O Estadão cruzou os dados oficiais de devastação divulgados anualmente pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o chamado Prodes, com os de multas ambientais aplicadas pelo Ibama. As informações oficiais – os dois órgãos são ligados ao governo federal – mostram que, em 2019, sob a tutela do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, o Ibama registrou 12.375 multas. Em 2020, esse número ficou em 11.064. Neste ano, até setembro, foram 9.182, a metade das 18.222 aplicadas pelo Ibama em 2012. Nos anos 2000 a 2010, o órgão ambiental emitia entre 20 mil e 25 mil autos por ano, em média.
A situação se repete quando são consideradas as autuações aplicadas somente nos nove Estados da chamada Amazônia Legal, que reúne Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão. Uma década atrás, o Ibama relatava uma média anual de 5 mil multas ambientais por crimes de desmatamento na Amazônia Legal. Em 2020, esse número caiu para 2.334 autos de infração. Neste ano, até setembro, foram 1.935 multas. Os riscos do avanço da devastação da Amazônia têm sido uma das principais discussões da COP de Glasgow.
SUCATEAMENTO
A redução das fiscalizações passa pelo progressivo processo de sucateamento dos órgãos de controle, esvaziamento da força de trabalho e fragilização da lei ambiental. O governo federal fechou unidades do Ibama, não renovou o quadro de fiscais e agiu para mudar as regras de autuação e perdão de multas. Soma-se a isso a própria posição de Bolsonaro, que por várias vezes assumiu o compromisso de acabar com a “indústria de multas” ambientais no País.
O que se viu, na prática, foi a explosão do desmatamento. Em 2019, seu primeiro ano de governo, a devastação na Amazônia Legal atingiu uma área de 10.900 quilômetros quadrados, o maior volume verificado em uma década e o dobro do registrado em anos como 2012 e 2013. Em 2020, o volume se manteve em alta e chegou a 10.500 km².
Os dados do Inpe indicam 796 km² de devastação em outubro, até o dia 29. É a segunda maior área de alertas de desmatamento para o mês de outubro da série histórica do Inpe, iniciada em 2016, e só 4,7% menor que o recorde de 2020.
O Estadão questionou o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama sobre essas informações. Em nota, o Ibama declarou que, até outubro de 2021, as ações de fiscalização e combate ao desmatamento “aumentaram cerca de 50% em relação a todo o ano de 2020”. Segundo o órgão, essa mobilização afetou “diretamente na redução das infrações ambientais”.
“Os números nos mostram que o aumento do desmatamento é resultado direto de medidas tomadas pelo governo, que sucateou os órgãos de fiscalização e reduziu as infrações. Quando se trata de destruir a floresta, nenhuma motosserra supera a caneta do presidente”, afirmou Márcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima.
BALCÃO DA IMPUNIDADE
A porta-voz de políticas públicas do Greenpeace, Thais Bannwart, ressalta que, além de emitir o menor número de multas já aplicadas, o governo Bolsonaro criou os “núcleos de conciliação ambiental” sobre autuações já dadas. “Na prática, esses núcleos se tornaram um verdadeiro balcão da impunidade, pois travaram o procedimento de cobrança das multas”, alerta. “Para piorar, uma série de projetos de lei visa a legalizar tais práticas. Assim, além da certeza da impunidade, os criminosos contam com a possibilidade de ser beneficiados pela mudança nas leis.”
Consultor jurídico do Instituto Socioambiental (ISA), Mauricio Guetta lembrou que Bolsonaro já havia adotado esse discurso na campanha. “Desde o primeiro dia de 2019, o governo Bolsonaro paralisou a política de combate ao desmatamento da Amazônia, o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal, e adotou medidas para inviabilizar a atuação do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio).
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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