A nota pública aponta medidas do governo Jair Bolsonaro que resultaram na redução da força de trabalho da Funai e desvirtuamento da autarquia de sua missão institucional, de proteção dos povos originários.
Além disso, no bojo dos ‘retrocessos’, a Procuradoria cita ações do governo federal no combate à pandemia da covid-19, como o veto do presidente a projeto de lei que estabeleceu o Plano Emergencial para Enfrentamento à covid-19 nos territórios indígenas – caso que motivou notícia-crime em trâmite do Supremo Tribunal Federal.
“A 6ª Câmara de Coordenação e Revisão espera que os povos indígenas não mais experimentem qualquer supressão de direitos no ciclo vindouro, reafirmando sua vigilância em favor dos povos originários”, registra o MPF ao fazer o balanço da política indigenista no País entre abril de 2020 e abril de 2021.
Funai
A Procuradoria abre a nota relembrando a edição da Medida Provisória 870/2019, no primeiro dia do governo Bolsonaro, que ‘procurava esvaziar as atribuições do órgão indigenista e submeter a temática a outros interesses, notadamente os da pasta da agricultura’. A proposta acabou sendo rejeitada Congresso Nacional, mas isso ‘não impediu o enfraquecimento da autarquia e de suas atribuições, o que se dá de forma cotidiana e mediante alguns sucessivos atos’, diz a Procuradoria.
O primeiro ato citado pelo MPF é a Instrução Normativa 09 da Funai, editada em abril de 2020, para determinar a exclusão da base de dados do Sistema de Gestão Fundiária nacional de todas as terras indígenas não regularizadas. Segundo a Procuradoria, na prática, a instrução permite o reconhecimento de propriedades privadas em áreas reivindicadas por indígenas ou em processo de demarcação. O Ministério Público Federal já propôs 26 ações judiciais contra tal medida, com 19 decisões favoráveis até o momento.
Outro exemplo de retrocesso, segundo a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, é a Resolução 04/21, publicada pela Funai em janeiro deste ano. A norma restringe a autodeclaração e estabelece novos critérios para a heteroidentificação de indígenas, limitando o acesso a políticas públicas específicas para esses povos, inclusive na área de saúde, diz a Procuradoria.
A nota alerta ainda para a Instrução Normativa Conjunta 01/21, editada em fevereiro pela autarquia indígena e o Ibama. “Sob o pretexto de regulamentar o processo de licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades realizadas no interior de terras indígenas, ‘o ato busca institucionalizar o arrendamento rural nos territórios indígenas'”, ressalta o MPF.
Pandemia
No âmbito da pandemia da covid-19, a Procuradoria chama atenção para o veto do presidente Jair Bolsonaro a dispositivos do Projeto de Lei 1.142/2020, que estabeleceu o Plano Emergencial para Enfrentamento à covid-19 nos territórios indígenas.
O governo barrou trechos que previam o acesso das aldeias a água potável, materiais de higiene, leitos hospitalares e respiradores mecânicos. Por outro lado, manteve o item que autoriza a permanência de missões religiosas nos territórios indígenas, inclusive naqueles em que há presença ou registro de povos de recente contato ou em isolamento voluntário.
A nota menciona ainda a ‘resistência’ do governo federal em implementar atendimento e vacinação prioritária aos indígenas que vivem em contexto urbano ou em territórios não formalmente demarcados.
“Neste Abril de 2021 completa-se um ciclo que já dura três anos sem que nenhuma terra indígena tenha sido delimitada, demarcada ou homologada no país, aprofundando o déficit demarcatório e agravando o quadro de invasões e explorações ilegais desses territórios”, lembra ainda a Procuradoria.
Congresso e STF
Em contraponto aos retrocessos do governo federal, a Procuradoria cita medidas do Congresso Nacional e o Poder Judiciário ‘para evitar o agravamento do quadro de disruptura institucional da política indigenista’.
No caso do legislativo, a Procuradoria ressalta a derrubada do veto presidencial parcial ao Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nos territórios indígenas e a não conversão em lei da Medida Provisória no 910/2019, que se propunha a anistiar a ocupação e o desmatamento de vastas extensões de terras públicas, inclusive em territórios indígenas não definitivamente demarcados.
No âmbito da Justiça, o documento lista decisões do Supremo Tribunal Federal: a paralisação dos processos que pleiteiam reintegração de posse em áreas indígenas; a determinação ao governo federal para adoção de medidas urgentes para conter a covid-19 em territórios indígenas; a suspensão dos efeitos da Resolução 04/21 da Funai; e a admissão da ação rescisória que busca anular a decisão que não reconheceu o direito territorial do povo Guarani Kaiowá à TI Guyraroká, com base na tese do marco temporal.
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