Um valor que me foi transmitido pelos meus saudosos pais e que agradeço cotidianamente é o da honestidade. Se eles ainda vivessem nos dias de hoje, certamente jamais “entenderiam” a desonestidade que impera inescrupulosamente. Ser “honesto” já quase virou sinônimo de ser “trouxa”!
Honestidade é a palavra e a realidade que indicam a qualidade de ser verdadeiro: não mentir, não fraudar, não enganar. Quanto à etimologia, a palavra honestidade vem do latim honos/honestitas, que traduz a qualidade do que é honesto. Portanto, honestidade faz referência àquele ou àquela que é decente, razoável, íntegro(a), recatado(a), reservado(a), justo(a), probo(a), reto(a), verdadeiro(a), sincero (a), honrado(a)… pode-se ainda acrescentar mais facetas. Em outras palavras, a honestidade constitui uma qualidade humana que consiste em comportar-se e expressar-se com sinceridade e coerência, respeitando os valores da verdade e justiça.
O filósofo chinês Confúcio (551 a.C.-479 a.C.) já apresentou uma diferença progressiva da honestidade em três níveis. Em outras palavras próprias dele, podemos classificar assim os três níveis: o primeiro nível, denominado Li, é a honestidade consigo mesmo, pois, fundamentados nas Sagradas Escrituras Cristãs, cada ser humano é “feito à imagem e semelhança de Deus”; o segundo nível, denominado Yi, é a honestidade consigo e com os outros, porque, também, baseados nas Sagradas Escritura Cristãs, somos todos “filhos de Deus e irmãos uns dos outros”; e o terceiro nível, denominado Ren, é a honestidade consigo mesmo, com os outros e com Deus, pois, igualmente, iluminados pela Palavra de Deus, temos clareza que somos co-criadores do Senhor da Vida e, por isso mesmo, responsáveis honestos pelo cuidado da vida da “Casa Comum” e responsáveis honestos pela verdade e justiça, pela ética e paz da civilização que estamos construindo.
As perguntas que se impõem neste momento da reflexão: vale a pena ser honesto?; vale a pena remar contra a maré alta da desonestidade? Nada melhor para responder as perguntas é trazer presente uma fábula: “Há muito tempo, na China, vivia um menino chamado Ping, que adorava flores. Tudo o que ele plantava, florescia maravilhosamente. O Imperador gostava muito de pássaros e outros animais, mas o que ele mais apreciava eram as flores. Acontece que o Imperador estava muito velho e precisava escolher um sucessor. Quem poderia herdar seu trono? Como fazer essa escolha? Já que gostava muito de flores, o Imperador resolveu deixar as flores escolherem. No dia seguinte ele mandou anunciar que todas as crianças do reino deveriam comparecer ao palácio. Cada uma delas receberia do Imperador uma semente especial. – “Quem provar que fez o melhor possível com a semente dentro de um ano” – declarou ele – “será meu sucessor”. A notícia provocou muita agitação! Crianças do país inteiro dirigiram-se ao palácio para pegar suas sementes de flores. Ping recebeu sua semente do Imperador e ficou felicíssimo. Tinha certeza de que seria capaz de cultivar a flor mais bonita de todas. Ping encheu um vaso com terra de boa qualidade e plantou a semente com muito cuidado. Todos os dias ele regava o vaso. Mal podia esperar o broto surgir, crescer e depois dar uma linda flor! Os dias se passavam, mas nada crescia no vaso. Ping começou a ficar preocupado. Pôs terra nova e melhor num vaso maior. Depois transplantou a semente para aquela terra escura e fértil. Esperou mais dois meses, e nada aconteceu. Assim se passou o ano inteiro. Chegou a primavera e todas as crianças vestiram suas melhores roupas para irem cumprimentar o Imperador. Então correram ao palácio com suas lindas flores, ansiosas por serem escolhidas. Ping estava com vergonha de seu vaso sem flor. Achou que as outras crianças zombariam dele porque pela primeira vez na vida não tinha conseguido cultivar uma flor. Seu amigo apareceu correndo, trazendo uma planta enorme. – Ping – ele disse -, você vai mesmo se apresentar ao Imperador levando um vaso sem flor? Por que não cultivou uma flor bem grande, como a minha? – “Eu já cultivei muitas flores melhores do que a sua” – disse Ping. “Foi essa semente que não deu nada”. O pai de Ping ouviu a conversa e disse: – “Você fez o melhor que pôde, e o melhor possível deve ser apresentado ao Imperador”. Ping dirigiu-se ao palácio levando o vaso sem flor. O Imperador estava examinando as flores vagarosamente, uma por uma. Como eram bonitas! Mas o Imperador estava muito sério e não dizia uma palavra. Finalmente chegou a vez de Ping. O menino estava envergonhado, esperando um castigo. O Imperador perguntou: – Por que você trouxe um vaso sem flor? Ping começou a chorar e respondeu: – Eu plantei a semente que o senhor me deu e a reguei todos os dias, mas ela não brotou. Eu coloquei num vaso maior com terra melhor, e mesmo assim ela não brotou. Eu cuidei dela o ano todo, mas não deu nada. Por isso hoje eu trouxe um pote vazio. Foi o melhor que eu pude fazer. Quando o Imperador ouviu essas palavras, um sorriso foi se abrindo em seu rosto, e ele abraçou Ping. Então declarou para todos ouvirem: – “Encontrei! Encontrei alguém que merece ser Imperador. Não sei onde vocês conseguiram essas sementes, pois as que eu lhes dei estavam todas queimadas. Nenhuma delas poderia ter brotado. Admiro a coragem de Ping, que apareceu diante de mim trazendo a pura verdade. Ele foi ‘honesto’! Vou recompensá-lo com meu reino inteiro e torná-lo imperador deste país”.
Dom Jacinto Bergmann, Arcebispo de Pelotas (RS)
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