Pelo menos sete mulheres já haviam registrado queixa formal contra Gomes até a quinta-feira, espalhadas pela capital e pelo interior de São Paulo. O modus operandi do “galã” era sempre o mesmo: ele se descrevia como recém-solteiro, sem filhos e avesso a aventuras sexuais ou casuais, sempre em busca de um relacionamento estável.
Uma vez fisgada, a vítima então conhecia um engenheiro “afetuoso, atencioso e carinhoso”, que por vezes se descrevia órfão e, em outros momentos, como se não tivesse vínculos com a família. Alegando sempre estar ocupado com o trabalho, ele se infiltrava no círculo social das mulheres ao mesmo tempo em que conseguia impedir o movimento contrário. Assim, elas nunca viram ou visitaram os supostos apartamentos que ele dizia ter ora nos Jardins ora na Avenida Paulista.
“Era sempre a mesma historinha, o mesmo formato. Ele roubava um dinheiro, aplicava o golpe e sumia”, conta o delegado Miguel Ferreira da Silva, da DEIC de São Bernardo do Campo. Gomes, que tinha perfis “em todo site e aplicativo de pegação imaginável”, mudava de nome e sobrenome de acordo com o perfil e nunca passava endereço ou identidade real às vítimas, variando de nome Augusto ou Ivan e o sobrenome de acordo com a ocasião.
‘Sedutor’
O primeiro golpe do “galã” de que se tem registro foi em Fernandópolis, quando ele ainda era menor de idade. Segundo a promotora Érika Pucci da Costa Leal, que atua no caso, Gomes teria seduzido a secretária de um hemocentro local e convencido a mulher a desviar R$ 30 mil do local de trabalho.
Érika se deparou com o caso quando pediu os antecedentes de Gomes após receber a denúncia de uma de suas vítimas em São Bernardo do Campo. “Então apurei que, de fato, o que ela relatava era uma prática constante dele.” Além do relato recebido pelos delegados de Fernandópolis, ela encontrou boletins de ocorrência que começavam ainda em 2012.
O pedido de dinheiro para as vítimas sempre variava, mas seguia algumas constantes. “Ele dizia que tinha bens bloqueados pela malha fina e precisava pagar imposto com urgência. Ou então propunha negócios de sociedade, como adquirir uma loja em shopping popular da região central de São Paulo”, explica a promotora.
O período de cortejo variava e, entre os relatos já ouvidos por Érika, há vítimas extorquidas em quatro dias de relacionamento e outras depois de meses se encontrando com Gomes. O dinheiro era sempre passado em espécie e, após a transação, o “galã” sumia e mudava o número de celular (foram mais de dez), que nunca era registrado em seu próprio nome. “Ele nunca trabalhou. Vive de dar golpes desde que era jovem”, comenta o delegado Silva.
Perseguição
A pedido da promotora, a 3ª Vara Criminal decretou a prisão preventiva de Gomes há três meses. A defesa do suspeito ingressou com um pedido de habeas corpus na 2ª instância, que acabou negado. Ele passou a ser considerado foragido.
Mesmo assim, Gomes manteve o estilo de vida proporcionado pelos golpes e continuou com o perfil ativo em sites e aplicativos de relacionamento, além de frequentar as mesmas academias de antes na Lapa. Érika então pediu a ajuda do delegado Ronald Quene Justiniano Marques, da DEIC de São Bernardo do Campo, que conseguiu fazer campana em dois endereços da região.
Na manhã da quinta-feira, ao se dar conta de que foi encontrado pela Polícia Civil, Gomes tentou fugir de carro pela Avenida Raimundo Pereira Magalhães. Durante a perseguição, ele acabou batendo o veículo, que está no nome de uma ex-companheira, contra outros três e foi detido. Em sua carteira, foram encontrados R$ 4 mil em espécie.
‘Estelionato sentimental’
Menos de 48 horas desde sua prisão, duas vítimas procuraram a delegacia acusando Gomes de ser o autor de golpes registrados por elas em anos passados. Outras duas serão ouvidas na semana que vem.
Durante a investigação após sua prisão, foi descoberta também uma quinta mulher com quem o “galã” se relacionava há dois meses. Ele já havia pedido a moça em casamento e havia iniciado as conversas para que ela lhe transferisse quantias de dinheiro com o objetivo de comprarem juntos um suposto imóvel.
Para Érika, o caso de Gomes é “emblemático” por se tratar de um “estelionato sentimental”, e não apenas o ressarcimento do prejuízo financeiro das vítimas. “Esse tipo de conduta constitui crime e deve ser denunciada, sendo esse caso um paradigma na esfera criminal, pois a fraude empregada foi reconhecida como apta a configurar o crime de estelionato”.
Ela observa que há um projeto de lei tramitando no Congresso Nacional, no qual se prevê a figura específica do estelionato sentimental, definido pela promotora como “indução de alguém em erro, mediante o emprego de meio fraudulento consistente em promessa de relação afetiva ou com base em relação de confiança fundada em falso vínculo amoroso, para obtenção de valores ou bens em proveito próprio ou de terceiros”.
A reportagem tentou contato com a defesa de Renan Augusto Gomes, mas não obteve sucesso.
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