Dados obtidos pelo Estadão via Lei de Acesso à Informação (LAI) mostram que, em 2018, foram 65 apreensões da K4 em todo o sistema prisional do Estado de São Paulo. Em 2021, o número chegou a 1.372. Entre janeiro e abril deste ano, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) registrou outras 229.
Segundo a pasta, há uma queda no número de apreensões da K4 em 2022, ainda que o ano não tenha se encerrado, por uma “melhora consistente nos métodos de detecção da entrada da droga”. Os números, no entanto, escondem uma realidade mais ampla e preocupante, já que uma folha de tamanho A4 pode conter até 1,2 mil micropontos ou selos (equivalentes a doses) ativos da droga, que já é vendida fora do sistema prisional.
A K4 é tecnicamente classificada como um canabinoide sintético e pertence ao grupo das Novas Substâncias Psicoativas, segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). Essas moléculas são criadas em laboratório com fórmulas específicas que mimetizam os efeitos de drogas já conhecidas – como LSD, maconha, cocaína, heroína etc – e, ao mesmo tempo, conseguem burlar medidas internacionais de controle e apreensão.
CONTRABANDO. No caso específico da K4, a matéria-prima para a fabricação da droga chega ao Brasil pelo contrabando ilegal em portos, aeroportos e fronteiras terrestres. Ela vem da Ásia, de partes da Europa e do norte da África em pequenas pedras que se assemelham a sais de banho. Uma vez no País, são “cozinhadas” em laboratórios normais “de fundo de quintal” até serem transformadas em um líquido transparente. Esse líquido contém princípios ativos sintéticos e é borrifado em folhas de gramatura grossa, parecidas com papel de carta. A partir daí, os pedaços de papel (micropontos) são consumidos rasgados em meio ao tabaco ou como “selos” dissolvidos embaixo da língua, como o LSD.
FANTASMA. “A K4 apareceu inicialmente como um grande fantasma. Muito se falava em apreensão e pouco se conhecia sobre o produto, a produção e a distribuição”, afirma o promotor Tiago Dutra Fonseca, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de São Paulo. “Mas, pelo que investigamos, a forma como ela é feita e distribuída no Brasil é inédita no mundo.”
Fonseca explica que a disseminação da droga ainda se dá “de forma predominante dentro dos sistemas prisionais”, que foram usados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) como “balões de ensaio” para os efeitos da substância. Por passar “despercebida” como uma simples folha de papel, a droga já foi encontrada dentro de tubos de pasta de dente, sola de chinelos, de chuteiras, fatias de pão, pedaços de bolo, costuras de roupa, fotos, cartas etc.
Hoje, entretanto, a K4 já ultrapassou os limites das celas e pode ser encontrada “na rua”, onde um microponto (selo) custa em torno de R$ 30. “Descobrimos que o PCC tinha um caixa exclusivo, com uma equipe de contabilidade apenas para administrar a venda da K4. Em um mês, eles chegavam a lucrar mais de R$ 1 milhão só com essa droga”, afirma o promotor.
Nos Estados Unidos, o amplo acesso aos canabinoides sintéticos levou algumas partes do país a anunciarem uma “epidemia” da droga e adotarem medidas para o que logo se tornou uma crise de saúde pública. Em Nova York, por exemplo, a K2 (ou “spice”) foi tão disseminada com produtos comestíveis, incensos e misturas de ervas que o governo do Estado enrijeceu as proibições contra compostos químicos na tentativa de barrar sua comercialização.
GOVERNO. A SAP informou ao Estadão que “grandes quantidades de papel, com número exagerado de fotos impressas e pedaços de papel colocados em locais estranhos” despertam a atenção dos agentes prisionais. “Aliada às informações de inteligência, isso resultou no aumento do número de apreensões de K4 durante a pandemia, o que desestimulou a tentativa de entrada desses ilícitos a partir de 2022.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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