Um dos grandes desafios para o século XXI, sem dúvida alguma tem sido o drama dos refugiados, algo que sempre houve na história humana, mas que aproximando-se o final do século XX e a entrada numa nova era, esse assunto tem cada vez mais ganhado notoriedade, isso porque ele é global como todas as outras crises, não é um problema isolado como alguns simploriamente reverberam, revelando assim um conhecimento superficialmente profundo, é algo que vem acometendo nações do norte e do sul, do leste e do oeste do globo, com maior ênfase para aqueles países considerados “pobres”. O refugiado não é refugiado porque ele quer, infelizmente na vida de cada um deles aconteceram muitas situações que não estavam sob o seu controle; o refugiado é apenas e tão somente um grão de areia nesse deserto humano chamado de sociedade planetária.
É incalculável o número daqueles seres que saem da sua terra natal, o certo é que são milhões perambulando todos os dias, somos incapazes de imaginar um campo de refugiados, aglomerações a se perderem de vista diante dos olhos, pessoas vivendo em condições mais do que precárias, torcendo ou rezando para que estejam vivos no dia seguinte, tenham o que comer e vestir, assim como aspiram por novas oportunidades. A maldade humana em relação aos refugiados não tem limites, nossa sociedade não gosta de ter esse “problema” diante dos seus olhos, nossa “alta civilização” não tem a menor simpatia por aqueles que perderam quase tudo, no máximo dão de ombros ou na pior das hipóteses julgam os refugiados como seres de terceira classe, propícios para trabalho escravo ou até mesmo forçado, exemplos nesse campo temos aos borbotões aqui e acolá.
Nosso Brasil contemporâneo conhece bem essa situação embora muitos procurem esconder ela a todo custo, é muito comum as pessoas saírem de lugares que se tornaram inóspitos, improdutivos por motivos variados, às vezes sai apenas o pai ou a mãe ou até mesmo a família inteira em busca de novas oportunidades, esse fenômeno se dá em todos os quadrantes do nosso país, pensemos por um breve momento os milhões de sulistas que foram em todas as direções, imaginemos o povo nordestino que “desceram” principalmente para a região sudeste e até hoje ajudam magnificamente na construção desse país chamado Brasil. A migração interna, mesmo que forçada tem suas vantagens, falamos uma língua apenas, na sua maioria o brasileiro é acolhedor; enfim os migrantes brasileiros apesar de grandes dificuldades, não tem outros maiores dissabores como os estrangeiros.
Então voltamos nosso olhar para os refugiados a nível mundial e aí então notamos como a sociedade de um modo geral é extremamente violenta para com os seus, em especial para aqueles que são “diferentes”, de outra crença, de outro pensamento político ou até mesmo pela sua opção sexual, a sociedade precarizada em seus fundamentos, cria modelos “perfeitos” e neles todos devem se enquadrar, ela não aceita quem lhe afronta, é insuportável para ela, quem lhe aponta o dedo e mostra todas as feridas existentes no seu meio. Hoje mais do que nunca uma série de fatores vem contribuindo para que o mar de refugiados aumente, pensemos nas guerras terríveis que estão acontecendo nesse exato instante, pensemos quantos estão nas estradas correndo todo tipo de perigo, pensemos naqueles que estão atravessando o mediterrâneo em embarcações miseráveis; são muitos.
Não é difícil imaginar os inúmeros impactos que as migrações forçadas vêm causando em todo mundo, todos de um modo ou de outro são afetados, a vida regrada em todas as suas esferas até então, é agora sacudida por olhares assustados, rostos famintos, desesperados, mal vestidos, doentes e cansados de tudo, com a chegada dos estrangeiros os ânimos se exaltam, ofensas de todo tipo são a eles dirigidas, muito comum tem sido mandarem embora essas pessoas de volta para seus países de origem, isso revela a trágica verdade, isto é, aqueles que mais se beneficiaram dos países hoje em crise, os que mais dilapidaram suas antigas colônias, são os que mais negam ajuda, são aqueles que mais viram as costas para os seus antigos serviçais; os países do hemisfério norte são aliás mestres na arte de nunca revisitarem a sua história como deveria, são uns mal agradecidos.
Bioeticamente, o drama do refugiado é algo a ser repensado com urgência, tanto a nível global, quanto local, é um fenômeno de dimensões ímpares, fazendo parte da policrise planetária, realidade complexa que não será resolvida somente com discursos vazios e boas intenções pela metade, os refugiados são muito mais do que isso, são pessoas de todas as idades que passam por grandes privações onde quer que se encontrem, sendo as mais comuns: rejeição, falta de assistência na área da saúde, alimentação, vestuário, documentos, sem contar que no meio disso tudo existem máfias especializadas em contrabandear tais pessoas para os mais diversos fins. Nosso mundo carece de muitas coisas hoje, as principais sendo: falta de diálogo e desinteresse pelo que ocorre no quintal do meu vizinho, sempre a bola é passada para outro e assim sucessivamente; não é o erguimento de muros que irá barrar a entrada dessas pessoas em nosso meio; assim como nós, o refugiado tem sonhos, almeja uma vida melhor para si e os seus e tem esperanças.
Rosel Antonio Beraldo, mora em Verê-PR, Mestre em Bioética e Especialista em Filosofia pela PUC-PR; Anor Sganzerla, de Curitiba-PR, é Doutor e Mestre em Filosofia, é professor titular de Bioética na PUCPR.
Comentários estão fechados.