Por Rosel Antonio Beraldo e Anor Sganzerla
Com muita alegria, mas também com relativa apreensão em todos os campos, nós cristãos estamos vivenciando o mês da Bíblia, um conjunto de livros simplesmente maravilhoso, experiências de vida de homens, mulheres, crianças, cidades e povos, uma riqueza sem igual, tudo permeado pela ação divina. A Bíblia, apesar de ser considerada erroneamente pela “alta sociedade moderna”, um livro antigo e desatualizado, tem muito a nos oferecer, mal conseguimos decifrar algumas das suas páginas, construiu-se sobre ela muitas inverdades, muitas teorias que infelizmente nas mãos de pessoas erradas tornou-se uma arma mortal de matança, domínio e exclusão. Ler a Bíblia pura e simplesmente por lê-la não levará ninguém a lugar nenhum, assim como lê-la com um rigorismo extremado poderemos ter dissabores com tudo e com todos; a Bíblia está acima e além de todos nós.
Um livro religioso em primeiro lugar, um encontro com Deus, o Senhor da História, mas também não podemos negar, repleto de forte componente político, sociológico, social, humano e filosófico, escrito numa região muito longe de nós brasileiros, a milhares de anos atrás, culturas e costumes extremamente diferente da nossa, mas nem por isso menos importante. No seu interior, não resta dúvidas, existem páginas de difícil interpretação, que ainda hoje fazem exegetas e hermeneutas perderem o sono, por outro lado existem páginas belíssimas e heroicas de personagens desde a mais tenra idade, até anciãos centenários. Absolutamente ninguém está proibido de ter acesso a esse conjunto de livros, com ele muitas pessoas encontraram aquilo que buscavam, aquilo que realmente lhes importava; nessa caminhada, importante hoje é colocar a Bíblia seriamente no seu tempo e contexto.
A Bíblia, como a conhecemos hoje, chegou-nos por um personagem muito especial, seu nome: São Jerônimo, nascido no ano de 331 D.C e falecido em 420 D.C, um retórico excepcional, conhecedor da maioria dos textos gregos e latinos, amigo pessoal de Santo Agostinho e Santo Ambrósio, dentre tantos outros, um exímio conhecedor das línguas, tradutor, exegeta, estudou em Roma por alguns anos e teve judeus proeminentes junto a si para entender e traduzir os textos sagrados para os cristãos. Foi incansável na pesquisa, não se contentou com explicações superficialmente profundas, colocou o que aprendeu em favor dos outros, sua obra atravessou o tempo e está conosco hoje; num tempo onde tudo ao que parece era, escasso e de difícil acesso, sem os meios que temos hoje, Jerônimo descobriu como poucos, o que é se aproximar de Deus; uma experiência de grande valor.
São muitos os temas tratados na Bíblia e cada um deles se abrindo para outros mais, inclusive para o tempo que estamos vivendo, pensemos no tema responsabilidade, um compromisso pessoal e coletivo para com toda a criação, hoje mais do que nunca deslocado para a crise climática e às futuras gerações, tanto lá atrás como hoje a responsabilidade exige uma resposta à altura. Um segundo tema, decorrente do primeiro é a terra como um todo, o papel dela para conosco e obviamente a nossa resposta; a terra é uma provedora do ser humano, por isso merece ser respeitada, ela nos dá o que tem de melhor, ela também precisa repousar e não somente ser sugada. Um terceiro tema, pode ser a misericórdia, palavra essa que hoje parece estar no limbo da existência, num mundo onde a força parece imperar, mas não soluciona nada, a misericórdia é uma ponte de vida.
No Brasil, um país marcadamente cristão, é tradição dedicar o mês de setembro para a Bíblia, um aproximar-se mais detalhado para com ela, sem preconceitos e muitos menos munido de armas que disparam para ela em todas as direções, ter contato com a Bíblia não é uma tarefa impossível e muito menos fácil, basta que seja dado o primeiro passo, existem exemplos grandiosos de antigamente e de agora de inúmeras pessoas que se aproximaram desse conjunto de livros, uma aproximação inclusive de pessoas que não eram cristãs. Um contato pessoal com a Bíblia não nos tornará um biblista profissional, mas com certeza poderá nos abrir portas até então insuspeitas para uma vida melhor e mais consistente. Erroneamente muitos dizem que Deus se afastou de nós, está surdo, mudo e cego para com tudo e todos; ele está muito mais perto do que imaginamos, basta abrirmos esse Livro.
Bioeticamente, a Bíblia é um projeto de vida, um convite para caminharmos melhor nesses tempos difíceis, o mundo bíblico de antes, guardadas as devidas proporções, não é nem um pouco diferente do que vivemos hoje, as mesmas alegrias, as mesmas tristezas, as mesmas apreensões, os mesmos temores, crises migratórias que a Bíblia narra, estão entre nós mais vivas do que nunca, guerras e pestes narradas nos livros sagrados, não são novidades para o “mundo moderno”, nunca foram extintas, renasceram com mais força no século XX e mais intensas no século XXI. Alegria e drama da existência humana, da concepção ao seu ocaso, são situações descritas com paixão na Bíblia. Em muitas situações, nosso mundo se arroga o direito de colocar a Bíblia no tribunal da inquisição, como se ela fosse culpada por muitos males. Os autores sagrados foram responsáveis por aquilo que escreveram, eles não são responsáveis pela maneira como lermos e interpretamos ela; portanto o campo está aberto em todas frentes para sermos melhores.
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