Flori Antonio Tasca
Uma divergência curiosa envolvendo aluno e instituição de ensino foi julgada no âmbito do Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio da 30ª Câmara de Direito Privado, no dia 18.03.2015. Sob o número 31999-06.2011.8.26.0577, a Apelação Cível, relatada pelo desembargador Marcos Ramos, trata de ação de reparação por danos morais movida por aluno contra escola devido a aspectos da sua expulsão e do que lhe ocorreu depois.
Diz o aluno que, por ter “ficado” com outra aluna nas imediações da escola enquanto uniformizado, foi penalizado com transferência compulsória, sem direito a exercício do contraditório e da ampla defesa. Não concordando com a punição, o aluno compareceu ao colégio para assistir às aulas, quando teria sofrido assédio moral de um funcionário. Conseguiu obter então uma liminar para voltar às aulas e depois disso teria passado a ser assediado moralmente por diversos professores, que tripudiavam da sua liminar.
Acrescentou ainda que foi vítima de assédio sexual por parte de uma professora, que o teria convidado a ir para a sua casa tomar um refrigerante, “mas sem sexo, porque você só tem 15 anos”. Asseverou que foi alvo de chacotas que caracterizariam bullying, o que teria lhe trazido danos psicológicos, e pleiteou reparação na quantia de R$ 200 mil.
Em primeira instância, o magistrado da causa considerou que o processo de expulsão se deu rapidamente, que o aluno foi indevidamente abordado pelo diretor e que o assunto vinha sempre à tona na sala de aula, justificando na pouca idade do aluno a sua dificuldade para entender a postura da escola. Concluía que ele teve imagem e intimidade abaladas, julgando procedente a pretensão, com reparação de R$ 20 mil.
A decisão, no entanto, foi alterada pelo relator do caso no Tribunal paulista. De acordo com ele, os autos mostraram que o real motivo da expulsão foi um contato físico de cunho sexual do qual tomaram parte o aluno, dois colegas e uma aluna, que manipulara as suas genitálias. Os alunos foram então afastados até deliberação do conselho, que decidiu por unanimidade pela transferência dos envolvidos. Lembrou o relator que os valores éticos da escola, que era adventista, justificavam padrões morais e comportamentais mais restritivos.
Também defendeu que a punição não acarretou dano moral, pois estava prevista no regulamento interno da escola e foi proporcional à atitude do aluno. Quanto ao suposto assédio dos professores, assegurou que poderia ter sido comprovado por testemunhas, mas tudo o que houve foi o relato do próprio autor. Em relação ao convite da professora, lembrou que esta, em seu depoimento, sustentou a tese de que o fizera em tom jocoso.
Ressaltou ainda que o autor não demonstrava qualquer constrangimento quanto aos fatos, ostentando postura altiva, questionando, desafiando e até mesmo zombando das situações. E observou que, caso estivesse sob constrangimento constante na escola, como alegado, seria natural que os responsáveis aceitassem a expulsão e o retirassem daquele ambiente. O aluno, entretanto, permaneceu na escola por mais um ano e meio após a sua punição. Concluiu o relator pela improcedência da pretensão do aluno.
A desembargadora Maria Lúcia Pizzotti, no entanto, divergiu do relator, apresentando a sua declaração de voto vencido. No entender dela, houve constrangimento excessivo e desnecessário ao aluno, pois ele já havia sido punido e não podia ser repreendido para sempre. Ela ressaltou que sua frequência na escola por força de decisão judicial deveria ser respeitada por todos os funcionários da escola e que estes não deveriam direcionar ao aluno sua revolta contra o ato. Considerando que foi evidente a ofensa aos diretos de personalidade, fixou a majoração da reparação por danos morais em R$ 30 mil.
Foi esclarecido pela desembargadora que a ofensa não se deu por ocasião da punição que o aluno recebeu, pois seu ato foi de considerável gravidade, mas no momento em que foi vedada a sua entrada em sala e quando virou motivo de chacota dos professores, sendo tratado com extrema diferença quando voltou à escola por força de liminar.
Prevaleceu, no entanto, a decisão do relator, que considerou as provas insuficientes para justificar a pretensão reparatória, dando ganho de causa à instituição de ensino, com a integral reforma da sentença inicial, via provimento recursal.
Educador, Filósofo e Jurista. Diretor do Instituto Flamma – Educação Corporativa. Doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná, fa.tasca@tascaadvogados.adv.br