Na semana encerrada no sábado, 10, por exemplo, a média foi de 879 casos por dia, 10% a menos do que há 14 dias, mas ainda 1,3 vezes mais do que o registro do início de dezembro, como destaca análise do professor Henrique Pereira, um dos coordenadores do projeto Atlas ODS Amazonas, da UFAM. A interpretação é que as taxas estão com uma tendência de estacionamento após uma queda lenta, mas em patamares considerados elevados, semelhantes aos do início da segunda onda da pandemia no Estado.
Situação semelhante se repete entre as internações, também em tendência de estabilidade, com média 37 hospitalizações por dia, o que é 10% superior ao registrado no começo de dezembro. Já os óbitos caíram 30% em uma semana, aproximando-se da média do início de dezembro. Na segunda-feira, 19, por exemplo, foram sete confirmados. No balanço da terça-feira, 20, 28 pacientes de covid-19 aguardavam por leito no Estado, dos quais 24 eram do interior.
Pereira destaca que, como em 2020, a pandemia cresceu no Amazonas antes de outros Estados, o que justifica ter apresentado também uma queda nos números enquanto os demais estavam em colapso. “Da mesma forma, foi o epicentro precoce da pandemia. A redução de indicadores na primeira onda também aconteceu aqui primeiro, os boletins de maio já apontavam desaceleração”, compara.
“Estamos estabilizando, mas a redução desacelerou. Estamos estabilizados em um platô maior que o interior. Isso é preocupante, pois está em uma velocidade que mostra que o vírus ainda circula na população”, comenta. “Mas, se o isolamento cair de novo, esse pessoal protegido da doença vai se expor e pode ter aceleração novamente.”
Outro ponto que destaca é que o novo pico coincidiu com o período chuvoso, o chamado “inverno amazônico”, que está no fim. Por isso, o professor se preocupa com a velocidade da vacinação contra a covid-19, que precisa atingir a maior parte da população adulta preferencialmente antes do segundo semestre.
Os números de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), que incluem outras doenças respiratórias e casos de covid-19 não confirmados em testes, já mostraram que o cenário é de estabilização em um patamar mais alto do que registrado após o pico da primeira onda.
A situação foi alertada no boletim Infogripe da última semana, feito pela Fiocruz, onde é destacado que o Amazonas, o Rio Grande do Norte, o Rio Grande do Sul, Roraima e Santa Catarina apresentam “indícios de que podem estar interrompendo a tendência de queda ainda em valores significativamente elevados”. “No caso do Amazonas, caso se confirme a estabilização, ela se dá em valores acima do pico observado no mês de outubro”, ressalta o boletim.
O pesquisador da Fiocruz Amazônia Jesem Orellana salienta que a baixa testagem de covid-19 faz com os dados do SRAG sejam os mais confiáveis para acompanhar o andamento da pandemia. “Basicamente, é uma repetição de 2020, com dois agravantes: a circulação da variante P1 e a sensação de relaxamento total, muito maior do que foi em novembro, dezembro, que resultou nessa curva mais aguda”, diz.
Ele explica que uma redução era esperada devido ao crescimento rápido e intenso entre dezembro e janeiro. “É normal cair depois de uma explosão muito aguda. Os dados seguem altos. Quando se tem uma exposição massiva e se associa isso a medidas de restrição, por óbvio que vai ter redução de internação, de mortalidade.”
O cientista considera que outros países têm aprendido mais com os erros brasileiros do que o próprio País. Por isso, lamenta que os mesmos erros (como a flexibilização precoce) do ano passado estão se repetindo agora, e mais rapidamente do que em 2020. “(A redução é) muito em função da exaustão da pandemia pela total negligência, não porque Manaus tem algo legal a ensinar à humanidade. Manaus está fazendo agora um laboratório a céu aberto que permite o vírus fazer o que bem entende e precisa.”
Orellana diz que a principal medida nesse cenário seria a realização de testes em massa, monitoramento de contactantes, vigilância genômica de novas cepas e acompanhamento dos infectados para evitar que o quadro piore e necessite de hospitalização, a exemplo do que ocorre em países como a Nova Zelândia. “Agora está naturalizado ter 10, 15 mortes por dia em Manaus, estão naturalizando os altos níveis de contágio e mortalidade, o que permitiu que o vírus circulasse.”
Além disso, ele aponta que é necessário não criar “grande expectativa” em relação aos efeitos da vacinação em curto e médio prazo, pois é preciso atingir a maioria da população para parar significativamente com a circulação do vírus. “A medida que vai tendo casos novos vai abrindo possibilidade de ter novas mutações. Isso fica pior quando o processo de vacinação é lento”, diz.
O Estadão procurou o governo do Amazonas, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.
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