Arauz propõe retomar a proposta da revolução cidadã e o socialismo do século 21, que Correa iniciou, em janeiro de 2007, e manteve com mão de ferro durante uma década. No fundo, trata-se de uma forte intervenção do Estado na economia, um estilo de governo autoritário e populista.
Correa havia nomeado como sucessor Lenín Moreno, que assumiu a presidência em 2017. Mas a lua de mel entre os dois terminou seis meses depois. Às vésperas de deixar seu questionado mandato, Moreno é acusado de “traidor” por Correa.
Arauz foi escolhido como sucessor do correísmo por sua fidelidade ao projeto político do ex-presidente. Venceu o primeiro turno e esteve à frente dos outros 16 candidatos. Mas seus 32,7% não foram suficientes para garantir a presidência.
Sua candidatura não cresceu muito fora do “núcleo do correísmo”, estimado em 20% dos eleitores, segundo o cientista político equatoriano Francisco Sánchez, diretor do Instituto Iberoamericano da Universidade de Salamanca, na Espanha.
“A tendência das últimas semanas mostrou que Arauz não conseguiu crescer entre os setores que não o apoiaram no primeiro turno. Ele se concentrou no eleitorado que já tinha. Não alcançou os outros eleitores.” Segundo o cientista político e professor César Ulloa, Arauz promoveu a lógica da polarização como elemento central do seu populismo, ao buscar inimigos. “Seu adversário é personificado em Guillermo Lasso e tudo o que o ex-banqueiro representa.”
A força de Arauz é, ao mesmo tempo, sua fraqueza: a onipresença de Rafael Correa, que não pôde retornar ao Equador para concorrer à presidência em razão de uma sentença em última instância pelo crime de suborno.
A campanha de Arauz atacou os erros de Moreno, acusando-o de ter governado em conjunto com Lasso. Um de seus mantras é acusar o atual governo equatoriano de repressão durante 11 dias de protestos violentos, em outubro de 2019. “Nunca mais direitos trabalhistas violados, nunca mais uma redução no orçamento da educação, nunca mais um país de privilégios a serviço dos bancos”, foi uma das mensagens que Arauz lançou no final de sua campanha.
Para Sánchez, houve uma mudança na eleição equatoriana. Enquanto Arauz estagnou, Lasso aumentou seu porcentual de votos, em parte em razão de uma decisão estratégica de sua campanha: a incorporação do estrategista Jaime Durán Barba, que orquestrou o triunfo de Mauricio Macri na Argentina, após a “era K”, dos Kirchners.
De acordo com o Instituto de Estudos Sociais e de Opinião Pública (Iesop), Lasso está em ascensão. Em 20 de fevereiro, a diferença a favor de Arauz era de 19 pontos porcentuais (59,4% a 40,6%), mas a tendência se inverteu. Em 6 de abril, Lasso passou à frente (52,2% a 47,5), atraindo o apoio dos indecisos.
Lasso é descrito como o candidato liberal – ele propõe uma intervenção mínima do Estado na área econômica – e ligado aos conservadores, em termos de valores sociais, segundo o cientista político Paolo Moncagatta, coordenador do curso de ciências políticas da Universidade San Francisco, de Quito.
A virada estratégica da campanha de Lasso incluiu um marketing de guerrilha. Ele usou o slogan #AndresNoMientasOtraVez (“Andrés, não minta novamente”) no debate na TV, em 21 de março, ganhando mais força nas redes sociais. “O confronto contra o socialismo do século 21 foi o slogan de toda a campanha. O ‘leitmotiv’ foi a Venezuela: crise humanitária, fracasso econômico, violação das liberdades e ditadura”, disse Ulloa.
Paralelamente, ele fez um apelo a setores progressistas da sociedade: LGBTQ, ambientalistas, ativistas, com uma mensagem de união e de esperança. Segundo Ulloa, “com a imagem de uma pessoa descontraída em busca de votos nas redes sociais, Lasso saiu da forma engessada de ex-banqueiro em busca de votos”.
O ex-banqueiro, porém, não obteve o apoio de Yaku Pérez, que foi candidato à presidência do movimento indígena e ficou em terceiro lugar, atrás de Lasso, com uma diferença mínima de votos. Pérez insiste em denunciar que uma suposta fraude eleitoral prejudicou sua passagem para o segundo turno e vem defendendo o voto nulo, assim como a histórica líder do planalto central andino, Lourdes Tibán. Ambos foram, em momentos distintos, perseguidos pelo correísmo.
Tudo indica que os dois planejam uma oposição ao governo que for eleito, realizando manobras com seu bloco legislativo, que tem 26 das 137 cadeiras. O foco do movimento indígena já está voltado para 2024, quando eles tentariam uma nova candidatura presidencial.
Em qualquer um dos cenários, o novo governante enfrentará um enorme desafio: o país tem de aumentar suas receitas em US$ 22 bilhões em 2022, segundo acordo com o FMI. Um dos caminhos seria aumentar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que atualmente é de 12%, para 15%. A crise fiscal, o desemprego, a pandemia, o fechamento de empresas são algumas das razões pelas quais 90% dos equatorianos estão preocupados ou deprimidos. (Tradução de Romina Cácia).
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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