O longa de 1993 foi produzido por Oliver Stone e distribuído pela Columbia. Relações familiares, quatro mães chinesas radicadas nos EUA e suas filhas. Choques entre a modernidade e a tradição. The Joy Lock Club teve boas críticas, mas ganhou o rótulo de “filme de mulheres”. O tempo lhe caiu bem. A Criterion lançou o filme em DVD e Blu-Ray. O Clube foi redescoberto e revalorizado. Ganhou extensas matérias em publicações de língua inglesa – FilmComment, Sight & Sound -, para alegria de Wang, que sempre teve um carinho especial por ele. De Volta para Casa retorna às relações familiares, mas agora entre mãe e filho.
É um projeto que acompanha Wang há muitos anos. “Li a história de Lee Chang-rae na (revista) New Yorker, em 1995, e desde então acalentava fazer a adaptação. O problema não foi exatamente a dificuldade de produção. Meus filmes são baratos, não é difícil levantar recursos. Acho que era muito mais uma questão de me sentir preparado e encontrar o elenco certo.” O filme é o que, em língua inglesa, se chama de “chamber piece”, uma peça de câmara. “Transpus a história que se passa no fim dos anos 1980 para a São Francisco atual, e foi a única mudança.”
Um pequeno apartamento com vista, mas a câmera, em boa parte do tempo, fica parada no meio da sala, olhando por meio de uma abertura, o quarto ao lado, onde uma mulher agoniza em seu leito. A mãe está morrendo de câncer, o filho a acompanha, tratando dela. A curiosidade é que, embora Wang seja descendente de chineses, a família retratada é de coreanos, e eles estão na moda em Hollywood, com sucessivos prêmios no Oscar, no passado para Bong Joon-ho (Parasita), e nesse, Yoon Yeo-jeong (melhor atriz coadjuvante por Minari – Em Busca da Felicidade). Wang acha graça. “Não fiz o filme para seguir a moda, mas porque carregava a história comigo. Gosto de acompanhar mães e filhos, em geral filhas, mas dessa vez o relato de Chang-rae me tocou muito. Ele próprio adaptou a história comigo.”
Como sempre, Wang faz filmes baseados na observação. Ele admite – “Sou um observador nato, e gosto desse tom menor, quando parece que não ocorre nada, mas é a vida, com sua simplicidade e complexidade, que está sendo colocada na tela.”
Ele concorda. “Sim, é o meu tributo a (Yasujiro) Ozu. Não tem como ele para contar essas histórias familiares.” A mãe, Jackie Chung, é uma reputada atriz de teatro. O filho é Justin Chon. Falam o mínimo, e o filme valoriza o silêncio. “É uma história de perda, mas, como sempre, em geral quando se perde uma coisa se ganha outra.”
Chang-rae, no filme, abandonou o emprego, e uma namorada, em Nova York para vir cuidar da mãe. O próprio Wang fez essa passagem e hoje também tem casa em São Francisco, embora mantenha a ligação com a Big Apple. O filme permanece confinado quase todo o tempo no apartamento, mas integra a paisagem à narrativa. “É importante que o mundo invada os relatos”, reflete. De Volta para Casa poderia chamar-se Carne e Osso. Dividido entre a realidade norte-americana e a herança coreana, Chang-rae prepara um prato típico, o kalbi, seguindo a receita da mãe. Costela marinada com gengibre, a carne tem de permanecer ligada ao osso para realçar o gosto. O alimento vira metáfora da ligação entre mãe e filho.
De Volta para Casa entra na relação de filmes que abordam a gastronomia e a integram à dramaturgia. Na hora de servir à mesa, Chang-rae veste black-tie.
“Ele sabe que será a última refeição com a mãe, daí a gala. É como uma despedida.” Apesar da tosse, que talvez aponte para uma saúde precária, Wayne Wang afirma estar vivendo um momento feliz, de reconhecimento. “A Criterion está lançando meus filmes antigos com o cuidado que lhe é característico.”
As colaborações com Paul Auster? “Infelizmente, Smoke /Cortina de Fumaça e Blue in the Face/Sem Fôlego (de 1994/95) não estão podendo se beneficiar desse cuidado por causa de direitos que envolvem a produtora Miramax, ainda no imbróglio provocado pelo affair Harvey Weinstein.” O Clube da Felicidade e da Sorte? “Em dezembro passado, o filme foi acrescentado à Coleção da Library of the Congress como patrimônio cultural da América. Coloquei meu coração naquele filme, e é gratificante receber esse acolhimento.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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