Como transformar o passeio de bike em treino

Você pode tirar sua bicicleta da garagem para passear aos fins de semana ou como meio de locomoção. Mas existe um momento em que a atividade se torna um esporte, que pode sim ser praticado por qualquer pessoa. Como começar?
A fotógrafa Julia Guedes, de 27 anos, usava a bicicleta para o lazer. Convencida por um amigo, há pouco mais de dois anos decidiu olhar para a magrela como uma possibilidade para praticar esporte. Vendeu a bicicleta que tinha e comprou uma própria para o treino. “O mais difícil é aprender a andar no pelotão, seguir as regras. E, principalmente, aprender como se comportam os outros ciclistas, sobretudo os mais experientes”, diz ela, que reclama por mais espaços adequados para treino na cidade.
Atualmente, Julia pratica o triatlo e treina ciclismo com uma assessoria esportiva uma vez por semana, durante 1h30. Nos outros dias, pratica em casa, com a bicicleta fixa.
“A bicicleta é uma das invenções mais interessantes do ser humano para locomoção, pois é a mais verde e, para atividade física, traz inúmeros benefícios para a saúde. Se ela estiver adequada para você, dificilmente você vai se machucar ou ter um problema crônico”, diz Fabio Rosa, da MPR Assessoria Esportiva.
Rosa explica que, assim como Julia, é preciso ter calma e avançar aos poucos com os treinos e, sobretudo, escolher o local adequado para fazê-los.
Indoor
Uma opção é o ciclismo indoor, ou seja, o treinamento dentro de um local fechado, com uma bicicleta estacionária, em casa ou na academia. Conhecido como spinning, método e marca criados pelo ciclista sul-africano Jonathan Golderg, o Johnny G, no final dos anos 1980, a modalidade combina treinos de força e resistência, como simulação de subidas, descidas e aumento ou decréscimo de carga.
O treinador Pedro Paixão criou, há 2 anos e meio, uma aula em áudio (R$ 69,90 por mês), com orientações para os ciclistas indoor. O áudio, que era enviado por e-mail junto com uma playlist, se transformou em aulas ao vivo no aplicativo que ele mesmo lançou. Em breve, elas estarão disponíveis em vídeo.
Paixão explica que, apesar de os praticantes estarem em cima de uma bicicleta pedalando, a categoria estacionária guarda diferenças com o ciclismo convencional. “Na bicicleta indoor, você não precisa se preocupar com o equilíbrio, por exemplo. Na bicicleta outdoor você precisa vencer as adversidades, como uma ladeira, por exemplo. Na aula estacionária, você faz isso com a carga, com ritmo estimulado pelo professor”, explica.
Deu vontade de começar a praticar o ciclismo? Confira algumas dicas:
Quais os benefícios de andar de bike?
De acordo com o médico do esporte e fisiatra Fabrício Buzatto, andar de bicicleta é uma atividade predominantemente aeróbica e, por isso, trabalha o condicionamento cardiopulmonar, reduzindo o risco de doenças como diabetes, pressão alta e obesidade, além de trazer bem-estar emocional. De alta intensidade – com zero impacto -, a prática pode ser benéfica na perda de peso e no ganho de condicionamento físico. O fortalecimento muscular também é importante. “É preciso realizar treinos de musculação ou funcional pelo menos quatro vezes na semana, no início. Ambos vão ajudar a preservar e manter a massa muscular e prevenir riscos de lesões”, diz.
Quando pedalar se torna um treinamento?
De acordo com Buzzato, para a pedalada se tornar uma atividade física, o praticante precisa alcançar pelo menos 70% de sua frequência cardíaca máxima. Para quem ainda não fez um teste ergométrico, a conta é simples: 220 menos a idade = frequência máxima. Deve-se então multiplicar o resultado por 0.70. “Para ter benefícios, é preciso levar o corpo ao mínimo de estresse do sistema cardiovascular. Com a bicicleta você pode ir aos poucos aumentando o esforço. Mas é preciso chegar à frequência.”
“Primeiro é preciso criar afinidade com o equipamento. Depois disso, o treinador pode trabalhar a parte fisiológica e de esforço”, explica Fabio Rosa, treinador de ciclismo.
Como começar a treinar?
Para Buzzato, o iniciante deve ter cautela na hora de começar a prática. “Mais importante do que fazer exercício é se manter ativo. Não adianta querer pedalar o que você nunca conseguiu de uma vez só. Vá aos poucos, para não sofrer lesões ou se cansar”, diz Buzzato.
Pedro Paixão, que dá aulas de bike indoor, explica que a bicicleta estacionária pode ser uma etapa para a prática do ciclismo. “Há como o professor direcionar o treino, com cargas diferentes para quem está iniciando ou para quem já é mais avançado. É importante começar com treinos mais curtos, de 30 minutos, duas vezes na semana, com pouca resistência, e avançando progressivamente. Em duas semanas, é possível fazer uma aula completa”, explica. Nessa modalidade, as bicicletas custam de R$ 2 mil a R$ 20 mil. Fabio Rosa explica, porém, que é preciso ter cuidado ao passar do indoor para ambientes abertos. “Não adianta ir direto para uma estrada. Você, sem a prática do asfalto ou do terreno, pode se cair e se machucar.”
Como progredir nos treinos?
A progressão dos treinos de bicicleta é semelhante à dos treinos de corrida, com incremento do volume, tempo e intensidade. Segundo Rosa, o ideal são três treinos por semana com intensidade e volume inversamente proporcionais. Ou seja, quanto mais longo o treino, mais leve ele deve ser, e quanto mais curto, mais intenso. A ansiedade em aumentar a distância deve ser deixada de lado. “Nosso corpo não tem um hodômetro que entende unidades de medida. O que ele entende é tempo e esforço”, diz Rosa.
Como escolher a bicicleta adequada?
Para o iniciante, optar por um modelo ou outro – e existem muitos no mercado, com preços que variam de R$ 5 mil a R$ 150 mil – pode ser uma tarefa difícil, mas Rosa dá algumas dicas. O treinador recomenda que, no começo, se procure uma bicicleta com um preço mais acessível, que não seja muito específica. “Um equipamento mais robusto (a chamada urbana) pode atender melhor ao iniciante. Se ele gostar da prática, aí evolui para uma de acordo com a modalidade que ele escolher”, diz Rosa. Na cidade, a recomendada é uma de asfalto (speed ou road bike). No interior, com relevos diferentes, uma de montanha (mountain bike). Há ainda o modelo híbrido, parecido com a road bike, mas com pneus mais largos e freios a disco – e também serve para treinos.
Quais os acessórios essenciais?
Capacete (afivelado), óculos e luvas, para proteger as mãos em uma possível queda.
Como acertar a regulagem do guidão e do banco?
O guidão depende do modelo da bicicleta. Na híbrida, ele é mais alto. Na road ou na mountain, ele é mais baixo. São jeitos diferentes de guiar. Para o banco, basta ficar de pé ao lado da bike, perto dela. Ele precisa bater na parte de cima do quadril. Se ele ficar baixo, pode lesionar o joelho.
Qual o melhor traje?
O principal é uma bermuda adequada, mais justa, com o pad, espécie de almofada que protege as regiões de mais atrito. Para pedalar na rua, prefira camisetas de cores claras. O tênis tem que ser bem amarrado – ou use sapatilhas próprias.
Como pedalar com segurança nas ruas?
“São Paulo é uma metrópole. As ciclovias e ciclofaixas são legais, funcionam como um meio de locomoção, mas não são locais para treinos”, diz Fabio Rosa. Em ruas e avenidas, é recomendado seguir o fluxo do trânsito, sinalizar com gestos as intenções de manobras e nunca pedalar colado aos carros. Mesmo tendo direito como ciclista – os veículos devem guardar distância de 1,5 m dos ciclistas -, evite locais muito movimentados ou horários de trânsito mais pesado. Guarde o celular – se for usar algum app, prefira as orientações por voz. Para ouvir música, a maneira adequada é usar um fone que não fique no ouvido, mas nas têmporas (aftershokz), e emita o som por meio de vibração, sem prejudicar o som que vem do ambiente.

Como evitar lesões?
O uso correto de acessórios, o cumprimento das regras básicas de treino e o controle da velocidade vão ajudar o ciclista a evitar o principal risco que a atividade oferece: a queda. No mais, é preciso ficar atento a dores na região lombar, nos ombros e pescoço (geradas pela má postura) e no quadril. Quem se excede pode sofrer da síndrome do joelho do corredor ou do ciclista. Se isso acontecer, é preciso adaptar o treino e ficar de olho nos ajustes do banco e em posturas inadequadas durante a atividade.
Homens precisam ter cuidado extra?
De acordo com o urologista do HCor Antonio Corrêa Lopes, os homens podem sentir, durante o ciclismo, uma dormência na região peniana, em razão da compressão do períneo. O médico diz que não há evidências científicas de que isso possa causar, a longo prazo, qualquer disfunção erétil. “Não é bom que essa dormência aconteça. Se o treino for longo, é preciso acertar a ergonomia e prestar atenção no selim usado”, explica Lopes, que indica bancos vazados, que evitam o contato com a região perineal, ou com gel. Outra dica é pedalar pelo menos 20% do tempo em pé. Em relação à próstata, o médico diz que pode haver uma elevação discreta do PSA, proteína produzida pelo tecido prostático, o que não indica que haja qualquer problema na glândula. O resultado deve ser avaliado por um médico. “Porém, não há qualquer estudo que indique que a prática do ciclismo aumente a probabilidade de câncer de próstata”, diz o médico.

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