É o que aponta um estudo realizado pela consultoria Sports Value, especializada em marketing esportivo. Em 2020, os 20 clubes da Série A do Brasileirão tiveram uma redução de 46,7% nas receitas em dólares em comparação a 2019, a US$ 672 milhões (R$ 3,7 bilhões). Esses valores não consideram as rendas com transferências de jogadores. Com isso, o Brasil perdeu a sexta posição das maiores ligas do mundo e caiu para a nona. Agora, à frente do País, estão a Rússia, os Estados Unidos, que investiu fortemente na MLS nos últimos anos, e até a Turquia.
“Gostamos de nos comparar com as grandes ligas da Europa, mas temos de perceber que estamos no mesmo patamar das emergentes”, diz Amir Sommogi, fundador da Sports Value e responsável pela pesquisa. Dois fatores influenciaram essa queda brutal de receita: a pandemia e, principalmente, a valorização do dólar frente ao real. No ano passado, a moeda americana subiu 29% e em 2021 já acumula uma alta de 8%. Para completar, a covid-19 forçou fechamentos dos estádios, o que rendeu uma queda na receita de R$ 384 milhões no ano passado.
A divulgação dos balanços financeiros dos principais clubes do Brasil no começo de 2021 revelou o tamanho inicial do impacto da covid-19 nos cofres dessas equipes. As 20 maiores agremiações do País tiveram uma queda nas receitas de 19,5% e juntas apresentaram déficits que somam R$ 1,03 bilhão. Assim, as dívidas passaram pela primeira vez de R$ 10 bilhões. Os dados também foram analisados pela consultoria Sports Value.
Os clubes tiveram perdas financeiras principalmente sobre direitos de TV, bilheteria, sócios, transferências de jogadores e patrocínios. O Flamengo, por exemplo, que terminou 2019 em alta, sofreu forte impacto com a pandemia. Se no ano anterior o clube da Gávea, somente com estádio e sócio-torcedor, arrecadou R$ 175 milhões, em 2020 esse valor caiu para R$ 92 milhões. O Palmeiras viveu situação idêntica. O faturamento com sócios e bilheteria no Allianz Parque foi de R$ 91 milhões em 2019, valor que em 2020 despencou para R$ 29 milhões. As maiores perdas de 2020 ficaram com Palmeiras, São Paulo e Corinthians na Série A, e Cruzeiro e Botafogo na B.
“É claro que o câmbio afeta, mas os clubes brasileiros estão perdendo competitividade nos últimos anos e muitos clubes só estão sobrevivendo por causa da venda dos jogadores, que foi de US$ 1 bilhão nos últimos quatro anos”, diz Somoggi. “Sem esse desenvolvimento, estamos perdendo espaço para ligas emergentes.”
Um dos motivos que mostram que o dólar não é o único fator está no fato de a SüperLig, o campeonato turco, ter ultrapassado o Brasileirão. Por lá, o país também sofre com uma forte crise econômica, assim como uma forte depreciação da lira, sua moeda oficial. Mesmo assim, a queda nas receitas foi de 10%, bem abaixo da redução por aqui. A Premier League Russa, por sua vez, fugiu à regra e teve uma alta de 17% nas receitas, a US$ 965 milhões, tomando a sexta posição das principais ligas de futebol do mundo.
O Brasil ainda está à frente de outras ligas importantes, como a holandesa e a portuguesa. Mas Somoggi chama a atenção para a distância que os principais clubes portugueses (Porto, Benfica, Sporting e Braga) estão dos times brasileiros. “O valor que os clubes portugueses fazem com licenciamento de produtos é infinitamente maior do que os brasileiros”, diz o especialista.
Não só isso: o país europeu se tornou uma porta de entrada de jogadores sul-americanos para o continente, comprando barato de mercados emergentes e vendendo caro para os principais clubes do mundo. Para se ter uma ideia, o Porto dobrou o seu faturamento em 2020 com vendas de jogadores.
CLUBE-EMPRESA – A aprovação no Congresso Nacional do projeto de clube-empresa pode começar a mudar esse cenário, na visão de especialistas. O chamado Sociedade Anônima de Futebol (SAF) deve atrair o investimento tanto de brasileiros quanto de estrangeiros e por uma visão econômica simples: você investe em real na formação de jogadores e vende em dólar ou euros. Trata-se da mesma lógica da exportação de commodities.
Em visita à Dubai no mês passado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que conversou com investidores árabes que se mostraram interessados em comprar dois clubes locais. Para Pedro Daniel, diretor de esportes, mídia e entretenimento da consultoria EY, como o Brasil é um dos maiores celeiros de craques do mundo, esse tipo de investimento poderá vir a ser uma rotina por aqui.
“Eu tenho uma visão que o nosso futebol não está desvalorizado a outros clubes emergentes, mas temos menos dinheiro e a situação econômica do País impactou diretamente. Mas acredito que com o SAF, vamos nos tornar muito atrativos para grandes holdings de futebol”, diz Daniel. E como o dólar insiste em não baixar da casa dos R$ 5, para voltar à sexta posição do ranking, é melhor os clubes brasileiros aumentarem as suas receitas de outra maneira.
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