Dirceu Antonio Ruaro
Tenho abordado, com frequência, e nos diversos temas que trago à reflexão, nossos relacionamentos interpessoais. Tenho dito que as famílias precisam cuidar das relações interpessoais entre seus pares, especialmente entre pais e filhos, como também entre irmãos e amigos.
Vivemos uma experiência inédita a partir do evento da pandemia do Covid 19. Aprendemos que, sim, podemos permanecer “em contato” ou “conectados” o tempo todo. Inclusive nas mídias se pregava que “conectados, sim, isolados nunca!”.
É possível que precisemos reaprender a importância da presença física e o que fazer com ela. Quando olhamos para um membro de nossa família ou um amigo, certamente não nos limitamos ao olhar físico, à corporeidade da pessoa. Nesse ato de “olhar” nós vemos muito mais do que o corpo, do que a aparência física: vemos os sentimentos que temos, o amor, o carinho, os vínculos que temos e que construímos justamente pela presencialidade. Coisas que são impossíveis sem o toque, sem o olhar do “olho no olho”, sem mediação tecnológica.
Naturalmente somos pessoas do século XXI, o século das comunicações, das tecnologias, ou melhor das novas tecnologias de comunicação e informação muito especialmente.
E, radicalmente, fomos todos, obrigados a aprender a usá-las, como já dissemos, com o evento da pandemia. Não há nada de errado nisso, por favor, me entendam. Minha preocupação é como estamos lidando e educando nossos filhos e alunos para o uso das tecnologias.
Você, pai/mãe educador que lê meu texto agora poderia responder sem dúvidas, qual é a relação de seu filho/aluno com as tecnologias de informação, com as mídias, com os “canais” virtuais e redes a que assiste?
Você poderia me responder como devemos educar nossos filhos/alunos para o uso das novas tecnologias de comunicação e informação, que são onipresentes, para que possam viver como verdadeiros seres humanos?
Melhor, refazendo a questão: como você pai/mãe/educador pode preparar seu filho/educando para que use as novas tecnologias da comunicação e informação sem perder o contato com a realidade física?
Outra questão extremamente importante e atual que ocorre nas nossas casas: nossos filhos são “experts” no uso das tecnologias de informação e comunicação, mas se isolam no quarto, na sala, na mesa, como se fossem “seres invisíveis” e incapazes de ouvir.
Mas não estão conectados?
Pois é, é esse tipo de conexão a que me refiro muito especialmente. A conexão que isola, que retira a criança/adolescente do convívio familiar. Aliás, esse texto é dedicado a uma leitora que disse estar preocupada pois, quando fala com amigas que tem filhos na mesma idade, percebe que muitas delas “ acham bom que o filho(a) fique no quarto, envolvida com coisas como o celular, um livro, um vídeo, um filme, porque assim não á trabalho ou não está incomodando”.
Antes de falar do mérito disso, quero dizer que, evidentemente, as crianças e adolescentes e pais necessitam de momentos de introspecção, de recolhimento, de momentos de “consigo mesmo”, como reconhece minha leitora, mas até que ponto e de formas isso pode e deve acontecer?
É uma discussão muito séria. Claro que precisamos, nós e nossos filhos permanecer ligados ao desenvolvimento tecnológico e saber usar as tecnologias. Isso nem se discute. O que se põe em questão é que é necessário que nossos filhos sejam educados também para a realidade física, a presencialidade, os relacionamentos interpessoais.
Muitas vezes, cenas de famílias, todos na mesma mesa, em restaurantes, chamam a atenção pois, apesar de juntos, cada um está ocupado com seu celular, com seu meio de comunicação, sem perceber que aquele é um momento de “encontro físico”, de inter-relacionamento pessoal dos mais importantes.
Evidentemente que é bom “isolar-se” de vez em quando para pensar em si e nos outros.
O que penso é que precisamos responder qual o lugar que as novas tecnologias de informação e comunicação devem ocupar nas nossas vidas. Como me referi acima, não é possível viver sem a socialização necessária, sem as relações interpessoais e “fugir” para um mundo surreal ou virtual como válvula de escape para os problemas de convivência.
Dia desses, após receber essa comunicação da minha leitora, fiquei observando no meu local de trabalho grupos de alunos na “área de convivência”: falavam animadamente nos aplicativos dos celulares e estavam simplesmente “justapostos” uns aos outros, sem o menor sentido de estar juntos. Parece que a presencialidade “tira-lhes” a capacidade de se expressar.
É claro que o bom uso das tecnologias de comunicação e informação utilizados de forma madura pelos adultos e moderada pelas crianças/adolescentes pode trazer inúmeros benefícios, mas é preciso estar, preparados, como pais/mães e educadores para discutir o tema, sem radicalizar e entender quais benefícios e ou prejuízos podem trazer para a infância e a adolescência, ou seja, para a preparação do desenvolvimento das relações mais humanas entre todos nós, pense nisso, enquanto lhe desejo boa semana.
Doutor em Educação pela UNICAMP, Psicopedagogo Clínico-Institucional e Pró-Reitor Acadêmico UNIMATER