No mundo em que a cada dia que passa temos a sensação de que o autoritarismo está cada vez mais próximo de nós, o medo sempre nos ronda, esse inventa as armadilhas mais sutis para cairmos nelas com a devida maestria, um nova e grande teia de aranha sendo confeccionada, ninguém sabendo dizer o nome, mas ela está aí, quem nela se gruda logo percebe que sair dela deverá ter muita técnica e audácia, do contrário esse imenso labirinto a céu aberto tratará de engolir majestosamente cada um. Todos os espaços mostram-se ambivalentes, tanto podem nos advertir, quanto nos ludibriar, há sinais claros de que estamos afundando, mas esses sinais são transformados de tal maneira que poucos acreditam, o mundo que um dia já foi chamado de comunidade humana, hoje não passa de um deserto hiper povoado, com a suas exclusões, as suas xenofobias, os muitos racismos.
A ousadia aqui e acolá causa espanto, a ousadia diz que essa realidade que aí está não é aquilo que a maioria quer, ser ousado perante um mundo enlouquecido é mostrar com gestos e palavras que temos ainda muitas alternativas para o nosso sucesso como comunidade, que o deserto forjado sob muitas ilusões , ele só nos afasta uns dos outros, ele só nos deixa cada vez mais pobres e ignorantes em todos os sentidos. Num tempo de profundas incertezas, vemos todos os dias inocentes a se perderem de vista morrerem por nada, por causa de dois ou três líderes insanos, vemos com pesar milhares de desterrados ambientais, quantos abafamentos políticos e econômicos tem impedido de se chegar a uma paz duradoura entre as nações; quantas ideologias amplamente revestidas de bem comum, mas que em última análise se revelam falsas, mentirosas e de cunho unicamente particular.
A pandemia do ser invisível e até agora nunca explicada, de fato afetou em muito as pessoas de um modo geral, deixou sim marcas profundas que agora vão se revelando pouco a pouco, praticamente ninguém mais fala dela ou mesmo se lembra, esquecer sempre foi a palavra de ordem em qualquer setor que o ser humano habita e convive, mas dessa vez esquecer foi levado ao extremo, estávamos na época “muito preparados” para desfrutarmos um mundo imaginário irreal, com grandes feitos e conquistas, mas ao menor sinal de perigo caímos em desgraça em minutos, o ser invisível desmascarou de modo inequívoco todas as nossas falhas, todas as nossas mentiras que contamos sistematicamente para nós mesmos, um mundo que até então só pregava abundância em demasia em todos os setores, viu diante de si as misérias, a dor, o sofrimento e a injustiça.
Não resta nenhum tipo de dúvida de que aprendemos muito pouco ou quase nada com essa catástrofe, logo vieram duas guerras terríveis e a crise climática explodiu de vez, mostrando toda a sua fúria, pensemos o que foi e o que está sendo ainda agora a tragédia do nosso querido e amado Estado do Rio Grande do Sul, o que sempre pareceu impossível de acontecer, aconteceu de uma maneira brutal, nem a técnica mais avançada, nem as mais belas conquistas da engenharia, construções que por tantos anos encheram nossos olhos, tão bafejadas por alguns, nada suportou a fúria da natureza. Isso nos diz muito, mais do que gostaríamos de saber, ou seja, há no nosso meio profundas falhas, tais como: falhas políticas nacionais e internacionais, uma solidariedade só de fachada, uma severa crise financeira, falhas em se detectar novas ameaças, falhas em escutarmos órgãos como OMS.
Bioeticamente, aqui estamos nós tendo que de muitos modos convivermos com todo esse emaranhado de situações que requerem atenção redobrada, o presente nos pressiona de modo único, contra uma enxurrada de ativistas da negação precisamos ser ousados, as nossas conectividades super velozes, as quais temos acesso ilimitado, deveriam sim antes servir para algo a mais e não para a nossa ignorância desmedida, a nossa salvação está em pequenos gestos cotidianos, sejam eles singulares ou coletivos, a técnica está em nós, ela habita nosso ser com ideias invenções simples e duradouras, deveríamos prestar mais atenção nos saberes tradicionais, naquilo que nossos avós e bisavós diziam e faziam, eles sim eram os verdadeiros modernos, neles o tempo corria de modo diferente do nosso, havia mais vida, mais cordialidade, mais compreensão, o que nos falta sim de modo bárbaro hoje.
Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética, Especialista em Filosofia, ambos pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, Doutor e Mestre em Filosofia, professor titular do programa de Bioética pela PUC-PR. Emails: ber2007@hotmail.com e anor.sganzerla@gmail.com
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