Rosel Antonio Beraldo e Anor Sganzerla
A Organização das Nações Unidas (ONU), um órgão que engloba ao redor de si todas as nações, mesmo que a duras penas, desconfianças e com sua voz muitas vezes abafada, recentemente se pronunciou sobre as enfermidades que o Planeta apresenta, enfermidades essas que não atuam sozinhas, mas estão todas num enorme pacote, interligadas, portanto agem em conjunto, isto é, afetando todas as dimensões da vida. Tais enfermidades quando analisadas criticamente, possuem um denominador comum que se chama “ser humano”, autor, coautor, protagonista quer direta, quer indiretamente por tudo aquilo que se vivencia planetariamente hoje; as enfermidades gestadas, criadas e liberadas do modo como aí estão, tem mesmo que em doses homeopáticas a nossa benção, o nosso beneplácito, falta infelizmente ainda uma dose muito grande de superação de tais males.
A primeira enfermidade global que a ONU cita-se COVID-19, algo que caiu como uma bomba em nossas cabeças, um ser invisível que tem potencial para parar tudo, do maior ao menor, sem distinção alguma tem posto de joelhos muitas situações que davam o ar de serem invencíveis até então; a minúscula bomba, com um poder destrutivo sem igual escancarou aquilo que se ocultava do grande público, uma desigualdade nunca vista antes, falta de leitos, medicação escassa, estruturas hospitalares defasadas, um sistema de saúde viciado numa ilusão de que tudo estava andando bem, por isso não é de se estranhar tantos cortes de verbas nesse mundo de vital importância. A COVID-19 não está explicada como deveria, atualmente apenas se nota o tratamento dos sintomas e nunca a sua raiz primeira, talvez porque os grandes responsáveis por esse horror serão revelados.
A segunda enfermidade caminha de mãos dadas com a primeira, trata-se sim da crise climática global, temperaturas extremas tanto para cima quanto para baixo encurralam os seres humanos indistintamente deixando-os vulneráveis para onde quer que se dirijam, vemos isso com clareza nas grandes levas de pessoas saindo de sua terra natal em busca de uma existência digna em outros lugares. Lamentavelmente o clima passou a ser tratado como algo irrelevante, sem serventia, quando na verdade é exatamente o contrário, ou seja, ele é fundamental para a continuação da vida; soluções mesquinhas para melhorar a situação não faltam, cai-se na tentação de se analisar o fenômeno por uma lente superficial, onde os países quando confrontados com essa realidade fogem rapidamente sem parar, por isso não é raro reuniões globais acabarem sem resultado algum, meras formalidades.
A terceira enfermidade e essa de algum modo todos estão cientes de seu enorme perigo chama-se guerra, dois países: Rússia e Ucrânia estão no epicentro da tensão, com possíveis desdobramentos para todos os lados, sobre a guerra não é preciso ser entendido para saber que ela no fim das contas nunca é boa para ninguém, a não ser para aqueles que dela se enriquecem criminosamente com a venda de armas e outras quinquilharias mortíferas. Outro ponto a ser pesado é que o uso de armas nucleares pode vir a ser utilizado por um ou ambos os lados; a Ucrânia em 1986 já teve o seu pesadelo nuclear quando da explosão do reator 04 em Chernobyl e que até hoje assombra aquela região; a enfermidade guerra pode até ser curada, mas as suas cicatrizes podem durar para todo o sempre, hoje mais do que nunca a última coisa a ser pensada é resolver os problemas por esse meio.
A quarta enfermidade que macula o século XXI é aquela que afeta o ser humano propriamente dito, ser este que encontra-se na maioria das vezes desintegrado, bem como deslocado de si mesmo, dos outros e da natureza extra-humana que o rodeia; o ser que adentrou no século XXI já veio contaminado em muitas áreas pelo século XX, só que agora ele começa a se dar conta que todos aqueles limites que ele julgava serem transponíveis, são na verdade intransponíveis; o ser do século XXI está bem no meio, tanto da sua luz, quanto da sua sombra. A tão sonhada racionalidade instrumental que o ser tem tomado como tábua de salvação para todos os males dá-lhe apenas vitórias parciais sem resultados concretos na maioria das vezes; o ser enfermo do século XXI é constantemente confrontado com o imponderável, o absurdo, justamente aquilo que o coloca rente ao chão, sem forças.
Bioeticamente, a impulsividade mental humana hoje, quando posta realmente para funcionar pode apontar essas e outras tantas enfermidades que acometem a nossa sociedade, absolutamente ninguém pode se dar ao luxo de dizer que está livre delas, pois o ser humano está inserido neste ou naquele contexto; cada enfermidade subdivide-se em outras menores, atingindo mais ora uns, ora menos outros. Só não há remédio eficaz para uma Enfermidade que é a morte, em relação às outras com certeza há curas. Um projeto verdadeiramente civilizatório deveria ser posto em prática já agora, mas bem o sabemos devido a volubilidade humana ainda levará tempo para acontecer; em meio a tantas tormentas claro que acontecem coisas boas, dignas de nota e são justamente essas coisas boas que acontecem é que se precisa dar destaque; quantas enfermidades não seriam sanadas num piscar de olhos se o entendimento humano não fosse tão mesquinho, ou seja, aquele de passar ao lado da pessoa enferma, tirar fotos, fazer um vídeo e passar adiante?
Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, é Mestre em Bioética, Especialista em Filosofia pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, é Doutor e Mestre em Filosofia, é professor titular de Bioética na PUCPR