Flori Antonio Tasca
Uma falsa acusação de furto entre alunos em regime de internato em uma escola agrícola resultou na Apelação Cível 2008.045649-0, apreciada pela 4ª Câmara de Direito Cível do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. O caso foi julgado em sessão realizada no dia 30.08.2012, sendo relator o desembargador Luiz Fernando Boller.
Consta que vários alunos dividiam o mesmo quarto da escola e um deles comunicou ao assistente dos alunos que teriam lhe furtado uma cédula de R$ 10, cujo número de série ele havia anotado, em razão de já ter sido vítima de prática idêntica. O vigilante revistou os pertences dos alunos e acabou encontrando a nota na carteira de um deles. Este, no entanto, negou que tivesse furtado a nota, alegando que a recebera alguns dias antes como pagamento de outro aluno, o qual teria imediatamente confirmado a versão.
Enquanto a escola instaurou um inquérito disciplinar, o aluno que acusou o furto foi até a delegacia para registrar um boletim de ocorrência, mas alegando que o sumiço era de uma nota de R$ 50. Após o caso parar na delegacia, ocupantes do quarto confessaram, em comissão interna da escola, ter visto a suposta vítima mexer no armário e na carteira do acusado, anotando num papel o número de série da nota de R$ 10 que lá encontrou.
Ao que parece, ele suspeitava que o acusado já tivesse praticado um furto contra ele, possivelmente de R$ 50, quando então resolveu engendrar uma situação para prejudicá-lo. Diante do depoimento dos colegas à comissão da escola, não restou ao aluno alternativa senão assumir que havia inventado a acusação. Depois ele diria que só confessou porque sofreu pressão psicológica, mas testemunhas demonstraram que ele mesmo havia decidido confessar, depois que colegas o acusaram de ter forjado a prova.
O episódio levou a uma ação movida pelo aluno injustamente acusado pelo furto. Em primeira instância, ele se saiu vencedor, com direito a receber R$ 8 mil a título de compensação por danos morais. O outro aluno recorreu, alegando, entre outras coisas, que era ainda incapaz por ocasião do episódio, mas ficou demonstrado que ele já contava 18 anos na data do ocorrido. Também sugeriu que havia várias versões para o mesmo episódio, o que significaria se tratar de uma simulação do seu oponente.
Entretanto, ele não conseguiu convencer o relator da apelação de que não tenha agido de forma consciente, intencional e deliberada para prejudicar o colega no meio estudantil, o que demonstraria irresponsabilidade e imaturidade, pois não admitiu a farsa nem mesmo após saber que o outro seria expulso da escola. O acusado apresentava então irrepreensível comportamento e ótimo desempenho escolar, sendo grave a ofensa à sua dignidade.
Assim, sua atitude se configuraria em ato ilícito, sujeito às regras da responsabilidade civil. O relator observou que lamentavelmente era comum no ambiente escolar que crianças e adolescentes fossem alvos de manipulação e humilhação por motivações egoístas e despropositadas, conduzindo a intenso sofrimento psicológico. Considerando que era dever do Judiciário coibir esse tipo de violência, manteve a condenação, mas reduziu o valor da reparação, por entender que R$ 4 mil seria mais adequado diante das circunstâncias envolvidas.
Educador, Filósofo e Jurista. Diretor do Instituto Flamma – Educação Corporativa. Doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná. fa.tasca@tascaadvogados.adv.br
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