Dirceu Antonio Ruaro
Em tempos de insegurança social, de violência nas redes sociais, nos ambientes escolares e familiares, lembrei-me de que quando era criança, uma das máximas que se ouvia dos pais era essa: “não comece a briga, não bata, mas não leve desaforo para casa”.
Pois bem, quero aproveitar essa lembrança para falar da violência familiar, escolar e social que grassa nosso tempo.
Não é privilégio dessa época a violência familiar, escolar e social. O que ocorre é que hoje, a difusão desses fatos tornou-se mais comum.
Em tempos idos, surrar os filhos e/ou alunos é fato comum, aliás, muitos pais ainda se utilizam desse método para fazer com os filhos obedeçam. E, certamente, se obedecerem é por medo da surra e não pelo respeito que devem a seus genitores (mas, esse é outro assunto).
A violência doméstica (surra) contra os filhos menores era uma forma de se manter, tanto na família quanto na escola, o respeito pelos menores aos “mais velhos”.
Evidentemente que essa forma de educar viria a deflagrar atos violentos contra os parceiros de convivência fossem ou não parentes e/ou vizinhos.
Havia, é verdade, por parte de muitas famílias certo cuidado para que as crianças não brigassem ou como era comum “puxassem” briga com os colegas de escola ou vizinhança.
Mas se as crianças apanham em casa, o ensinamento, o modelo de ação estava dado: surre que você será respeitado.
Quando os meninos, especialmente, chegavam em casa com algum sinal físico de que houvera uma “briga” os pais perguntavam de pronto se foi ele que “puxou a briga”, porque o mandamento era não provocar e nem iniciar nenhuma briga, mas se a briga era provocada por outro, então o mandamento era: não apanhe, não traga desaforo para casa.
Fiz essa reflexão inicial porque as famílias, os vizinhos, os parentes eram próximos. Os relacionamentos eram de rua, dos moradores, dos amigos, do bairro, quando muito.
Hoje, os relacionamentos são muito limitados, quando se fala em termos físicos, presenciais. Parece que os maiores amigos e conhecidos, são “amigos e conhecidos virtuais”.
Pois bem, a internet, que trouxe tantos e tantos benefícios e desenvolvimento técnico, trouxe, também, essa realidade virtual, as amizades são diluídas, não há mais limites de tempo e espaço.
Não estou lamentando isso, estou reconhecendo que estamos num terreno difuso e imenso, sem que conheçamos as famílias e as pessoas com as quais nossos filhos e alunos mantém “relacionamentos de amizade”.
Ora, o terreno virtual é um terreno fértil para todo e qualquer tipo de relacionamento. Como temos visto, grupos se constituem e pregam relações de ódio e violência contra aqueles que não pensam como eles.
Observa-se que crimes de ódio na internet estão cada vez mais recorrentes. Segundo dados da Safernet, em 2022, considerando o total desses crimes, como manifestações de racismo, LGBTIfobia, xenofobia, intolerância religiosa, neonazismo e outras apologias a crimes contra a vida, foram mais de 74 mil denúncias, quase 68% a mais do que em 2021. Casos de misoginia lideraram o ranking. Essa manifestação de ódio cresceu 184% no último ano, conforme a organização.
É muito interessante observar como vem crescendo o número de grupos misóginos, isto é, comunidades de homens que incitam o ódio e a violência às mulheres. Entre eles os “Red pill”, que defendem a crença de que a sociedade vive um momento de crise, devido à luta das mulheres por igualdade, e que é necessário recuperar a “masculinidade” e a posição de “superioridade” dos homens.
É muito importante que os pais entandam que na internet e no celular, mensagens com imagens e comentários depreciativos se alastram rapidamente e tornam o bullying ainda mais perverso. Como o espaço virtual é ilimitado, o poder de agressão se amplia e a vítima se sente acuada mesmo fora da escola. E o que é pior: muitas vezes, ela não sabe de quem se defender.
Assim como ocorre com o bullying praticado fora do ambiente virtual, o cyberbullying pode ter sérias consequências para os jovens vitimados. Em geral, um quadro inicial de isolamento e tristeza pode evoluir para sérios quadros de depressão, transtorno de ansiedade e síndrome do pânico.
Se há algum tempo podíamos intervir e amenizar as situações de relacionamento interpessoal adversas, hoje precisamos estar preparados e tomar providências para que nossos filhos e alunos possam se defender do que ocorre na “terra de ninguém” que é a Internet.
Como uma terra sem leis, as pessoas usam a máscara da distância para tirar suas próprias máscaras morais. As redes sociais evidenciam as inseguranças e revelam falhas de caráter presentes em cada um, sem distinção.
Como disse, anteriormente, A violência que antes se via nas ruas, escolas e casas, agora transcende as barreiras do espaço e particularidades.
Por isso é importante com as crianças e adolecentes negociar algumas regras de utilização da internet, além de alertar para os perigos da Internet mostrando, e analisando, exemplos verdadeiros desses perigos como os casos que a mídia apresenta, sem, evidentemente, trazer medo e paranóia nas crianças. Com relação aos casos reais é preciso antes de discuti-los verificar se não se trata de notícia falsa.
De qualquer forma é preciso dialogar com os filhos e alunos sobre as dificuldades de relacionamento que ocorrem, também, na realidade virtual, e quanto mais ensinar a respeitar o outro como ser humano, pode ser, uma das saídas possível, para se evitar o cyberbullying, pense nisso enquanto lhe desejo boa semana.
Doutor em Educação pela Unicamp, Psicopedagogo Clínico-Institucional e Pró-Reitor Acadêmico Unimater
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