A Procuradoria imputa ao ex-servidor público crime previsto na própria Lei Rouanet, com previsão de pena de reclusão de dois a seis meses e multa de vinte por cento do valor do projeto, em razão de ‘qualquer discriminação de natureza política que atente contra a liberdade de expressão, de atividade intelectual e artística, de consciência ou crença, no andamento dos projetos a que se refere esta Lei’.
“O denunciado, no exercício da função de Coordenador de Análise Técnica de Projetos Culturais da Funarte, dolosa e conscientemente discriminou, por motivos políticos, o andamento do projeto “Festival de Jazz do Capão” (PRONAC 204126)”, afirma a Procuradoria.
O Ministério Público Federal informou que, em razão de Gomes não possuir antecedentes criminais, foi apresentada, juntamente com a denúncia, uma proposta de transação penal, com previsão de prestação de 200 horas de serviços à comunidade.
O MPF indica que, ao longo do procedimento criminal, foi apurado que antes de Gomes barrar a requisição de captação de recursos feita pelos organizadores do Festival de Jazz do Capão, a parecerista credenciada Daniela Correa Braga emitiu pareceres favoráveis ao evento, como mostrou o Estadão.
Gomes, autor do parecer final contra o evento, chegou a dizer ao Ministério Público Federal que os documentos anteriores foram ‘rascunhos’ feitos por uma parecerista credenciada. Por outro lado, Daniela, que também foi ouvida pela Procuradoria, apontou que a avaliação feita por Ronaldo discrepa ‘totalmente’ do padrão de pareceres da área, destacando que os pareceristas credenciados não fazem juízos estéticos, pessoais ou políticos a respeito dos projetos examinados.
O documento assinado não só por Gomes, mas também por Marcelo Nery Costa, diretor executivo da Funarte, citava Deus em diversos trechos e chamava a atenção para o ‘desvio do objeto, risco à malversação do recurso público incentivado com propositura de indevido uso do mesmo’ em razão de uma postagem feita pelo festival em 2020, em que o evento se posicionava como antifascista.
O parecer que registrava que o ‘objetivo da música não deveria ser outro além da glória de Deus’ acabou sendo questionado na Justiça, que mandou a Funarte reavaliar o pedido feito pelo Festival de Jazz do Capão para captar patrocínio por meio de leis de incentivo fiscal. A decisão ordenou que o órgão se abstenha de ‘realizar apreciação subjetiva quanto ao valor artístico ou cultural do projeto’.
A denúncia apresentada pelo MPF contra Gomes indica que a discriminação imputada ao ex-servidor da Funarte ‘consistiu na exclusão dolosa do parecer técnico favorável elaborado pela profissional designada, e na inclusão de seu próprio parecer, contrário ao projeto, apenas porque os organizadores do festival declararam, em rede social, que o evento era “antifascista e pela democracia” e que “não podemos aceitar o fascismo, o racismo e nenhuma forma de opressão e preconceito”‘.
“Ao promover, na condição de servidor público responsável pela análise técnica dos projetos submetidos ao PRONAC, o controle ideológico e político do evento “Festival de Jazz do Capão”, Ronaldo Daniel Gomes dificultou e impediu o andamento do projeto Pronac 204126, atentando contra a liberdade de expressão intelectual e artística dos proponentes e, incorrendo, com isso, nas penas do art. 39 da Lei Federal 8.313/91″, registrou a Procuradoria em nota.
COM A PALAVRA, RONALDO DANIEL GOMES
Até a publicação desta matéria, a reportagem buscou contato com o ex-servidor, mas sem sucesso. O espaço está aberto para manifestações.
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