Vieram depois os comics. 300, Watchmen e o Universo Estendido DC. Superman, Batman Vs. Superman, a versão do diretor de Liga da Justiça, etc. Há tempos, Snyder vem anunciado um reboot, mais que remake, de The Fountainthead, romance de Ayn Rand que deu origem ao clássico Vontade Indômita, de King Vidor, com Gary Cooper e Patricia Neal, de 1949. Com carta branca da Netflix, ele usou a parceria com a operadora de streaming para voltar aos zumbis. Army of the Dead – Invasão em Las Vegas já está entre os mais vistos da Netflix no Brasil. E tem também o making of – Os Bastidores de Army of the Dead.
Snyder é um diretor bem sucedido, mas polêmico. Rodrigo Santoro, que trabalhou com ele em 300, diz que ninguém conhece tanto os quadrinhos. Conhecer não significa seguir fielmente. Snyder subverte o cânone para humanizar seus super-heróis. Superman é sobre a ligação de Henry Cavill com o pai adotivo, Kevin Costner. Batman Vs Superman começa com a morte da mãe do Cavaleiro das Trevas e prossegue sobre a mãe do Homem de Aço. Liga da Justiça é sobre a ressurreição de Superman.
É curioso, senão significativo, que Snyder esteja retornando aos mortos vivos. À revista norte-americana Total Film, ele definiu Army of the Dead como ‘meu pequeno filme”, não em escala, bem entendido, mas em sensibilidade. “Não fiz esse filme como encomenda. Ele nasceu de uma forma super intimista, e muito pessoal.” Só para lembrar, Madrugada dos Mortos era sobre os sobreviventes de uma praga que está transformando a humanidade em zumbis. Eles se refugiam num shopping, o símbolo do consumismo da ‘América’. Os zumbis agora ocuparam Las Vegas, e a cidade foi sitiada. Para acabar com a nova praga, o presidente dos EUA anuncia que vai lançar uma bomba atômica sobre a Sin City.
É nesse quadro que Scott Ward é procurado por Hiroyuki Sanada – que também está nos cinemas, em Mortal Kombat – para uma missão suicida. Com a promessa de ganhar US$ 50 milhões, Dave Bautista terá de formar uma equipe de profissionais para entrar na cidade sitiada e assaltar o cofre de um hotel-cassino. Sanada não está atrás do dinheiro, esse é só um McGuffin, como diria Alfred Hitchcock. Tudo isso terá de ser feito em quatro dias, mas o prazo reduz-se dramaticamente quando a operação já está em andamento. O presidente, como um Doutor Fantástico, anuncia que vai explodir a bomba em menos de duas horas!
Army vira uma corrida contra o tempo, e os mortos vivos. Como costuma fazer, Snyder desconstrói os códigos do gênero, ao mesmo tempo que o leva ao limite da sofisticação tecnológica. Assalto + zumbis. Ele próprio faz a fotografia, com a câmera – digital – na mão. Cria zumbis trôpegos, aos quais o público está acostumado, mas propõe uma nova raça evoluída – os alfas. O rei e a rainha não apenas copulam, como ela engravida. A Las Vegas em ruínas causa forte impressão visual, e você ainda precisa ver as novidades – o tigre morto vivo, o cavalo zumbi. O grupo heterogêneo é formado por personagens que ecoam Os Doze Condenados, de Robert Aldrich, e os Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino. Mas o filme não seria tão intimista, nem tão de Snyder, se não tivesse complexas relações familiares. Dave Bautista tem uma filha – que abandonou, o público saberá o motivo. Tenta uma difícil reaproximação. O desfecho é trágico, como foi na vida do diretor, mas, calma, não tire conclusões apressadas.
A vida tem colocado Snyder à prova. Um dos atores contratados, Chris D’Elia, teve de ser substituído, em plena rodagem, devido a acusações de assédio de menores. Em seu lugar, entrou Tig Notaro, numa mudança de gênero, e algo mais. Tig é lésbica assumida. Faz a piloto de helicóptero. Conseguirá tirar o grupo, ou o que sobrou dele, de Las Vegas a tempo de escapar do holocausto nuclear? Como se não bastasse o problema com D’Elia e a praga na tela, houve a covid. Army of the Dead foi finalizado na pandemia. Zack Snyder é um verdadeiro autor. E cresce na adversidade.
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