Aos poucos, quem mora no Reino Unido está recuperando certas liberdades, graças a uma campanha de vacinação eficiente e a um “lockdown” severo – o terceiro -, que durou mais de três meses e está sendo relaxado aos poucos. Esta semana começou uma fase emblemática da reabertura: amigos agora podem se abraçar – não era permitido e ainda nos cumprimentávamos com os cotovelos. Pubs e restaurantes voltaram a servir do lado de dentro e uma torcida apaixonada por futebol pôde retornar aos estádios. Como esta é a última semana da temporada, a liga reorganizou as rodadas finais para que todos os clubes recebam suas torcidas nas partidas em casa. Por enquanto, no máximo 10 mil pessoas.
No caminho até o estádio do Chelsea, torcedores se misturavam no metrô com quem voltava do trabalho. Cena comum em dias de jogos em Londres, mas algo que não se via há muito tempo. Eram grupos de amigos, famílias com crianças. Um menino carregava um cartaz pedindo uma camisa para o ídolo Kanté. “Foi muita sorte termos conseguido ingresso, achamos que esse dia não chegaria tão cedo”, comemorou o estudante Ben Vaughan, de volta a um estádio depois de um ano e três meses. “Sentir que as coisas estão voltando ao normal, ver as pessoas chegando, é incrível”.
Também é um recomeço para quem tira do futebol o próprio sustento. Há nove anos, Gary Swales vende cachecóis e bandeiras do Chelsea na porta do estádio. A reabertura é uma chance não só de recuperar a renda, mas de tentar superar uma tragédia pessoal. Swales perdeu a mãe para a covid-19 em fevereiro. Antes da nossa entrevista, pegou o celular e me mostrou, emocionado, fotos dela no aniversário de 60 anos em 2020, ao lado da filha pequena dele.
“Temos de tentar, é bom voltar a trabalhar, ver alguma normalidade”, disse. “Quando todos estiverem vacinados, talvez possamos ter estádios cheios de novo. Dependemos da volta dos turistas aqui. A Premier League (Campeonato Inglês) é uma liga global que todos querem ver. Se pudermos ter isso de volta, teremos chance”.
Perto dali, Arthur Silva, dono de um café que já foi frequentado por jogadores brasileiros do Chelsea, vive uma mistura de sentimentos. “Estou muito feliz, ao mesmo tempo preocupado com as variantes (do coronavírus) e os números de contágio aumentando. Quero que tudo corra bem para todo mundo. E espero que a gente não precise fechar de novo”, disse o brasileiro, que viu o movimento dobrar nos últimos dias.
Mesmo com uma campanha de vacinação de sucesso que promete imunizar todos os adultos no Reino Unido com a primeira dose até julho, o país vive novamente um momento de incertezas com o aumento de casos da variante indiana que coloca em dúvida a saída total do “lockdown”. Enquanto isso, autoridades tentam calcular o risco de cada etapa do desconfinamento.
Em abril e maio, o governo britânico fez um projeto-piloto em que três partidas no estádio de Wembley serviram de teste para a volta de público, incluindo a final da Copa da Inglaterra no último sábado, quando 21 mil torcedores viram o Leicester City vencer justamente o Chelsea. Se naquelas partidas era preciso apresentar um teste negativo para covid-19 para entrar no estádio, desta vez, em Stamford Bridge, o torcedor teve apenas que mostrar uma declaração atestando que não havia viajado para fora do país nos últimos seis meses nem tinha sintomas do novo coronavírus.
Do lado de dentro, precisavam usar máscaras e havia distanciamento social. Mesmo assim, as regras não diminuíram a empolgação da torcida. Havia um clima de revanche depois daquela final quatro dias antes. Os Blues deram o troco, vencendo por 2 a 1. “Estou em êxtase. Com certeza vou comemorar em um pub”, disse Sam Terry.
Depois de mais de um ano de pandemia e três “lockdowns”, os ingleses, como eles mesmos dizem por aqui, preferem ser “cuidadosamente otimistas” com o futuro. Mas, pelo menos por essa noite, os torcedores do Chelsea se deram o direito de comemorar.
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