Nossa segunda mulher marcante para este mês de março de 2024, trazemos nada mais, nada menos do que Patrícia Lourival Acioli (1964-2011), uma destacada juíza, que se notabilizou por aplicar penas severas a diferentes tipos de criminosos que atuavam na sua jurisdição, por seu comportamento destemido recebeu diversas ameaças de morte e em 11 de agosto de 2011, quando voltava para casa depois de cumprir seu expediente no fórum de São Gonçalo-RJ, foi cercada e morta com 21 tiros, por dois homens segundo relatos da época. A morte de Patrícia Acioli teve uma repercussão sem precedentes em todo o país e entre idas e vindas, as investigações deram conta que ela foi morta por alguns policiais que estavam inconformados com a sua postura rígida em relação a eles; todos os envolvidos até onde se sabe foram condenados e cumprem suas penas até os dias de hoje.
Num mundo envolvido por guerras constantes, o caso de Patrícia L. Acioli, pode hoje parecer banal ou até mesmo irrisório, mas na verdade ele mostrou na verdade, aquilo que já sabemos faz tempo, mas muitas vezes encobrimos, ou seja, toda a crueldade de que o ser humano é capaz contra o seu semelhante, principalmente contra as mulheres, sejam elas juízas, advogadas, promotoras, varredoras de rua ou que exerçam qualquer outro tipo de profissão. Praticar e levar a sério a justiça no Brasil, definitivamente não é para amadores, ainda mais em se tratando de mulheres atuando no poder judiciário, onde todos sabem é um mundo quase que exclusivo dos homens. Patrícia Acioli honrou como poucos a função que escolheu; assumiu com maestria a sua vocação e os covardes sabendo da sua vontade férrea, não viram outro jeito, senão matá-la, tentaram silenciá-la, mas em vão.
Treze anos depois, a vida, morte e exemplo de Patrícia, se mistura com tantas outras tragédias ocorridas em solo brasileiro, a juíza Patrícia como tantas outras mulheres assassinadas eram competentes no que faziam, muitas como ela sempre foram linha dura para com seus malfeitores, muitas delas e aí se inclui Patrícia, não tinham medo dos seus opositores, isso sim os deixou profundamente irados. A “justiça” que os criminosos tentaram fazer ao matar Patrícia Acioli, só os desonrou ainda mais, seus nomes foram jogados no lixo para todo o sempre e muitos deles mancharam de vergonha a instituição a que serviam; a rigidez de Patrícia ainda continua no imaginário de muitos, mas isso não se sustenta em nada, isto é, Patrícia Acioli, apenas e tão somente cumpria a sua função como magistrada; ela não inventou os bandidos, nem os crimes deles, pois todos eram públicos e notórios.
Voltando aos nossos dias, mais especificamente o ano de 2023, vamos constatar com tristeza que esse foi um ano muito difícil para a s mulheres em termos de violência, ou seja, a cada 24 horas, oito mulheres sofreram com crimes, tais como agressões, torturas, ameaças e ofensas, assédio ou feminicídio, dados revelam que essa violência aumentou 22% no ano passado em relação a 2022. A violência descontrolada veio e vem de todos os lados, ela se encontra nos lares, entre os familiares mais próximos, no Estado, no trabalho e também no mundo religioso em geral. Apesar de grandes avanços conseguidos, o tema violência contra a mulher precisa ainda mais ganhar corpo, notoriedade e conscientização por parte de todos, resumindo a questão: todos nós precisamos ainda de muita educação, precisamos trilhar um caminho longo em busca de entendimento com o outro, o diferente.
Trazer hoje a figura icônica de Patrícia Acioli, é fazer uma memória reverencial por todas aquelas mulheres que incomodaram (no bom sentido da palavra) a sociedade moderna, altamente patriarcal, colonialista e escravagista, essa dita alta sociedade tem em seu meio resquícios onde somente o mundo masculino imperava, julgava, absolvia ou condenava. Patrícia Acioli foi inúmeras vezes maior do que a estrutura rígida do poder judiciário, tanto é verdade que uma toga de juíza foi muito pouco para ela, precisaram tirar a sua vida para todos enxergarem a sua nobreza, a sua lealdade aos princípios que trazia consigo desde criança; aqueles que acharam que com a sua morte ela estaria confinada ao esquecimento, erraram feio, pois o exemplo de Patrícia Acioli transborda no tempo, ecoa na eternidade, às mulheres que um dia serão juízas não traiam seus nomes, suas origens.
Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética, Especialista em Filosofia, ambos pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, Doutor e Mestre em Filosofia, professor titular do programa de Bioética pela PUC-PR. Emails: ber2007@hotmail.com e anor.sganzerla@gmail.com
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