Especialistas “viajam no tempo” e projetam cenários econômicos para Pato Branco, em 2052
Antônio Menegatti
Quem nunca teve a vontade de dar uma “espiadinha” no futuro? Ou imaginou como será a vida das pessoas lá na frente? Vamos ter carros voadores? Vamos andar de skate flutuante como no filme “De volta para o futuro II”? E como seria Pato Branco daqui a 30 anos, quando atingir o centenário?
No segundo filme da trilogia, lançando em 1989, o jovem Marty Mcfly e o cientista Doc Brown avançam 30 anos no futuro, em um carro DeLorean que havia sido convertido em uma máquina do tempo, mais precisamente a 21 de outubro de 2015. Dirigido por Robert Zemeckis, o filme fez um sucesso estrondoso e é cultuado até hoje. O roteiro, de Bob Gale, acertou em previsões como acesso por biometria, TVs enormes, controles por movimento, videochamadas e cinema 3D. Também errou em várias outras, como os carros voadores e os skates flutuantes.
Não podemos pegar um carro voador, como Marty Mcfly no filme, e avançar três décadas, mas podemos analisar tendências e juntar pistas que podem indicar o que vem por aí. Quais os caminhos que podem levar a Pato Branco ao completar cem anos, em 2052, no cenário econômico?
O desenvolvimento está atrelado às políticas públicas, que interferem ou influenciam nas empresas. Há uma série de ações em andamento que, como a trilogia de “De volta para o futuro” apresenta, podem interferir diretamente no futuro.
Marcos Colla, secretário municipal de Desenvolvimento Econômico de Pato Branco, ressalta que, em um mundo globalizado, os desafios são aumentados. As incertezas econômicas, decorrentes da pandemia de covid-19 e da guerra entre Rússia e Ucrânia, são exemplos.
“É muito difícil trabalhar em longo prazo, mas temos procurado seguir com ações de curto e médio prazo e nos macroprocessos. Nesse contexto, visando o futuro, é prioritária a ampliação do aeroporto”, frisa Marcos.
Com as obras de ampliação, que devem ser concluídas em 2024, o Aeroporto Regional de Pato Branco – Professor Juvenal Loureiro Cardoso passará para categoria superior, o que permitirá receber aeronaves maiores. Os aviões a jato consomem menos combustível do que o modelo turboélice que faz a linha para Curitiba e podem transportar o dobro de passageiros. Outras companhias aéreas poderão operar em Pato Branco, com acontece no aeroporto de Chapecó (SC), por exemplo.
“Tendo mais voos, mais passageiros virão a Pato Branco, impactando em diversas cadeias: transporte das pessoas, por táxis ou carros de aplicativo, postos de combustível, bares e restaurantes e hospedagem. Hoje, Pato Branco tem déficit nesse quesito. A partir de 2023, com novos empreendimentos, terá 1.300 leitos em hotéis”, antecipa o secretário.
Os eventos de negócios, aqueles relacionados aos esportes, com os times de futsal, basquetebol e futebol, também atraem pessoas a Pato Branco, assim como os culturais, como o desfile de Natal.
“A mudança de categoria do aeroporto pode criar um círculo virtuoso. Atualmente, 8 mil pessoas por dia são atendidas no comércio de rua de Pato Branco e a tendência é de que o número aumente com o aumento da circulação. Somos um polo de saúde, também, com serviços que são referência no Estado e até em nível nacional. O transporte aéreo terá influência direta em muitos segmentos”, prevê Marcos Colla.
Polo de inovação em saúde
Cesar Giovani Colini, gerente da Regional Sul do Sebrae/PR, com sede em Pato Branco, vislumbra a centenária Pato Branco utilizando tecnologias voltadas à mobilidade urbana, com veículos elétricos, eficiência energética e voltada ao setor de saúde.
“Pato Branco deverá receber muitas novidades no setor de saúde, nos próximos anos. Em um exercício de imaginação, podemos visualizar o município como um grande polo de inovação tecnológica voltada à saúde. Com tecnologias vestíveis ou implantáveis na pele, para monitorar a saúde das pessoas”, detalha Cesar.
Para o gerente da regional do Sebrae/PR, o ecossistema de inovação poderá contribuir com o desenvolvimento de soluções para o setor e também para outra vocação regional, o agronegócio. As possibilidades, segundo ele, são muitas.
“Tecnologias voltadas à saúde, à mobilidade urbana e à eficiência energética serão o ápice nas próximas décadas e ampliarão a cadeia de valor. Precisamos ficar atentos à mobilidade urbana, pois a cidade está crescendo rapidamente”, completa Cesar.
Oportunidades e consequências
Como em toda boa obra de ficção científica que lida com viagem no tempo, a trilogia de “De volta para o futuro” ensina que toda ação tem consequências na linha temporal. Ou a falta de ações. Naido Vedana, empresário e consultor de negócios e que atende médias e grandes empresas, aponta que muitas oportunidades não estão sendo aproveitadas e que podem alavancar o desenvolvimento econômico de Pato Branco.
“Há muito dinheiro circulando em Pato Branco. Mas, em geral, é investido em imóveis. Acaba sendo um modelo de concentração de renda. Faltam fundos de investimento que sejam capazes de impulsionar os setores econômicos, com destaque para o agronegócio e a área da saúde”, pontua Naido, que também investe no setor metalmecânico e em geração de energia.
Para ele, os investidores perdem oportunidades de ganhar mais dinheiro (direta e indiretamente) e, quem quer empreender, acaba por ter menor quantidade de fontes de incentivo. “Acredito que o futuro está na criação de fundos de investimentos para apoiar empresas daqui. Por outro lado, a maioria das empresas não está preparada para receber esse tipo de investimento. Muitos empresários acham que balanços e demonstrações financeiras são apenas para grandes corporações. Não é o caso, é necessário ter registros e indicadores para demonstrar a força de suas empresas aos investidores”, avisa.
A formação de fundos institucionais, que podem impulsionar desde financiamentos de pequeno porte até grandes investimentos, poderá estar diretamente relacionada com mudanças geopolíticas. De acordo com Naido Vedana, há uma tendência de que a produção seja tirada da China em favor de outros países.
“A produção de semicondutores é de amplo interesse da indústria automobilística. Há quatro locais no Brasil que fabricam e estamos perto de ter condições de fabricar em Pato Branco”, exemplifica.
Espaço para indústrias
Para o secretário Marcos Colla, o futuro econômico de Pato Branco passa, também, pela ampliação das áreas industriais. As políticas públicas favorecem, como a lei de incentivo para empresas de base tecnológica. Mas, um dos desafios é encontrar áreas para receber essas instalações industriais.
“O município adquiriu uma área próxima ao bairro Planalto, distante cerca de 2 mil metros da rodovia, para fazer um novo parque industrial, que se somará com a ampliação do parque industrial Eduardo Daggios, no Planalto. É o que ficará pronto mais rápido, com mais 20 empresas atendidas” adianta.
O secretário complementa que a Administração Municipal teve que adquirir o terreno do futuro parque industrial, pois não havia local disponível. “Há a ideia de fazer um grande condomínio industrial, que deverá seguir a integração com o meio ambiente e a mobilidade urbana, com produtos de pequeno tamanho e alto valor agregado, transportados em voos comerciais ou de carga”, projeta Marcos Colla.
Poder da atração
Há, também, a necessidade de se atacar problemas enfrentados atualmente, e que deverão ser intensificados nas próximas décadas, como o envelhecimento da população. A redução na taxa de mortalidade, os avanços na saúde e o controle de natalidade provocam acelerada mudança no perfil demográfico do país. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) projetam que, em 2050, o Brasil terá 30% de sua população com idade acima dos 60 anos. No Paraná, a previsão é que haverá maior quantidade de idosos do que de crianças e adolescentes menores que 15 anos, somados, em 2030.
“Este é um problema que não é exclusivo de Pato Branco. Há um déficit de pessoas para ocupar vagas disponíveis, todos os meses, nas empresas. Temos pessoal que mora em cidades vizinhas e leva duas horas para vir e mais duas horas para voltar. Atrair e reter pessoas no município são nossos desafios”, confessa Marcos.
O secretário comenta que esses temas permeiam as discussões do Conselho Municipal do Desenvolvimento Econômico, incluindo questões como desenvolver áreas e bairros planejados que possam oferecer programa habitacional acessível para receber pessoas de cidades vizinhas e até de outras regiões do país.
“É um grande desafio que começará a ser trabalhado em 2023, com a realização de um inventário para identificar o potencial volume de pessoas e as áreas adequadas. Um projeto habitacional impacta em construção civil, creche, escola, posto de saúde”, lista Marcos Colla.
Educação e capacitação
Não bastará ter áreas para empresas e indústrias e atrair pessoas de outras paragens se elas não tiverem as competências e habilidades necessárias.
O Instituto Regional de Desenvolvimento Econômico e Social (Irdes) lançou, em 2020, o “Pato Branco 2030”, um documento que apresenta sugestões em sete frentes transformadoras: habitabilidade; visitabilidade (o que ter a mais para ser uma cidade encantadora aos visitantes); investibilidade (o que é preciso para ser mais atrativa aos empreendedores); ambiente potencializador; sustentabilidade; internacionalização; e compliance (o que fazer para que seja aprimorada a aplicação dos recursos públicos). Esses apontamentos podem envolver o município, governos estadual e federal, terceiro setor e iniciativa privada.
Marcelo Dalle Teze, é consultor especialista em estratégia e desenvolvimento territorial, e integrante da diretoria do Irdes e participou da elaboração do “Pato Branco 2030”. Ele antecipa que a automação, a realidade aumentada e a inteligência artificial serão fundamentais para mudar a forma como trabalhamos. Muitos empregos exigirão aprendizagem ativa e estratégias de aprendizado.
“O lifelong learning, o estudo para toda a vida, será fundamental para manutenção no mercado de trabalho. As tecnologias vão criar novos canais de contato, uma das tendências será a cocriação. Os clientes vão criar os seus próprios produtos, a impressão em 3D impactará em muitos negócios, assim como a ciência de dados”, relata.
O mercado buscará pessoas com habilidades e competências como pensamento analítico e inovação, criatividade, originalidade e iniciativa, liderança, inteligência emocional, pensamento crítico, capacidade de resolução de problemas complexos, resiliência, tolerância ao estresse e flexibilidade, entre outras. O consultor acredita que muitas novas possibilidades serão descortinadas nas próximas décadas, especialmente na economia de dados, na cibersegurança e na segurança pessoal e coletiva por tecnologias.
“O Irdes está fazendo um trabalho, visualizando essas oportunidades, com ações relacionadas à inclusão digital, à robótica e à inteligência artificial. Os conhecimentos em lógica e em programação serão cada vez mais necessários e a cultura maker, do aprender fazendo, deverá ser uma aliada daqui para a frente”, antecipa Marcelo.
As questões educacionais e de capacitação também fazem parte das discussões na Associação Empresarial de Pato Branco (ACEPB). Roberto Elias da Silva, presidente da entidade, salienta que é consenso, entre os diretores, que, para Pato Branco continuar se desenvolvendo e mantendo a qualidade de vida da população, é necessário investir em educação, tanto básica quanto profissional.
“O ensino de tecnologias, de linguagem de programação, deve estar presente desde o currículo básico de ensino. A formação de mão-de-obra qualificada é fator chave para que as empresas continuem se desenvolvendo e para que a cidade consiga atrair investimentos, pois é notória a falta de profissionais qualificados em praticamente todos os setores de nossa economia”, reconhece Roberto.
Empresário do setor de tecnologia da informação e comunicação (TIC), ele defende que as tecnologias sejam mais utilizadas em todos os setores da Administração Pública, para dar eficiência aos processos, reduzir a burocracia e proporcionar rapidez na prestação dos serviços públicos. No setor empresarial, a visão é de que adoção de inovações tecnológicas resulte em aumento da competitividade.
“Temos muitos setores interessantes que devem se destacar no futuro, além do próprio setor tecnológico. Creio que os serviços e as indústrias, em geral, devem ter um papel de maior importância. Com a digitalização crescente do comércio, a tendência é de que este enfrente mais dificuldades para atuar localmente, inclusive com indústrias vendendo diretamente aos consumidores”, aponta o presidente da ACEPB.
Governança em alta
O engenheiro civil Diogo Colella, gerente da Regional Pato Branco do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná (Crea-PR), é um entusiasta dos conceitos futuristas. Para ele, as Engenharias, a Agronomia e as Geociências ganharão mais importância nas próximas décadas.
“Os engenheiros serão cada vez mais atuantes na comunicação, na conectividade, na integração com a vida real – não somente virtual, porque, na pandemia, as pessoas descobriram a importância do convívio presencial. A vida no campo oferecerá a mesma qualidade das pessoas que vivem na zona urbana”, visualiza Diogo, que é mestre em Planejamento e Operação de Transportes pela USP, cuja dissertação foi em modelagem matemática para calibração de simuladores de tráfego, representando o comportamento dos motoristas.
De tempos em tempos, movimentos e tendências transformam nossas vidas. A revolução digital é um exemplo recente. Diante disso, Diogo Colella coloca uma série de questões que devem ser feitas pela população e para os empreendedores.
“Você pensa na sua edificação para o futuro? Ela está preparada para receber pontos de recarga veicular? Você está preparado ou pensando na tecnologia embarcada nas máquinas agrícolas e tem se aproximado de aplicativos? Sua indústria está se preparando para que os maquinários sejam geridos eletronicamente pela internet das coisas? Como está sua vida e da corporação em que atua frente aos desafios e transformações para a busca da sustentabilidade? Essas e outras perguntas terão que ser respondidas, daqui em diante”, relata.
Mas, o engenheiro descreve outra transformação em andamento, relacionada com a Governança Ambiental, Social e Corporativa, também conhecida pela sigla ESG (do inglês Environmental, Social and Governance). Trata-se de uma abordagem para avaliar qual o nível de uma organização em função de objetivos sociais, originada em 2004 e que ganhou força nos últimos anos diante dos recentes acontecimentos mundiais.
Bastante difundida em países europeus, mas ainda ganhando espaço nas organizações nacionais, a prática da ESG pode aumentar a competitividade das empresas e atrair até investimentos de capital estrangeiro. “A sociedade tem passado por profundas transformações e, com o volume e facilidade de fluxo de informações, os clientes passaram a avaliar as boas práticas que as organizações adotam para tomar decisões de investimento e de consumo. Essa tendência deve se intensificar nos próximos anos”, acredita Diogo Colella.
Não há bola de cristal ou DeLorean que nos transporte ao futuro, mas há pistas de como está sendo construído o cenário econômico do município, nas próximas décadas. Temas como sustentabilidade, conectividade, inteligência artificial, investimentos públicos e privados e planejamento estarão em pauta, cada vez mais. De certo, é que Pato Branco caminha para alcançar melhores condições econômicas e sociais aos seus habitantes, nas próximas décadas.
Nota do autor: este texto é dedicado à memória do empresário Cláudio Petrycoski, que faleceu no dia 23 de novembro de 2022, aos 73 anos. Ele tinha, em sua coleção, uma réplica do DeLorean do filme “De volta para o futuro”, lançado em 1985. Empreendedor que gerou vários negócios, Cláudio Petrycoski era um visionário e tinha seu próprio modo de antecipar tendências e incentivar o desenvolvimento econômico da região sudoeste do Paraná.
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