendo, se reinventando, algo nunca pronto, sempre incompleto, muitos não entenderam e jamais entenderão isso, muitos perderam todo e qualquer contato com suas origens, uns vivem apenas no futuro, outros apenas no passado, raros são os pais que estão centrados no presente com toda a sua beleza e potencialidade de se fazerem coisas novas. Aqui apenas um testemunho pessoal: a figura austera e bondosa de meu pai que se encontra hoje na eternidade, uma pessoa que praticamente passou seus sessenta e nove anos de vida trabalhando, não foi o melhor pai do mundo e muito menos o pior deles, foi o que foi, amou a vida e seus semelhantes do jeito que ele aprendeu a amar, fez escolhas e por isso pagou o preço, assim como ele, hoje muitos pais desesperadamente fazem escolhas que muitas vezes não queriam, renunciam a si próprios para realizarem a vida da esposa e filhos; de qualquer modo não custa nada dizer: meu querido pai, muito obrigado, por tudo.

Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, é Mestre em Bioética, Especialista em Filosofia pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, é Doutor e Mestre em Filosofia, é professor titular de Bioética na PUCPR

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