Quando um aluno de Medicina é incentivado à prática ainda durante a graduação, ele se torna um profissional melhor, mais humano e comprometido. Mas ter bons mentores ao lado é fundamental para que se sintam seguros.
O exercício da Medicina é algo muito sério. Deixando de lado o estigma de ser uma missão ou mesmo um sacerdócio, o médico precisa de dois requisitos indispensáveis: o primeiro é conhecimento científico; o segundo é uma postura humana diante dos seus pacientes. Fora isso, é preciso persistência, compromisso e responsabilidade. E engana-se quem acredita que essas são características intrínsecas: todas essas capacidades podem ser desenvolvidas durante a formação.
Vilson Campos é médico, professor e coordenador do curso de Medicina do Centro Universitário de Pato Branco – Unidep. Ele explica que o curso de Medicina tem por objetivo formar o profissional médico em todas as áreas de competência de sua atuação, comprometido com a promoção, a prevenção e a recuperação da saúde, com base em princípios ético-humanísticos e voltado às necessidades sociais da região. “Para isso, nossa matriz curricular é baseada em metodologias ativas de ensino e aprendizagem que fomentam o protagonismo do discente e possui grande integração teoria e prática”, explica.
No caso do Unidep, trata-se de uma matriz que incentiva o aprender a aprender com a educação continuada e o desenvolvimento de diversas habilidades e competências necessárias para a formação do médico, como: liderança, autonomia, criatividade, trabalho em equipe entre outras, explica o coordenador.
Esse tipo de formação, diz o médico, resulta em profissionais em saúde críticos, reflexivos e transformadores de suas realidades, com formação humanística e que que desempenham um exercício diário de empatia e cuidado. “Além de muito conhecimento técnico, o discente precisa desenvolver habilidades de comunicação, ética, empatia, respeito, dedicação, humildade e curiosidade e ter vontade de continuar aprendendo. Esses são elementos importantes para que o aluno esteja apto para a prática profissional”, avalia.
Aprender praticando
A prática da Medicina ou na Medicina deve ser estimulada desde o início do curso e já tendo a teoria ligada a cenários práticos de atendimento ao paciente. Ao menos é o que acredita o médico reumatologista e professor do Unidep, Maicon Nunes Loureiro. “Mais especificamente no ambiente de meu trabalho ambulatorial percebo que a integração com as Unidades Básicas de Saúde e o aprimoramento constante dos ambulatórios da faculdade fornecem a experiência mais real na vida do profissional médico”, avalia.
Para ele, valores humanos e profissionais são aprimorados e integrados ao conhecimento técnico, que é estimulado a ser buscado pelos próprios alunos desde os primeiros semestres. “A desenvoltura, física e mental, é posta à prova, sendo o contato com o paciente importante para sedimentar princípios de formação íntegra e desenvolvimento de qualidades necessárias ao bom médico. Saber sobre doenças comuns, a história natural de doenças, formular dados epidemiológicos para a melhoria futura da comunidade – que são realizados nas UBSs – e conhecimento técnico – adquiridos na faculdade – são imprescindíveis para formação de generalistas e também especialistas”, acredita.
O médico reumatologista destaca que a importância de estar inserido na comunidade, entendendo seus anseios e seu estado de vida, saúde e participação social, definindo estratégias de cuidado à população. “Outra característica do aprendizado prático é o aluno assumir uma formação com maior autonomia e responsabilidade. Desta forma, a prática da Medicina deve abranger o conhecimento técnico impecável, mas também a ação de um verdadeiro profissional e ser humano médico, ético, humanista e competente junto à sociedade.”
Neste contexto, Loureiro acredita que ser professor é muito mais que um cargo ou profissão, mas que o compartilhamento de conhecimentos adquiridos por muitos anos com futuros médicos faz, e deve fazer, com que o orientador sinta-se estimulado a transmitir o que tem de mais apurado na sua experiência profissional e humana de vida. “Nosso papel é fazer médicos melhores que nós somos. Mais gratificante é isso tudo ser percebido pelos alunos, sentindo o real significado de tratar e cuidar de uma pessoa na sua essência. Ter um professor estimulante e orientador faz a diferença para toda a vida”, avalia.
Além do mais, para o professor este processo é extremamente prazeroso. “Nossa primeira turma de Medicina irá se formar em 2023, então, hoje, já são praticamente médicos, e muitos deles se tornaram amigos. Dividir seu conhecimento com futuros colegas, ser uma figura participante na sua formação, é o que mais se aproxima da palavra ‘legado’. São desafios que acontecem no dia a dia, estimulando o aprendizado mútuo e contínuo. Aprendemos muito com a docência. A Medicina não é uma ciência exata e está em constante progresso. O meio universitário é um dos degraus mais sólidos para acompanharmos esta evolução”, diz.
Confiança para o exercício da Medicina
É possível perceber, entre uma fala e outra, que a inclusão é um dos grandes desafios de quem, em um futuro breve, vai exercer a Medicina. Quem percebeu essa importância ainda durante a graduação é Vanuza Bortolan Tomazini, estudante do 8° período de Medicina, que é monitora da matéria de Libras e participa do projeto de extensão MedLibras, além de ser ligante da Liga Acadêmica de Libras e Cultura Surda (LALICS) e da Liga Acadêmica de Geriatria e gerontologia (LAGGE).
Vanuza conta que a primeira vez que se sentiu em ação foi na Unidade Básica de Saúde (UBS) do Vila Esperança, ainda no 1º período da faculdade. “Junto com os profissionais da unidade, participamos da orientação sobre alimentação saudável, realizamos a anamnese e medimos a pressão arterial dos moradores do bairro. Neste dia senti que a Medicina era o curso dos meus sonhos e que tinha a certeza que estava no caminho certo”, relembra.
Neste momento, a aluna atende no Ambulatório Escola, nas especialidades de ginecologia e obstetrícia, clínica médica, pediatria e cirurgia vascular. Ela conta que a cada 15 dias intercala duas especialidades. “Um pequeno grupo, sob orientação de um profissional médico da especialidade, atende o paciente. Após o atendimento, discutimos o seu caso em grupo. Esse processo nos dá autonomia em levantar hipóteses diagnósticas, escolher o tratamento e depois ser avaliados pelo preceptor. De forma muito dinâmica, realizamos o raciocínio clínico e aprendemos sobre a doença do caso”, explica.
Ao ter sob orientação de profissionais em quem confia, diz, ela se permite ter certeza que realizará um bom atendimento e que não deixará o paciente ir embora sem o diagnóstico, tratamento e acompanhamento mais adequado para sua doença.
“A relação entre a teoria e prática é indispensável na Medicina. Sem dúvidas, os atendimentos sob orientação de ótimos profissionais especialistas me prepara para atuar como uma médica competente e com rápido raciocínio clínico que é importante nessa profissão. A cada atendimento, mais conhecimento é agregado a minha futura carreira e, assim, aos poucos, crio mais confiança no atendimento do paciente”, avalia.
Primeiro plantão
Anaclaudia Rottini Domingues também é acadêmica do 8º período em Medicina, e se lembra quando estava no 2º período do curso e foi fazer um estágio em uma cidade do interior. Chegando lá, foi muito bem recepcionada por toda equipe de Saúde, o que a deixou mais tranquila. “Mas o tempo inteiro pensei que o coração ia sair pela boca. O nervosismo foi dando lugar para um sentimento de realização, por conseguir identificar o que aprendi nas aulas da faculdade”, relembra.
Depois disso, quase no final do plantão, chegou um paciente. O médico falou: “Ana, vai lá e começa atender, conversa com ele que eu já vou”. “No final desse meu primeiro estágio, se fosse resumir tudo em um sentimento, seria felicidade”, observa.
Para Anaclaudia, ser colocada constantemente, desde os primeiros períodos do curso, frente a situações que enfrentará no futuro ajuda para que ela se torne uma profissional apta a atuar. “Apesar da importância do embasamento teórico, a prática é essencial para o aprendizado. Isso já é descrito na literatura, uma das estratégias de aprendizado mais efetiva é aprender na prática”, acredita.