Fundado há 25 anos, o grupo radicado em Suzano abriu a primeira edição do festival como uma ação de protesto. Com dificuldades para aprovar o funcionamento do espaço teatral na cidade, os integrantes construíram um local provisório que servisse para amparar poesia e revolta, segundo o ator e diretor Cleiton Pereira. “Tivemos problemas com alvará e nos apresentamos nesta casa simbólica. Ali percebemos que nascia um tipo de dramaturgia.” Logo em seguida, o grupo incendiou a casa.
Semelhante provocação se deu em 2016. Ao repensar as despesas com aluguel do espaço e a relação ainda distante com a plateia, o Contadores encontrou na despedida chance de restaurar relações. “Vale a pena pagar aluguel em uma cidade que não prestigia os artistas locais?”, o grupo se questionou à época, lembra Pereira. “Ficamos um tempo pensando se deveríamos sair de lá e buscar propostas fora da cidade.” A solução veio na forma de um corajoso convite ao público. “Amarramos um barco em uma árvore, sugerindo à cidade se deveríamos atracar ou tocar o barco. Eles escolheram que a gente deveria ficar. Então hoje nossa luta é por espaços públicos.”
Desde 2018, o grupo conseguiu a cessão de um espaço na cidade para construir sua sede, inspirada no Teatro de Contêiner da Cia Mungunzá. “Aqui é uma área de mil metros quadrados, também com contêineres. Já investimos mais de R$ 200 mil.”
Com o impacto da pandemia, a edição de 2020 foi transferida para este ano e o tema Ode aos Profanos fala a um teatro latino-americano, explica diretor. Para ele, a edição virtual do E(s/x)tirpe reconhece o afastamento causado pela pandemia, mas não se nega ao encontro. “O corpo não é permitido, mas podemos torcer pelo outro. Ao entrar em contato com isso, nos tornamos multiplicadores.”
Nesta quarta edição, se destacam espetáculos como Adiós Ayacucho, do Grupo Yuyachkani, em uma forte fábula que resgata casos de violência no Peru nos anos 1980, inspirada no romance de Julio Ortega. Na montagem, um fazendeiro decide viajar até Lima para pedir ao presidente que o ajude a recuperar as partes perdidas de seu corpo. Em La Canción del Sicomoro, a memória dos mortos se apresenta na montagem do Contraelviento Teatro, do Equador. No solo, uma mulher ouve o chamado de outra, que foi assassinada em seu quarto. Seu nome? Desdêmona, de Otelo.
Para Cleiton Pereira, a pandemia é um alerta ao mundo, em especial à América Latina. “Quando tivemos nosso momento de júbilo?”, questiona o ator e diretor. “A América Latina sempre foi um quintal social do mundo, e é preciso preservar suas forças no teatro de grupo. A arte, como a guerra, também se ocupa dos espaços, para ser testemunha do tempo.”
O Contadores também se apresenta na programação com a microssérie Rito. Passos para Quem Partiu. Na performance, os integrantes da companhia saem em marcha da sua sede, em Suzano, e caminham até a nascente do Rio Tietê, na cidade de Salesópolis. Em cada passo, a memória de uma das mais de 560 mil vítimas da covid no Brasil. “Será uma saudação ao povo que se foi, que não está aqui, em direção à vida. No final, vamos dançar para o tirano cair.”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Comentários estão fechados.