Inflação se espalha e não poupa faixa de renda

Rico ou pobre, o brasileiro está hoje cercado de inflação por todos os lados. A alta de preços dos alimentos básicos, que vinha castigando as famílias de menor renda desde o ano passado, continua mostrando a sua cara ao longo de 2021. O preço da carne, por exemplo, passa de R$ 40 o quilo e subiu o equivalente a três vezes e meia a inflação geral – que acumula alta de 9,30% em 12 meses até agosto, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (espécie de “prévia” da inflação). O óleo de soja, outro “campeão de aumentos”, já beira R$ 8 a garrafa: subiu mais de oito vezes a inflação geral do período.

A marca da inflação deste ano é que ela recebeu um componente altamente explosivo que fez a alta de preços se alastrar por toda a economia. Produtos que são considerados preços de referência, isto é, entram na formação de outros preços, como diesel e energia elétrica, dispararam e contaminaram os demais.

Deste grupo, o preço mais visível para o brasileiro de maior renda aparece na bomba de gasolina, com o litro vendido por até R$7. Para os mais pobres, o preço de referência é o gás de cozinha, cujo valor do botijão beira hoje os R$ 100, com alta de mais de 30% em 12 meses.

“A inflação deste ano está mais ‘democrática’: atinge ricos e pobres”, resume o coordenador de índices de preços da FGV, André Braz. Ele explica que, enquanto a carestia batia só nos alimentos, os mais pobres eram os mais afetados, porque consomem mais esses itens. Enquanto isso, as famílias mais abastadas não tinham a percepção, na mesma intensidade, de que a inflação tinha disparado.

Impedido de gastar com serviços, de circular de carro e de viajar de avião por causa da pandemia, o estrato social de maior renda viu muitos preços de produtos e serviços que consumia estacionados ou até em queda no ano passado por causa do isolamento social. Com isso, os ricos conseguiram poupar.

Mas o que se vê neste ano é que a pressão de preços se espalhou. A desvalorização do câmbio, que turbinou as cotações em reais do petróleo e dos combustíveis, e a crise hídrica, que afetou a geração de energia e as tarifas e reduziu a produção agrícola, fizeram a inflação tomar outro rumo.

“Agora a inflação é percebida por todos”, diz Braz. A alta do preço do arroz, prato básico que pesa no bolso do brasileiro comum, chegou a 36,89% em 12 meses até agosto. Esse aumento praticamente se equipara ao avanço do preço da gasolina no mesmo período, de 39,52%.

Difusão

Esse espalhamento aparece no porcentual de itens que estão subindo de preço no IPCA-15 divulgado ontem pelo IBGE. Agora em agosto, essa fatia está em 73,30%, e só perde para janeiro deste ano – quando bateu em 73,84%. O IPCA-15 é o mesmo medidor de inflação que o IPCA, com a diferença de que calcula o período de 30 dias que começa a cada dia 15. “Um resultado acima de 60% já seria problemático”, frisa o economista da LCA Consultores Fábio Romão. Um resultado na faixa de 70% revela, na sua avaliação, que a inflação está pegando todas as classes sociais.

Segundo o economista, há uma gama mais complexa de pressões inflacionárias atuando, e novas pressões estão a caminho. Elas estão nos serviços e nos bens industriais. Ele lembra, por exemplo, que, com a reabertura das atividades suspensas por conta do lockdown, há risco de a inflação de serviços disparar, já que as famílias de maior renda terão predisposição para gastar a poupança acumulada no período de fechamento. Também os bens industriais, que tiveram as cadeias de produção desorganizadas, ainda não voltaram à normalidade. Isso significa falta de peça, por exemplo, no carro zero, e mais inflação para o consumidor.

Hoje, até produtos que foram considerados símbolos do Plano Real (que abriu caminho para o fim da hiperinflação, na década de 90) entraram para a vala comum da alta de preços. Vinte sete anos atrás, o quilo do frango inteiro custava R$ 1. Agora, sai por quase R$ 10, com reajuste de 22,89% nos últimos 12 meses até agosto.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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