“Ela (dona Laudelina) acompanha tudo o que ele faz na televisão. E não pense que fica só na torcida. A mamãe geralmente sabe quando o Deivid vai bem ou mal antes mesmo de o juiz dar a nota. A identificação deles é muito grande. O Deivid é o primeiro neto. Aí já viu… Quando ele chega, o seu prato preferido, que é costela com batata, já está servido”, disse Clayton, em entrevista ao Estadão.
O desempenho de Deivid foi realmente de encher os olhos da família. Até chegar à final, na praia da Barra de La Cruz, ele deixou pelo caminho nomes como Gabriel Medina, número 1 do ranking, e Italo Ferreira, ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Na decisão, o duelo foi com o australiano Jack Robinson. E o título acabou escapando da nova promessa por dois centésimos de diferença, para desespero da avó.
“Seu desempenho no México foi muito bom. Sou um cara justo e acho que ele merecia ter vencido. Mas está bom. Com isso, a expectativa só cresce. E sabemos que ele está no meio de muitas feras do surfe. Quem sabe vem mais coisa boa por aí”, comentou o pai, orgulhoso.
SURFE EM FAMÍLIA – Nascido e criado na Prainha Branca, no Guarujá, litoral sul de São Paulo, Deivid Silva tem 25 anos e sempre teve o mar como extensão de sua casa. O pai, também conhecido por Nenê, foi competidor e levava o filho para os campeonatos amadores. Se conseguia subir ao pódio nesses torneios, era o menino que erguia o troféu conquistado pelo patriarca. O DNA do surfe na família não fica só entre os dois. Valéria, a mãe, também gosta de pegar ondas. Uma cena comum há alguns anos era ver pai, mãe e filho surfando juntos na Prainha.
Dono de um temperamento extrovertido, mas também determinado, Deivid teve nos laços familiares a base para buscar o estrelato na elite do surfe. Em entrevista por telefone, o tio Valclei também comentou da sua contribuição para as primeiras manobras do sobrinho no surfe.
“O pai dele às vezes não podia largar o serviço. E eu revezava para levá-lo nas competições. Ele era bem pequeno. Dava umas dicas de manobras, de como entrar nas ondas e o aprendizado foi rápido. O seu desempenho acabou influenciando o meu filho Eduardo Mota, que hoje tem 19 anos e também está competindo. Foi incentivo do primo.”
FÃ DO FENÔMENO NO CORINTHIANS – Antes de se dedicar exclusivamente ao surfe profissional, Deivid teve no futebol uma outra paixão. Corintiano, ele adorava jogar peladas. No colégio, tinha fama de artilheiro. “Quando o Ronaldo veio para o Corinthians, ele adorou. Gostava de fazer gols inspirado no Fenômeno”, lembrou o pai. No México, ele não conseguiu falar com o Estadão.
Mas se gostava de dar dribles nas peladas, Deivid contou também com a marcação cerrada da mãe para pegar firme nos estudos. Ela não queria ver o filho sem educação. “Vou te falar uma coisa, ele não era muito de estudar. Minha mulher ficava em cima o tempo todo. Mas era muito bom em matemática. Era a matéria que ele mais gostava na escola”, conta Clayton.
Os horizontes de Deivid começaram a crescer quando, aos 12 anos, veio a conquista do título do Campeonato Paulista Iniciante, em 2008. “O Deivid cumpriu todas as etapas. Nas categorias de base, foi campeão paulista, brasileiro e ainda pegou alguns vice-campeonatos em eventos internacionais. Ele surfa desde os três, quatro anos de idade. O mar sempre foi a vida dele.”
O apelido de “DVD” veio ainda na infância. Ademir Silva, presidente da Associação de Surfe do Guarujá, disse que Deivid era um dos menores da turma. Mesmo assim, nunca teve medo de enfrentar adversários mais velhos. “Ele ia para cima mesmo. Sabia o que queria e geralmente se dava bem. Muitas vezes era prejudicado justamente por ser menor na hora de ser avaliado. E fomos competir em cidades como Ubatuba, Maresias e região”, disse Ademir.
PREOCUPAÇÃO COM O ESPORTE – De família humilde, Deivid tem na simplicidade sua essência. Os seus primeiros anos da elite do surfe já renderam a compra de um apartamento. Casado e pai de uma menina, ele redobra as expectativas para a chegada do segundo filho. “Já está para nascer”, disse o tio Valclei.
Com residência em Bertioga, Deivid procura sempre ajudar a comunidade local com pequenas contribuições. “Ele doa pranchas para rifas, material esportivo e outras coisas com a intenção de propagar o esporte e incentivar a prática da modalidade”, diz Valclei. Seu objetivo é entrar no seleto grupo dos surfistas brasileiros que fazem história pelo mundo, como Italo e Medina, e tantos outros da chamada “Brazilian Storm”.
Sua iniciativa de ajuda às comunidades não se restringe à cidade onde mora. Ele tem uma relação estreita com o município de Paracuru, no litoral do Ceará, onde já ganhou um evento da categoria. Por se identificar com o tipo de formação das ondas de lá, ele sempre passa um período na cidade para treinamentos.
De acordo com Armando Praça, juiz de surfe cearense, Deivid já fez diversas doações de pranchas para crianças carentes da região. “Ele sempre vem para cá, dá a maior força para os surfistas locais e demonstra muita humildade.”
NAS HORAS VAGAS, GOSTA DE COZINHAR – Bom de garfo, mas também com intimidade na arte da culinária. A vida longe da família obrigou Deivid a se virar na cozinha. A necessidade despertou no surfista um talento para a gastronomia. Segundo o pai, quem prova das iguarias feitas pelo filho não se decepciona. Ele manda bem. “Gosta muito de peixe. E faz pratos gostosos. O ceviche é uma das suas especialidades. Morar longe de casa tem dessas coisas e ele aprendeu a se virar. Como a nossa culinária é muito vasta, Deivid foi se aventurando”, afirmou o pai.
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