Levantamento mostra que o Brasil perde 16% da superfície de água em 30 anos

Em 30 anos, 15,7% da superfície de água do Brasil desapareceu. No Estado mais afetado, o Mato Grosso do Sul, mais da metade (57%) de todo o recurso hídrico foi perdido desde 1990. Ali, essa redução ocorreu basicamente em um dos biomas mais importantes do País, o Pantanal.

Todos os biomas brasileiros foram afetados e suas perdas mensuradas em pesquisa inédita do MapBiomas, projeto que reúne universidades, organizações ambientais e empresas de tecnologia. Ao todo, 3,1 milhões de hectares de superfície de água sumiram, o equivalente a mais de uma vez e meia de todo o recurso hídrico disponível no Nordeste em 2020.

Das 12 regiões hidrográficas, oito revelam hoje os efeitos do desmatamento, da mudança climática e da destruição de mananciais, refletido na crise hídrica que afeta o meio ambiente e a geração de energia elétrica. “Nesse ritmo vamos chegar a um quarto (25%) de redução da superfície de água do Brasil antes de 2050”, afirmou Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas.

Após Mato Grosso do Sul, completam as três primeiras posições da lista: Mato Grosso, com perda de quase 530 mil hectares, e Minas Gerais, com saldo negativo de mais de 118 mil hectares. Boa parte dos pontos de maior redução encontram-se próximos a fronteiras agrícolas, o que sugere que o aumento do consumo e a construção de represas em fazendas, que provocam assoreamento e fragmentação da rede de drenagem, trazem prejuízos para a própria produção.

Para Maurício Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil, a pesquisa é um recado para os “tomadores de decisões de que é preciso mudar imediatamente essa trajetória de degradação que o Brasil tem escolhido”. Eles destaca que a criação de reservatórios em propriedades particulares é um dos pontos mais preocupantes.

“Quando a gente vê a discussão no Congresso sobre a flexibilização dos requisitos de licenciamento ambiental, não estão sendo considerados os cuidados que precisam ao serem feitas barragens dentro de propriedades privadas que causam perdas (para as bacias)”, analisa Voivodic.

O estudo também mostra a relação entre regiões afetadas por queimadas e redução de água. O município que mais pegou fogo entre 1985 e 2020, segundo o MapBiomas Fogo, e que mais perdeu água nesse período, foi Corumbá, no Mato Grosso do Sul. Cáceres, o quinto que mais queimou no País, é o segundo em perdas.

Além dos impactos ambientais, o problema detectado pela pesquisa implica perdas econômicas consideráveis. “Em algumas regiões de fronteira agrícola, como o Cerrado, chegar a um quarto de redução vai significar também o fim da safrinha”, diz Azevedo, se referindo às culturas anuais mais curtas e que têm grande peso financeiro para os produtores.

Relação

O alerta do pesquisador converge com o relatório do IPCC publicado neste mês. O painel climático da ONU apontou que até 2040, uma década antes do que era previsto, a temperatura média da Terra deve chegar a 1,5 grau acima dos níveis pré-industriais. Entre as consequências para o Brasil estão a perda da capacidade de produção agrícola causada por estiagens no Centro-Oeste. O mesmo efeito climático se espera no Nordeste e na Amazônia.

Por lá, o estudo do MapBiomas também mostra esses efeitos. Até mesmo a bacia do Rio Negro perdeu superfície de água. Considerando o início e o final da série, foram mais de 360 mil hectares, queda de 22%. A queda mais acentuada ocorreu entre 1999 e 2000, com redução de mais de 560 mil hectares, ou um pouco mais de 27% a menos.

O que aconteceu com essa bacia, inclusive, é um exemplo. Após reduções acentuadas, mesmo anos com mais chuvas não são capazes de recuperar o estado inicial. Ou seja, os rios recuperaram, no máximo, parte dessas perdas.

Para o coordenador do MapBiomas, o trabalho reaqlizado pela ANA (Agência Nacional de Águas) é bom e as leis que regulam o uso da água no Brasil estão bem estabelecidas. O problema está mesmo no desmatamento, mudança climática e descaso com mananciais.

A postura negacionista em relação aos ataques ao meio ambiente do governo Jair Bolsonaro (sem partido), que minimiza os impactos do desmatamento e fragiliza a fiscalização ambiental, preocupa especialistas.

Na gestão Bolsonaro, o número de focos de incêndios em regiões como Amazônia, Pantanal e Cerrado disparou. Em 2020, o Cerrado brasileiro assim como o Pantanal registraram as piores queimadas já captadas pelos satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia

De acordo com estudo do próprio MapBiomas, todos os anos, uma área maior que a Inglaterra pega fogo no Brasil. A área queimada desde 1985 chega a quase um quinto do território nacional. Foram 1.672.142 km², o equivalente a 19,6% do Brasil. O fogo e escassez hídrica acionam um sinal de alerta. “Isso reforça a mensagem aos tomadores de decisão de que é preciso mudar imediatamente essa trajetória de degradação que o Brasil tem escolhido. Os prejuízos que estamos causando ao planeta vão necessariamente impactar nossa economia”, diz o diretor do WWF-Brasil.

Plataforma colaborativa

Criado em 2015, o MapBiomas é uma rede colaborativa formada por ONGs, universidades e empresas de tecnologia que se organizam para o estudo do meio ambiente e temas transversais. Neste mês, além da pesquisa sobre recursos hídricos, a plataforma lançou um relatório sobre os focos de incêndio no Brasil. Fazem parte organizações como o Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em parceria com empresas como o Google e financiamento de fundações como Climate and Land Use Alliance e Instituto Clima e Sociedade (ICS), entre outras. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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