Fiscal pediu rescisão do contrato com a Covaxin só três meses após denúncia

A fiscal do contrato da Covaxin no Ministério da Saúde, Regina Célia Oliveira, entregou um documento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid informando que sugeriu a rescisão da compra no dia 24 de junho, três meses após a empresa atrasar a entrega das primeiras doses e o presidente Jair Bolsonaro ter sido alertado sobre um suposto esquema de corrupção envolvendo a negociação.

O governo decidiu suspender a compra no dia 29 de junho, mas não chegou a rescindir o contrato. A compra da vacina Covaxin é o principal alvo da CPI da Covid, que suspeita de um esquema de corrupção no Ministério da Saúde. A Precisa Medicamentos, empresa que intermediou a negociação com o laboratório indiano Bharat Biotech, é investigada pela comissão. Conforme o Estadão revelou, o governo fechou o contrato, em 25 de fevereiro, por um preço de US$ 15 por dose, 50% mais alto do que o valor inicial da oferta, de US$ 10 a unidade.

A fiscal foi convocada para depor na CPI por ter dado aval para o processo de importação, em março, mesmo após os técnicos verificarem erros e inconsistências na documentação enviada pela Precisa. Na terça-feira, 6, ela afirmou que na ocasião não verificou “nada atípico” e que deu a autorização considerando apenas o número de doses informadas em relação ao contrato. No depoimento, ela relatou que sugeriu a rescisão do contrato após cobranças feitas à Precisa. O documento foi entregue nesta sexta-feira, 9, à comissão.

No relatório assinado por Regina Célia, a fiscal relatou sucessivos pedidos para a empresa sobre o atraso no envio das doses. O Ministério da Saúde fechou um contrato de 20 milhões de doses da Covaxin. O cronograma previa o envio em cinco etapas de 4 milhões de unidades, com a primeira entrega no dia 17 de março. A Anvisa só aprovou a importação da primeira remessa no dia 4 de junho, mas estabeleceu uma série de limitações para o uso desses imunizantes no Brasil. Depois da aprovação, a empresa apresentou um novo cronograma ao ministério, prevendo entregar a primeira etapa somente 10 dias após o deferimento da Licença de Importação (LI) pela agência regulada, sem data estabelecida.

“Diante da inexecução do contrato, uma vez que o cronograma encontra-se exaurido, sugere-se avaliação da área técnica que estabeleceu as diretrizes para o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19 (PNO) quanto a pertinência na continuidade da contratação”, diz o relatório assinado pela fiscal no dia 24 de junho “Não obstante, face a inexecução do contrato sugere-se rescisão deste, conforme subitem 14.1.1 e aplicação das sanções previstas no item 12 DAS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS do Termo de Referência.”

Prints

A fiscal também apresentou à CPI prints de conversas com Tulio Belchior, advogado e representantes da Precisa Medicamentos. No dia 27 de maio, em meio aos questionamentos da pasta sobre o atraso no cronograma, ele afirmou à fiscal que estava em contato na Índia para providenciar as respostas. “Estou correndo aqui regina, fique tranquila quanto a isso”, diz a mensagem. Na resposta que chegou por ofício, a empresa alegou que somente poderia apresentar alguma expectativa quanto à execução do contrato após manifestação da Anvisa.

Com o aval limitado para a importação dado pela agência, em 4 de junho, o representante enviou novas mensagens para a fiscal manifestando otimismo com o avanço das negociações e afirmando que estava acompanhando a reunião da Anvisa. “Eu fiquei até agora acompanhando. Vem vacina para o PNI”, escreveu o representante. Em outra mensagem, no mesmo dia, ele afirmou: “Hoje foi um passo muito importante para a resolução viu, tenha certeza disso.” A fiscal, por sua vez, declarou na conversa que esperava que “tudo se resolva logo”.

O Brasil, no entanto, não recebeu nenhuma dose da Covaxin. Os preços maiores, a pressão no ministério para agilizar a importação e a disparidade do tratamento dado em relação a outros laboratórios, como o Butantan e a Pfizer, levaram a CPI da Covid a suspeitar de um esquema de corrupção e pedir provas envolvendo contatos e movimentações financeiras. O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), apelidou a Covaxin de “vacina da corrupção”.

Na quinta-feira, 8, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, afirmou que o contrato nem deveria ter sido suspenso. “Acho que não tinha nem que ter sido suspenso o processo da Covaxin, tem que se aguardar as investigações, deixar tudo pronto e se comprovar que não houve nada. Como até agora não há comprovação de que houve alguma coisa, você providenciaria mais vacina no braço do brasileiro de forma mais rápida”, afirmou.

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