O grande professor que encantara gerações de alunos perdera a clareza do raciocínio. Impossível contar com o próprio Singer para contar sua história. Criou-se o impasse, e foi aí que Giorgetti teve acesso a uma entrevista feita em 2016. Uma hora e meia de conversa filmada em que Singer, contando linearmente sua história, já oferecia um roteiro a ser seguido. O garoto judeu cuja família abandonara a Áustria rumo ao Brasil. Só muito mais tarde Singer descobriria que aquele foi o último navio com refugiados fugitivos dos nazismo a deixar o porto de Marselha.
“Sabia quem era, mas foi quando descobri o personagem. A par de sua odisseia pessoal, digamos que quase 100%, uns 95%, do que Singer dizia batia com o que eu pensava. A diferença é que ele acreditava na militância sindical, política, e eu não. Singer era um homem de partido. Militava no PSB que se uniu aos democratas-cristãos para eleger Jânio Quadros prefeito de São Paulo nos anos 1950. Eu nunca me filiei a partido nenhum.” O título do filme dá conta desse engajamento, Paul Singer – Uma Utopia Militante. Singer seria um dos principais teóricos na formulação do que se chamou de economia solidária. Uma catadora lembra os encontros de Singer com integrantes da categoria. “Ele comia com a gente. Explicava a tal economia solidária, e já era uma coisa que a gente vinha tentando fazer.”
Para dar conta do personagem, da sua grandeza, Giorgetti abre mão de firulas narrativas. Seu filme não pretende revolucionar o documentário. “Essa coisa de inovação de linguagem parou com (Jean-Luc) Godard”, brinca É a vez de o repórter brincar: “E já faz tempo”. Giorgetti, para fazer justiça, lembra outro inovador, Robert Altman. O que ele quer dizer é que o formato de seu documentário – talking heads, as cabeças falantes, a entrevista com Singer e as outras que ele fez, com políticos e economistas, entre eles Delfim Netto-, todo esse material, acrescido de imagens de arquivo, segue a linearidade que o próprio biografado estabelece na entrevista fundadora de Uma Utopia Militante.
Para viabilizar o projeto, foi feita uma coleta – um crowdfunding – que arrecadou R$ 130 mil. Deu para fazer as entrevistas, mas para a finalização ficou faltando dinheiro. Por meio de sua produtora, SP Filmes, Giorgetti buscou apoio em vários editais. Um economista de esquerda, o conceito da economia solidária como ferramenta de combate à exclusão dos explorados e como possível oportunidade emancipatória, nada disso encontrou muito abrigo no Brasil atual. Apesar dos percalços, Giorgetti está feliz. O humanismo tem sido a tônica de sua obra. Singer é um típico personagem dele. Tão grande foi o comprometimento da equipe – trabalhando de graça, ou quase – que Giorgetti pede para lembrar nomes essenciais – o diretor de fotografia Walter Carvalho, o montador Marc de Rossi, a especialista em desenho sonoro Miriam Biderman. Finalizaram o filme no ano passado.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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