Assim como a planta cumpre seu ciclo, se transformando desde o momento que a semente é colocada na terra, a agricultura pato-branquense passa por mudanças desde a ocupação das primeiras glebas rurais
Pato Branco viu na última década (2012-2021) seu Valor Bruto de Produção (VBP) agropecuário — a soma de tudo que foi produzido no segmento agropecuário, incluindo agricultura, pecuária e florestas, que é divulgado pelo Departamento de Economia Rural (Deral), por sua vez, vinculado a que é ligado à Secretaria da Agricultura e do Abastecimento (Seab) —, crescer 166,17%, é o mesmo que dizer que o crescimento médio foi de 16,6% ao ano.
Ao mesmo tempo em que a produção de commodities como soja, milho, trigo e feijão tem seus valores agregados e o mercado internacional se abre, a agricultura familiar, aquela que foi responsável pelo primeiro ciclo econômico de Pato Branco há 70 anos, passa por grandes desafios.
Esta não é uma exclusividade de Pato Branco, e sim, um desafio global. Não por menos, a agência especializada para Alimentação e Agricultura (FAO) da Organização das Nações Unidas (ONU), lançou em 2019 mais uma estratégia para acabar com a fome em 2030.
A ação que dá protagonismo a agricultura familiar, para cumprir parte do segundo Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS), convida governo e sociedade a repensar o modo de vida.
Para a FAO, a geração de alimentos por parte da agricultura familiar será na próxima década a superação de problemáticas como o direito à terra, à água, a valorização do conhecimento local e a preservação da biodiversidade.
Por sua vez, a secretária de Agricultura de Pato Branco, Vanessa Casiraghi Zanon, apresenta outros elementos fundamentais a serem observados e repensados localmente, entre eles, o encolhimento das pequenas propriedades e o envelhecimento do campo.
Vanessa tem claro, que a agricultura vive uma nova transformação. No mesmo compasso que as grandes propriedades se modernizam, na outra ponta, o trabalho, que muitas vezes, segue sendo braçal vem tendo dificuldades, principalmente na sucessão familiar, uma vez que os jovens continuam a sair das propriedades em busca de melhores condições.
Assim, parece ser muito mais fácil haver sucessão familiar em ambientes produtores de commodities, do que em propriedades onde a agricultura de subsistência permanece.
E pode estar justamente neste descompasso em um mesmo setor, a justificativa para a redução do número de propriedades rurais, uma vez que desmotivados, os pequenos produtores acabam por vender suas terras a aqueles que possuem maior poder aquisitivo.
Pontuando que o poder público tem papel fundamental para “sobrevivência” da agricultura familiar, Vanessa aponta a necessidade de ações imediatas, mas que devem ser constantemente estimuladas, afinal, o real objetivo não é sobreviver, e sim perpetuar “esta agricultura que é a base da nossa formação”, fazendo menção assim, não apenas à produção de alimentos, mas também a usos e costumes.
Com um VBP agropecuário que em 2021 se aproximou de R$ 885 milhões, Vanessa reconhece toda a importância que o plantio de culturas como soja, trigo, milho, assim como produção de aves e carnes, representa para o Município, contudo, ao se mostrar preocupada com a agricultura de subsistência, ela assim como os organismos internacionais está preocupada com a geração básica de alimentos. Alimentos estes que chegam diretamente a mesa dos consumidores, mas também na alimentação escolar, uma vez que uma das políticas públicas adotadas atualmente é a da compra direta do alimento com o produtor.
“A agricultura familiar está encolhendo. Os grandes produtores têm as cooperativas que garantem a assistência técnica, tecnologia e infraestrutura, já a agricultura familiar não tem todo esse suporte”, afirma a secretária chamando para pensar estratégias de valorização e assim permanência destes pequenos produtores nas propriedades, organismos técnicos como é o caso do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR), que reúne as expertises adquiridas ao longo dos anos pelo o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (Iapar) e pelo Instituto Paranaense de Técnica e Extensão Rural (Emater).
“As grandes propriedades, com as commodities, tem uma grande relevância para a geração de divisas. Uma riqueza que somente aumenta segundo dados do VBP, mas, a agricultura familiar tem a responsabilidade de colocar o alimento na mesa, seja por frutas, verduras além de garantir a sustentabilidade das pequenas propriedades”, pontua ela, tendo claro que a da mesma forma que a tecnologia chega aos grandes produtores, ela deve ser acessada pelos pequenos, com a presença de extensionistas no campo, mas também a universidades pensando em soluções, como o estímulo de diversificação de pomares.
Um exemplo do que Vanessa entende como necessário é o que aconteceu na propriedade da família Noal, na comunidade de Passo da Ilha. A família entrega alimentos para a merenda escolar, fornece para os mercados e duas vezes por semana comercializa os produtos diretamente na Feira do Produtor. Antes de iniciar com a produção de hortaliças, seu João, prestava serviços para outros agricultores como diarista, porém há 20 anos essa realidade foi transformada e hoje a família comemora as conquistas obtidas dentro da propriedade de 50 mil metros de área.
“Sempre dependi de trabalhar por dia, e meus filhos viam aquilo. Eles não gostavam de trabalhar por dia, nem de empregados. Foi quando eles decidiram ficar na propriedade, e nós plantarmos verduras”, recorda João falando que o trabalho por dia nas propriedades vizinhas não garantia mais o sustento da família. “Nestes 20 anos, a nossa realidade mudou”, sintetiza.
Agroindústrias
Um caminho entendido por Vanessa para fortalecer a agricultura em curto e médio prazo, é geração de renda através das agroindústrias. Atualmente, estão instaladas no município quase que uma dezena de agroindústrias certificadas com o Sistema de Inspeção Municipal (SIM) e que são diversificadas entre embutidos, leite, pescado, mel e panificação.
No entanto, o objetivo é ampliar este número, bem como os setores abrangidos. Para tanto, é necessário a revisão do SIM, que está em andamento no Legislativo.
Vanessa comenta que em um curto período, já pode ser considerado um passo relevante para as agroindústrias, a conquista do Sistema Unificado Estadual de Sanidade Agroindustrial Familiar, Artesanal e de Pequeno Porte (Susaf), que permitirá a comercialização dos produtos para todo o estado. “É um caminho lento, porém sem volta. Mais que isso, tem mercado para os produtos que estão sendo produzidos pelas agroindústrias pato-branquenses e por aqueles que estão buscando se instalar.”
Sistema de acompanhamento
Além dos dados oficiais do Deral, que neste momento são os únicos que balizam a secretaria no que diz respeito a uma noção de quanto é movimentado pelo setor no Município, Vanessa diz que está em fase de implantação, um sistema interno que vai permitir a secretaria também gerar relatórios por cada cadeia produtiva.
Esta realidade passa pela necessidade de o produtor emitir a nota fiscal de todos os produtos que saem da propriedade. O que o engenheiro agrônomo do Município, Lucas Sartor Mayer destaca, é que o trabalho vem se intensificando para que o produtor emita sua nota fiscal eletrônica, evitando o deslocamento até a secretaria, e agilizando muitos processos.
Turismo rural
Valorização da arquitetura colonial, dos costumes, das belezas naturais e da gastronomia, são observadas como um atrativo para a área rural de Pato Branco, olhando pelo prisma do turismo.
Com a pavimentação asfáltica das principais vias de acesso a várias localidades, o pato-branquense passou a desbravar regiões que antes somente moradores das localidades conheciam.
O mesmo asfalto que garante o conforto e comodidade ao morador do campo, é visto como um facilitador de lazer, seja por roteiros de caminhadas, ou de ciclismo por exemplo. Este último, também percorrendo quilômetros de estradas de terra.
Vanessa acredita que cada vez mais a área rural vá receber pavimentação com asfalto, assim como com pedras irregulares, o que pode contribuir ainda mais para este “descobrir” os atrativos rurais.
“Temos belas paisagens no nosso interior, temos uma riqueza que precisa ser estimulada através do turismo rural, mas não conseguimos até o momento identificar uma família que se proponha a montar uma pousada, abrir sua propriedade para apresentar a gastronomia”, pontua a secretária falando em um trabalho que deve ser fomentado e fortalecido nos próximos anos.
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