Relator do caso, o ministro Marco Aurélio Mello foi o único a votar e defendeu que a Corte declare o ‘estado inconstitucional de coisas’ no sistema carcerário do País. Para o magistrado, nas penitenciárias, ocorre ‘violação generalizada de direitos fundamentais no tocante à dignidade e à integridade física e psíquica das pessoas sob custódia’ e ‘falência estrutural’ de políticas públicas.
O ministro votou também para que o STF obrigue o governo federal a elaborar, em até 90 dias, um plano nacional para superação, em três anos, de problemas como superlotação de presídios e o alto número de presos provisórios. Marco Aurélio propôs ainda a adoção das seguintes medidas:
Adequação das instalações dos estabelecimentos prisionais aos parâmetros normativos, no tocante a aspectos como espaço mínimo, lotação máxima, salubridade e condições de higiene, conforto e segurança;
Separação dos custodiados, a partir de critérios como gênero, idade, situação processual e natureza do crime;
Garantia de assistência material, de segurança, de alimentação adequada, de acesso à Justiça, à educação, à assistência médica integral e ao trabalho digno e remunerado;
Contratação e capacitação de pessoal para atuar nas instituições prisionais;
Eliminação de tortura, maus-tratos e aplicação de penalidades, sem o devido processo legal, nos estabelecimentos prisionais;
Tratamento adequado considerados grupos vulneráveis, como mulheres e população LGBT.
O decano do STF manteve posição adotada em setembro de 2015, quando o tribunal se debruçou sobre o tema e deferiu uma medida cautelar pedida pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347, para adoção de providências contra violações de direitos nos presídios. Na época, o ministro reconheceu uma ‘inequívoca falência do sistema prisional brasileiro’. Cinco anos depois, a Corte se volta ao caso, agora para analisar o mérito da ação.
No voto, o ministro reconhece omissões dos Três Poderes pelo ‘cenário assustador’ encontrado nas penitenciárias. Diz, ainda, que, desde 2015, quando o STF se debruçou sobre o tema, providências foram tomadas, mas são insuficientes para mudar o quadro. “É necessária verdadeira virada copernicana. As condições das prisões ainda fazem do sistema criminal um modelo perverso e agudo de transgressão às normas constitucionais e desprezo a direitos básicos”, afirma o decano.
Ainda segundo ele, a forma como se lida com os presos é ‘dos maiores exemplos de inobservância à Constituição de 1988’. Mello lembra que o quadro ‘não é exclusivo desse ou daquele presídio. A situação mostra-se similar em todas as unidades da Federação’. “Há descompassos tanto na formulação e implementação de políticas públicas quanto na interpretação e aplicação da lei penal. Falta coordenação. O quadro inconstitucional de violação generalizada e contínua dos direitos fundamentais dos presos é agravado em razão de ações e omissões, falhas estruturais, sobressaindo inércia e incapacidade para superá-lo”, observou.
Diante da falta de ações mais efetivas do Legislativo e do Executivo, cabe ao Judiciário propor soluções para solucionar o problema, acredita o ministro. “Eis o que se espera do Tribunal Constitucional, visando suplantar o quadro de inconstitucionalidades do sistema prisional: assentar a omissão das autoridades públicas, incentivar a saída do estado de letargia, determinar a formulação de políticas públicas e provocar a deliberação política e social, assegurando a efetividade das normas constitucionais e a integração institucional”, defendeu.
Outra proposição feita pelo ministro foi a de que os Estados e o Distrito Federal também formulem, a partir de um plano do governo federal, iniciativas próprias para superação, em no máximo dois anos, do estado de coisas inconstitucional.
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