A fórmula consta da resolução do Órgão Especial do TJ-SP e é a primeira de um tribunal a regular o trabalho remoto após o fim da crise sanitária. A expectativa de juízes, promotores, advogados e defensores ouvidos pelo Estadão é que o modelo de Justiça remota se espalhe e provoque uma revolução tão grande quanto a do processo eletrônico.
A adoção do teletrabalho aconteceu em março de 2020. Segundo o presidente da Corte, desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco, em dez dias o TJ se organizou para prestar o serviço remoto. “Até então não imaginávamos essa possibilidade. Temos acesso diário de 33 mil computadores de fora para dentro do tribunal, só dos servidores.”
Para o desembargador, a nova realidade não significará distanciamento da Justiça da população ou dificultará o acesos das partes do processo aos juízes. A resolução do teletrabalho diz que a adesão ao sistema é facultativa, mas o magistrado que o fizer deve permanecer em sua comarca durante o trabalho remoto e acessar o e-mail funcional, onde serão marcados encontros virtuais com advogados e promotores. Atender as partes é requisito para a adesão ao sistema.
O TJ pretende estabelecer ainda uma série de metas ligadas à produtividade para os servidores que optarem pelo trabalho remoto. O objetivo é aumentar a produtividade e qualidade no serviço. De acordo com dados do TJ, houve aumento de 2,5% nas sentenças e de 20,4% nos acórdãos no primeiro trimestre deste ano ante o mesmo período de 2019. A Corte conta com 358 desembargadores e 2,2 mil juízes, além de 39,3 mil servidores.
Outra razão para a manutenção do trabalho remoto foi a economia. O TJ zerou o déficit orçamentário de 2019, deixando de gastar R$ 250 milhões em 2020. O tribunal decidiu ainda cancelar de vez a construção de duas novas torres em São Paulo, que abrigariam os gabinetes de desembargadores, ao custo de R$ 1,2 bilhão. Por fim, vai rever nos próximos anos o uso de 700 prédios próprios e alugados.
MP, OAB e Defensoria
Mário Luiz Sarrubbo, procurador-geral de Justiça, disse que o Ministério Público Estadual (MPE) é favorável ao teletrabalho. Ele está montando uma comissão para disciplinar a questão na instituição. “O trabalho presencial será mantido, pois é essencial, em razão do contato dos promotores com a população.”
Sarrubbo diz que o trabalho remoto provocou ganhos de produtividade. Citou o caso dos Grupos de Atuação Especial e repressão ao Crime Organizado (Gaecos). De 811 denúncias em 2019, eles passaram a 1.220 em 2020. E houve economia de recursos, o que permitiu modernizar a gestão. “O teletrabalho veio para ficar no sistema de Justiça e no Ministério Público.”
Para o presidente da Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Caio Augusto Silva dos Santos, o trabalho remoto deve servir para a inclusão e não para a exclusão da população. Ele lembra que o Judiciário não pode fechar a porta a quem mais dele precisa, que é a população carente.
“A população não pode pagar a conta para participar de audiências pela internet”, afirma Santos. Para ele, outro problema é garantir às testemunhas e réus um ambiente que os preserve de ameaças e constrangimentos e mantenha a idoneidade de interrogatórios e depoimentos: “Os tribunais têm sido sensíveis a essas questões”.
Segundo o defensor-geral do Estado, Florisvaldo Florentino Júnior, a Defensoria Pública acelerou sua digitalização para fazer frente à crise da pandemia. Ampliou a capacidade de seu 0800 e criou canais em seu site que, juntos, fizeram 480 mil atendimentos em 2020 nas 66 unidades das 43 cidades em que a instituição está presente. O defensor também condicionou a manutenção do teletrabalho na Justiça à não exclusão dos mais carentes.
Para o criminalista Alberto Zacharias Toron, o teletrabalho democratiza o acesso à Justiça. “Todo advogado pode fazer sustentação oral nos tribunais de Brasília e São Paulo.” Ele diz que a sustentação online tem a mesma eficácia da presencial, desde que, na conferência, todos fiquem com as câmeras ligadas. A mesma eficiência não ocorreria com os despachos: “Creio que a formalidade online atrapalha”.
Volta
O TJ volta nesta segunda-feira, 17, ao trabalho presencial misto. Completará cem mil audiências remotas criminais com réus presos nesta semana – e quer manter o sistema no pós-pandemia. A exceção será a audiência de custódia, que permanecerá presencial.
Segundo o secretário da Administração Penitenciária, Nivaldo Restivo, foram criadas salas com 726 estações de teleaudiências nas 178 unidades prisionais do Estado. A economia com a redução de escoltas de presos para os fóruns foi de R$ 12 milhões – elas caíram de 40.658 em 2019 para 9.596 em 2020. O presidente do TJ ressalta que não houve reclamação dos réus. “Se houver, o juiz pode trazer o preso e fazer pessoalmente. Quem vai gerir a necessidade da presença da testemunha e do réu é o juiz de direito no caso concreto.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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