Desde o princípio foi estabelecido que a cerimônia de medalhas seria diferente de outros momentos, com cada atleta no pódio recebendo sua medalha numa bandeja e colocando no próprio pescoço, sem o tradicional ritual de “receber” aquele símbolo. Mas quando Martine Grael e Kahena Kunze estavam sendo homenageadas pelo ouro na classe 49er FX, elas decidiram colocar uma na outra a medalha. Aquele gesto teve uma força simbólica enorme.
Outro momento marcante foi o beijo cinematográfico de Bruno Fratus na mulher Michelle Lenhardt, que também é sua treinadora. Ele havia acabado de colocar a medalha de bronze na prova de 50m livre no pescoço e na saída do pódio notou a presença dela no canto da arena. Foi até lá e ganhou o carinho da pessoa com quem compartilha os momentos bons e ruins da vida.
“A Michelle sempre foi apaixonada por mim. Eu costumo falar que o amor sempre vence. É amor, é diálogo, é um do lado do outro sempre, dividindo o dia a dia 24 horas por dia, treinando junto”, comentou Fratus. Michelle completou. “A gente agrega muito ao outro. Nossa parceria funcionou porque os dois fizeram a mesma coisa a vida inteira.”
Quem também mostrou que o espírito olímpico está mais vivo do que nunca foi o skate. A modalidade que estreou no programa olímpico trouxe para dentro dos Jogos de Tóquio um pouco do estilo de vida que tem. São atletas torcendo para os outros completarem suas manobras e festejando boas voltas na pista.
“A gente não tem isso de rivalidade, a gente vive assim desse jeito mesmo e mostra a amizade que construímos. É questão de senso. A gente precisa torcer para o atleta se superar, não para errar. Isso é legal para o espetáculo, imagina todo mundo acertando suas manobras? Acho que pudemos mostrar ao mundo o estilo de vida do skate”, comentou o brasileiro Luizinho Francisco.
Em um momento tão difícil para o mundo, com uma pandemia de covid-19 que já provocou a morte de mais de 4,2 milhões de pessoas e que obrigou a Olimpíada ser adiada e depois realizada sem a presença de público, os skatistas passam uma mensagem de otimismo. “É incrível estar aqui vivenciando essa história. É quase uma história que você vê em contos de fadas. Todos esses atletas competindo entre si, mas na verdade apenas torcendo uns pelos outros e querendo o melhor, se abraçando e compartilhando amor. Acho que é uma coisa que está em falta no mundo. O skate mostrou isso aqui”, disse Pedro Barros.
As comemorações no skate foram contagiantes durante as competições. Atletas foram ovacionados acertando ou errando manobras, todos se abraçavam e o clima foi de amizade. “Assim é o skate. A gente cai, levanta e vai de novo de cabeça erguida”, explicou Pedro Quintas, em discurso bem parecido com o de outros skatistas que estiveram em Tóquio.
Todos os mais de 10 mil atletas que disputaram os Jogos Olímpicos sabem da importância de uma medalha. Mas no discurso deixaram claro que, apesar de ser um feito que poucos vão conquistar, aquilo é só mais uma etapa na vida de cada um. “Essa medalha é simplesmente um detalhe, um suvenir. O Olimpo é a harmonia, o amor que tenho pela minha família. É isso que fica, isso que conta”, afirmou Pedro Barros.
Para Italo Ferreira, medalha de ouro no surfe, o raciocínio é bem parecido. Ele já ganhou o ISA Games, o Circuito Mundial e agora os Jogos Olímpicos. Mas ser “campeão de tudo” fica em segundo plano para ele. “Eu sou campeão da vida. É importante crescer e respeitar e amar as pessoas. Essa medalha pode ser que enferruje ou descasque. O dinheiro que entra na sua conta na outra semana acaba. Mas suas memórias ficam, sua história fica.”
Outro momento marcante foi o duelo no salto em altura do italiano Gianmarco Tamberi e Mutaz Essa Barshim, do Catar. Eles acabaram empatando e aceitaram dividir a medalha de ouro, algo bem raro de ocorrer numa Olimpíada. “Ele é um dos meus melhores amigos e trabalhamos juntos. É um sonho virando realidade. Esse é o espírito esportivo e a gente está aqui para passar essa mensagem”, disse Barshim.
A cada gesto de carinho dos atletas, a chama olímpica ia ficando mais forte no Japão. É triste a ausência de público por motivos sanitários, mas é um momento da vida que todos estão passando por isso, em maior ou menor grau de acordo com o lugar que estão. Se a expectativa era de que os Jogos de Tóquio levassem uma mensagem de esperança para o futuro, ela veio com os atletas.
“Somos todos seres humanos, estamos todos aqui apenas para tentar evoluir, essa é a nossa missão na vida, de que talvez o amanhã possa ser um mundo melhor, não pior do que era ontem ou hoje. No skate você está sempre caindo no chão, sempre quebrando, mas você tem pessoas ao seu lado que carregam amor, para trazer você de volta e consertar você. Esse é o exemplo, sabe? Podemos ser muito mais fortes se estivermos juntos”, concluiu Pedro Barros.
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