Pe. Lino Baggio, SAC
O que acontece ao ator quando as cortinas se fecham e as luzes do palco se apagam? Para onde vai o palhaço depois que deixa o picadeiro, desfaz a maquiagem e tira a fantasia larga e colorida? Termina o espetáculo, começa a solidão. Não é mais hora de representar ou de estar preocupado em arrancar risos ou lágrimas da plateia. Ninguém mais os vê. Agora é cada um diante de si e ambos diante de Deus.
Iniciar o tempo da Quaresma é retirar-se do palco da vida. É colocar-se a sós e responder, com a honestidade de quem não consegue se enganar, as perguntas que teimosamente rondam o coração humano. Na busca de dar estas respostas para si e para Deus, a pessoa percebe que aí não há lugar para performances ou atuações, muito menos a preocupação em receber vaias ou aplausos. Agora, as protagonistas do espetáculo são a honestidade, a oração e a solidão. É nesta solidão fundamental, descrita por Jesus, como a privacidade silenciosa do quarto, que o ser humano consegue superar os medos, as inseguranças e os traumas que o afligem para mais uma vez redescobrir-se como filho amado de Deus. À medida que cada um consegue desvencilhar-se da necessidade de interpretar determinado papel na busca de ser reconhecido ou respeitado, também se sente mais livre e leve nos relacionamentos com Deus – expresso no exercício da oração, com o próximo – simbolizado na prática da esmola, e consigo mesmo – reapresentado no desafio do jejum.
De fato, não passamos de um punhado de pó. Mas foi sobre este resto de cinza que o Senhor resolveu “apostar as fichas”, derramar o seu amor, depositar todo o seu bem-querer. Quaresma é tempo de conversão. Deixemos cair todas as máscaras! Por mais feios e indignos que nos percebamos, Deus nos ama e deseja contar conosco!
Quaresma, estrada nova a ser percorrida. Nova e velha. Cada ano podemos percorrê-la. Os que andam buscando o Senhor têm convicção de que precisam percorrer caminhos de interiorização, retomar o fôlego, recarregar as baterias e arrumar a casa da vida. Durante cinco semanas somos envolvidos pela atmosfera quaresmal. Quarenta dias! Dias de deserto do Povo de Israel, retiro de Jesus nas terras áridas, nosso tempo de atravessar uma parte do tempo da vida.
Os que andam buscando estrelas colocam-se, com toda singeleza, diante de Deus na convicção de que a força de Deus só pode operar na fragilidade: “lembra-te que és pó, e ao pó hás de voltar”. Pedimos que o Senhor purifique nossos corações para podermos vivenciar e celebrar o mistério pascal, depois da travessia do deserto. Postura de humildade e de esperança.
Também iniciamos a Campanha da Fraternidade 2023 que, neste ano, traz a realidade da fome, tão cruel e presente em nossa sociedade. Por isso, o tema é “Fraternidade e fome” e o lema “Dai-lhes vós mesmos de comer”. Então é hora de aproveitarmos mais esta oportunidade quaresmal para uma conversão plena, e que Deus possa nos orientar e fortalecer para que passemos a realmente viver conforme oramos. Que nossa quaresma não seja burocrática, litúrgica, farisaica, mas que possa nos levar ao encontro de Jesus que também já esteve no deserto fazendo a sua Quaresma.
Vigário Paroquial na Paróquia São Roque – Coronel Vivida
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