Uma alternativa defendida por integrantes da Comissão Mista de Orçamento (CMO) é abandonar as emendas de relator-geral, foco da decisão da ministra, para turbinar outro tipo de repasse, as chamadas emendas de comissão, que hoje são pouco utilizadas, mas pelas quais também não é possível identificar os responsáveis pelas indicações. Neste novo modelo, contudo, o Palácio do Planalto poderia continuar a distribuir dinheiro a deputados e senadores em troca de votos no Congresso.
Rosa mandou suspender na sexta-feira todos os pagamentos feitos pelo governo, por meio das emendas de relator, e se disse “perplexa” com o fato de o dinheiro público ser “ofertado” a um grupo de parlamentares sem critérios mínimos de transparência. A decisão foi uma resposta a ações de partidos que questionaram o Supremo após o Estadão revelar o esquema de “toma lá, da cá” montado pelo governo de Jair Bolsonaro. A liminar da ministra foi submetida a julgamento no plenário virtual, onde os demais integrantes da Corte têm até amanhã para decidir se mantêm ou não o veto.
Na CMO, colegiado responsável por definir as regras de como o dinheiro público deve ser aplicado a cada ano, o discurso é o de que é preciso dar visibilidade aos repasses do Orçamento. A solução de acabar com as emendas de relator para privilegiar as de comissão divide o grupo. “Aquilo que está fora do eixo normal de funcionamento da Casa vai ter de ser debatido. Nós temos de ver as correções a fazer, independentemente do que o STF decidir”, afirmou ao Estadão a presidente do grupo, senadora Rose de Freitas (MDB-ES).
COMISSÕES
As emendas de comissão são indicações feitas pelos relatores dos 39 colegiados temáticos da Câmara e do Senado, como de educação ou urbanismo. Essas emendas são coletivas e não exigem a identificação do autor da proposta. A compra de tratores por meio de uma emenda de comissão, por exemplo, seria atribuída a todo o grupo, e não a um parlamentar específico.
Para Rose de Freitas, no entanto, é possível dar transparência a essas indicações com as emendas de comissão. “É só os autores serem signatários das emendas que estão fazendo”, disse ela. A regra atual, porém, não obriga que o deputado ou o senador se identifique.
Diferentemente de outras modalidades, como as emendas individuais ou de bancadas, as indicações de comissões não são impositivas, ou seja, o governo não é obrigado a pagar e por isso há pouco interesse de parlamentares. No Orçamento do ano passado foram liberados R$ 582 milhões a municípios e governos estaduais neste formato. Neste ano, nada.
O vice-presidente da CMO, senador Izalci Lucas (PSDB-DF), é um dos que defendem acabar com as emendas de relator para privilegiar as de comissão. Ele aponta como vantagem o fato de que esta modalidade esvazia o poder do relator-geral do Orçamento, a quem cabe concentrar as demandas de parlamentares por verbas para redutos eleitorais. “Democratizar, descentralizar e dar mais transparência. Essa é a solução que a CMO deve trabalhar”, disse ele.
PRESSÃO
Numa tentativa de evitar que o Supremo vete de uma vez por todas as emendas de relator, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), se reuniu na noite de ontem com o presidente da Corte, Luiz Fux. O encontro foi fechado. Em manifestação enviada na ação relatada por Rosa, o deputado defendeu a manutenção dos repasses e argumentou que a decisão da ministra era “desnecessária, já que existem meios, em especial a cargo dos órgãos de controle externo e interno, para fazer valer o cumprimento das disposições da Lei de Diretrizes Orçamentárias quanto à publicação dos critérios alocativos”.
Órgãos de controle como o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU), no entanto, já admitiram que os pagamentos feitos por estes mecanismos não são transparentes e tornam impossível saber qual político indicou o quê.
Em outra frente para evitar uma derrota no STF, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), apresentou ontem um projeto para incluir critérios de distribuição e identificar o autor das emendas de relator. Ramos argumentou que a suspensão desse tipo de emenda fará com que os recursos sejam destinados para gastos a critério do Executivo, transferindo o poder do presidente da Câmara e do relator do Orçamento para o presidente da República. “O que pode contaminar ainda mais as decisões da Câmara”, disse.
CRÍTICA
Bolsonaro também defendeu ontem a distribuição de recursos a parlamentares via orçamento secreto e disse que Rosa “não foi justa” ao suspender os pagamentos. Para o presidente, não é possível se falar em “barganha” se quem decide como e onde o dinheiro público deve ser enviado é o relator-geral do Orçamento, ou seja, um parlamentar.
“Dizer que nós estamos barganhando… Como eu posso barganhar se quem é o dono da caneta é o relator, o parlamentar?”, questionou o presidente, em entrevista à rádio Jovem Pan Curitiba. “O parlamentar é quem sabe onde precisa de recursos. Não vou discutir a legalidade porque é legal”, acrescentou.
O mecanismo criado no governo Bolsonaro, porém, permite que parlamentares imponham aos ministérios o que fazer com recursos da emenda de relator. A decisão de liberar a verba é do Executivo.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Comentários estão fechados.