O fôlego para conciliar a rotina de atleta em um clube gigante com esses afazeres à paisana teve a fórmula revelada durante uma transmissão ao vivo em que Diego participou como entrevistador. Do outro lado, quem estava sendo sabatinado era o psiquiatra Augusto Cury, “mago” da literatura de autoajuda. “Eu procuro acordar, ter meu tempo. Tomo meu café, leio a bíblia, faço meditação, escrevo um pouquinho quando dá também. Tenho esse ritual matinal que me ajuda a dar uma acertada na vida. Depois, faço umas 30 flexões que me preparam para o dia. Estou constantemente procurando encontrar esse equilíbrio”, disse o jogador durante a transmissão do streaming.
Na conversa, que também teve como pauta os problemas emocionais que afligem a sociedade atualmente, o camisa 10 do Flamengo não demonstrou receio ou medo de se expor, de aparecer como é. O assunto foi o incidente que causou a sua expulsão no jogo contra o Bahia, dia 11 de novembro, pelo Campeonato Brasileiro. No lance, após receber uma cotovelada, Diego partiu para o revide de forma descontrolada e apertou o pescoço do seu adversário.
“Foi uma situação nada normal, né? Procuro ser uma referência positiva, controlar as emoções, mas contra o Bahia não consegui fazer isso. Fui agredido, tentei chamá-lo três vezes para ver se pedia desculpa. Mas ele não olhou pra mim e tive aquela reação. Mas o erro dele não justifica o meu. Infelizmente, às vezes não somos nós. Perdemos o controle e a raiva toma conta”, disse o jogador ao se mostrar arrependido.
Pressão e responsabilidade caminham lado a lado desde os primeiros passos de Diego Ribas no futebol. Com 17 anos, a camisa 10 eternizada por Pelé no Santos caiu-lhe às costas sem peso e, como batismo, veio a conquista do Brasileiro de 2002. Esse enredo se repetiu na Gávea. Com a camisa consagrada por Zico, de mesmo número, o já veterano jogador escreve o seu nome nessa fase áurea do clube com títulos nacionais e internacionais. Diego conta sua história na publicação para que ela sirva de base para outros que possam vir atrás.
“É um grande sonho realizado. Abro minha história nos mínimos detalhes. Mostro meus acertos e erros, mas principalmente indico como aliar o seu propósito e os seus valores em busca do grande sucesso na carreira”, afirma o jogador por meio de um vídeo em sua conta no Instagram.
Usando a mesma facilidade com que muda de função para ajudar o Flamengo quando é escalado, Diego tem se mostrado à vontade também para se manifestar pelas redes sociais. É ali, no mundo digital, que ele amplifica o entusiasmo para falar dos projetos fora das quatro linhas.
“Como figura pública do futebol, eu procuro sempre compartilhar minhas alegrias e dores. Acredito que assim nós podemos nos conectar e fazer a diferença de forma positiva na vida das pessoas”, afirmou o atleta. Mais perto do fim da carreira do que do começo, Diego não se ilude mais por falsas promessas no futebol. Sabe exatamente o quanto é difícil e desafiador chegar lá, e mais ainda se sustentar em relevância por 20 anos.
Seguindo a linha de que esporte e educação juntos têm o poder de mudar vidas, o meia rubro-negro aposta na experiência adquirida em anos de futebol de alto rendimento para transformar a realidade de muita gente. “A minha ideia é transmitir para as pessoas tudo aquilo que eu passei e de alguma forma contribuir para melhorar a vida delas”.
Diego apareceu para o futebol como um meteoro. Destaque de um Santos renovado, ele e Robinho foram campeões brasileiros em 2002 e 2004. Eram a nova cara dos Meninos da Vila, muito antes de Neymar. A partir daquela conquista, a convivência com cobranças, fama, disciplina, distância dos familiares e vigilância por parte da imprensa e torcida tiveram de ser assimilados rapidamente.
As transformações não se limitaram a isso. Negociado com o futebol europeu com apenas 19 anos, ele ficou 12 temporadas jogando fora do Brasil. Está longe, portanto, da pecha de fracassado no Velho Continente. “Com 11 anos, eu já estava longe da família. Ligava para o pai e para a minha mãe todos os dias. Chorava e tive momentos grandes de frustração. Trabalhei muito tempo na Europa. Passei por muita coisa. Tive treinadores que chegavam, mudavam o sistema de jogo e me descartavam como se não fosse nada. Poderia voltar para o Brasil, mas queria vencer na Europa”, disse Diego relatando etapas de sua carreira expostas no livro. Fala de perseverança, dedicação e paciência.
Durante o seu período internacional, ele jogou em países como Portugal, Alemanha, Espanha, Itália e Turquia. O jogador, que foi medalha de bronze na Olimpíada de Pequim, em 2008, e também conquistou duas Copas América pela seleção brasileira, defendeu clubes como Porto, Werder Bremen, Wolfsburg, Atlético de Madrid, Juventus e Fenerbahçe. Não é pouco.
Paulista de Ribeirão Preto, Diego chegou ao Rio como a grande contratação do Flamengo para 2016. Era a retomada do time. A integração entre clube e torcida foi imediata. Mas alguns percalços surgiram nesse processo. Do seu início até a vinda do técnico português Jorge Jesus, ele precisou conviver com frustrações que bateram forte e deixaram marcas.”O Flamengo se preparava bem, mas não alcançava os títulos. Aí vem a cobrança, a decepção. Em alguns momentos é difícil lidar com isso. Mas vale a pena resistir e seguir em busca dos sonhos”, disse o atleta em sua Live.
UM ORADOR – Essa facilidade de expressar ideias e conceitos deu a Diego a chance de também se arriscar em outro campo: o das palestras. No próprio Flamengo ele já prestou esse tipo de auxílio ao dedicar uma apresentação para os jogadores do sub-17, por exemplo. Durante a explanação, além da naturalidade do discurso, o atleta utilizou também elementos de multimídia para tornar a palestra dinâmica e atrativa para os garotos.
“O Diego tem muita facilidade para falar e passar as coisas. A garotada gostou porque aprendeu muito com ele”, comentou Vitor Zanelli, vice-presidente de futebol de base. Como o presidente Rodolfo Landim foi reeleito no clube, algumas coisas na gestão devem permanecer as mesmas. Existe a possibilidade de Diego fazer uma transição do futebol para algum cargo no clube, não agora, mas até o fim da administração de Landim, em 2024, quando o atleta terá 39 anos.
CAMPANHA DE COMBATE AO SUICÍDIO – Diego dá paletras para combater o suicídio. Nesse segmento, porém, a frente é tomada pela mulher Bruna Letícia, que fez, de uma tragédia familiar, o combustível para tentar ajudar pessoas nesse sentido.
“Meu pai cometeu suicídio quando eu tinha sete anos. Percebi que estamos na era das doenças emocionais e tive a ideia de ir às escolas e palestrar sobre o assunto de forma leve e descontraída. A ideia é incentivar a escuta ativa e ficar alerta aos sinais de depressão e frustração das crianças e adolescentes”, afirmou Letícia durante entrevista ao canal do clube ao lado de Diego e de outros participantes.
Por meio desse projeto, chamado “Enquanto fôlego houver”, Bruna Letícia visita escolas e procura prestar auxílio sobre o tema. Monta palestras e se coloca à disposição. “Eu digo que sou uma maluca com atitude. Usei a influência do meu marido e consegui entrar em várias escolas da rede pública do Rio e é incrível como falar desse assunto o torna mais leve. Transformei minha dor em amor”, comentou a mulher de Diego.
O camisa 10 do Flamengo também entrou em ação, mas pelas redes sociais para dar sua contribuição no combate de prevenção ao suicídio. O primeiro passo nesse processo foi identificar o rapaz e entender a raiz de seus problemas. Após uma conversa, a abordagem de retorno já foi diferente. Segundo o próprio atleta conta, a lição tirada foi a de que uma atitude simples pode ter um impacto positivo na vida dessas pessoas. “A vida é isso, nós temos de ir aprendendo com aquilo que acontece. Que as pessoas não se cansem de se dar uma nova chance de seguir em frente em busca dos sonhos”, disse.
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