Além de terem tido muito menos aulas (presenciais ou remotas) durante a pandemia, os alunos mais pobres ainda enfrentaram as mais diversas dificuldades estruturais – que foram desde a falta de internet e computadores para estudarem a distância até a ausência de água e sabão nas escolas para higienizar as mãos. Segundo o IBGE, a pandemia representou a maior adversidade já enfrentada pelo ensino básico brasileiro.
“A pandemia foi uma catástrofe para a educação básica”, resumiu a pesquisadora Betina Fresneda, analista de indicadores educacionais do IBGE. “Ela acentuou as desigualdades das redes de ensino, as profundas desigualdades regionais de um país continental, as dificuldades de implantação do ensino a distância.”
Segundo a Unesco, o Brasil está entre os países que tiveram o maior período de suspensão das aulas presenciais. Praticamente todas as escolas de educação básica (99,3%) suspenderam as atividades e 90,1% não retornaram no ano letivo de 2020, totalizando uma média de 279,4 dias sem aulas presenciais (sendo 287,5 na rede pública e 247,7 na rede privada).
“A pandemia representou não somente uma crise sanitária de proporções históricas, como resultou na maior adversidade já enfrentada pela educação básica brasileira no que diz respeito à garantia de acesso à escola de todas as crianças e adolescentes dos 4 aos 17 anos”, sustenta a análise do IBGE. “A situação é ainda mais desafiadora para a rede pública, que concentra 80% da oferta na educação infantil e no ensino fundamental e médio. As desigualdades históricas do País foram intensificadas, tanto por fatores internos do sistema de ensino, como sua capacidade de propor atividades alternativas, como externos em função das diferentes realidades de acesso a essas atividades por alunos com distintas características socioeconômicas.”
Pelo menos 10,8% dos alunos que não tiveram aulas presenciais também não receberam atividades escolares. O porcentual de estudantes de 6 a 17 anos da rede pública sem aulas presenciais e sem oferta de atividades pedagógicas foi quatro vezes maior na rede pública do que na privada. Menos da metade das escolas (42,6%) realizou aulas síncronas (ao vivo, com possibilidade de integração entre aluno e professor), sendo que a grande maioria (69,8%) eram da rede privada.
Pouco mais de um terço dos alunos (35,6%) de 15 a 17 anos dedicaram menos de duas horas por dia aos estudos. A incidência de menor dedicação aos estudos, mais uma vez, é maior entre os que frequentavam a rede pública (39,2%) e entre os que possuíam os menores rendimentos.
“O porcentual de alunos que não conseguiu estudar cinco dias por semana chegou a 35% entre os mais vulneráveis”, disse a pesquisadora. “A pandemia foi um desafio para todos, mas afetou profundamente os mais vulneráveis, principalmente por conta da exclusão digital.”
A presença simultânea de internet e computador em casa dos estudantes de 15 a 17 anos foi constatada em 54% dos lares, mas a divisão é extremamente desigual. Entre os alunos das escolas privadas, esse porcentual é de 90,5%; já entre os da rede pública não chega à metade (48,6%). Quando o recorte é feito por raça, mais uma camada de desigualdade surge. A grande maioria dos brancos (67,3%) tinha computador e internet, contra 46,8% dos pretos e pardos.
Mas não é só a exclusão digital que atrapalha. Um porcentual significativo de estudantes de todo o País têm dificuldade de acesso nas escolas a uma das mais básicas estruturas de higiene: uma pia em condições de uso (com água) e sabão. Dados de 2019 revelaram que enquanto praticamente todas as escolas privadas (98%) dispunham dos itens, o porcentual era de apenas 56,2% na rede pública. Ou seja, menos da metade dos alunos da rede pública conseguia lavar as mãos adequadamente dentro das escolas.
“Foi um ano muito difícil para a educação, em que as desigualdades se intensificaram”, resumiu a pesquisadora. “A pandemia pode gerar resultados negativos duradouros, se medidas muito eficazes não forem adotadas.”
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