Família: das vivências à sobrevivência!

Dirceu Antonio Ruaro

Prezados leitores, como lhes disse semana passada, estamos vivendo um tempo em que se fala de vocação e de vocações. Para muito além da vocação humana de tornar-se um profissional, há a grande vocação humana de tornar-se mãe ou pai. E, em se tratando de família, esses membros são imprescindíveis.

Evidentemente que não posso, por mais “moderno e condescendente que eu queira ser”, admitir outro tipo de figura na composição familiar, posto que uma família se compõe de pai, mãe e filhos, que na verdade pode ser pais, mães e filhos, sem problema algum, e não necessariamente nessa ordem ou com todos os membros.

É claro que a ideia do que vem a ser família, suas características, sua formação, entre outras questões, é um conceito extremamente volátil e mutável no tempo, acompanhando a evolução dos ideais sociais, das descobertas científicas e dos costumes da sociedade, sendo impossível se construir uma ideia sólida e fixa do que vem a ser família e quais suas características.

É evidente que o agrupamento que forma uma família, hoje, já não tem mais como fundamento único os laços sanguíneos, aliás, conheço e vocês, caros leitores, também conhecem” verdadeiras famílias” sem nenhum laço sanguíneo. Então, a questão é que não se pode simplesmente admitir que qualquer “agrupamento” seja uma família.

Para ser “família” um agrupamento carece de ter algumas questões de sintomia muito fina, que incluem um “amor incondicional”, “um chamado especial para convivência” com uma empatia muito acima da normalidade, um sentimento muito profundo de cuidado um pelo outro que respira à proteção incondicional e amorosa de fraternidade absoluta.

Fraternidade absoluta que, muitíssimas vezes, nem nos laços sanguíneos é encontrada. A família, pode ser, até um agrupamento de pessoas fechado para o mundo exterior e de extrema abertura para o mundo interior, porém, em alguma medida terá de abrir-se para a convivência externa visto que ninguém consegue viver num total isolamento social.

Não há como isolar a família das influencias sociais, políticas, econômicas, religiosas, ou de qualquer natureza. É impossível no tempo atual querer moldar um grupo familiar sem enfrentar os desafios que a modernidade apresenta até porque, é dificílimo entender a subjetividade das pessoas que formam o grupo familiar e mobilizar a todos para os sentimentos de empatia e fraternidade necessárias à sobrevivência grupal é uma tarefa extraordinária e extremamente complexa.

Sei que é difícil entender, mas muitos pais pensam em isolar seus filhos das influencias da TV, da Internet, dos amigos, da escola, enfim da mídia. Lêdo engano. No mundo multifacetado não há como fugir das interferências e ingerências externas. Aliás, não há mais como estabelecer limites entre externo e interno. As vivências internas e externas se mesclam tanto que muitas vezes não conseguimos separar o externo do interno.

Conheço e vocês também conhecem pais que tentaram isolar seus filhos das influencias “negativas” do mundo.  Até certa idade, de alguma maneira é até possível. Mas tanto eu quanto vocês, sabemos o que aconteceu depois. No momento em que os pais não têm mais “controle” sobre os pensamentos e as ações dos filhos, o que acontece?

Como esses filhos “subtraídos” do mundo vão agir?  Que realidades vão enfrentar? Que mundos novos vão percorrer? Que sentimentos contraditórios v]ao experimentar e vivenciar à revelia de nossas vontades e nossos ensinamentos?

Não teria sido mais sensato ter aprendido a acolher, a acompanhar, a compreender, a aceitar as diferenças de pensamento, de visões de mundo, de relacionamentos humanos, de afetividades? Não teria sido mais fraterno o exercício da escuta, do acolhimento, da compreensão, do que da repressão, da negação, do rompimento, do controle?

Penso que muito mais do que as vertigens do controle absoluto do pensamento dos filhos e das urgências de manter tudo sob controle, é preciso dar um tempo para a presença de cada um de forma que haja uma troca que humaniza, transforma, edifica, cria os elos que unem as vivências mais simples que transcende a experiência em vivência familiar, pense nisso enquanto lhe desejo boa semana.

Dirceu Antonio Ruaro
Doutor em Educação pela UNICAMP
Psicopedagogo Clínico-Institucional
Pró-Reitor Acadêmico UNIMATER

 

 

 

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