Ao todo, o estudo analisou 2,58 milhões de testes PCR referentes a mais de 380 mil adultos, entre 1º de dezembro de 2020 e 16 de maio deste ano, quando a variante Alfa, identificada originalmente no Reino Unido, era a principal causa das novas infecções. Os dados foram comparados com outros 811,6 mil testes de quase 359 mil adultos, coletados entre 17 de maio e 1º de agosto, já com a predominância da Delta.
Os resultados apontam para a eficácia de ambos os imunizantes contra a variante descoberta originalmente na Índia, após a aplicação das duas doses dos dois imunizantes. O estudo se limitou à análise de pessoas maiores de 18 anos. No caso da vacina produzida pela Pfizer, foi encontrada eficácia de 94% contra a Delta 14 dias após a aplicação da segunda dose. Esse índice caiu ao longo do tempo, chegando a 90%, 85% e 78%, quando passados 30, 60 e 90 dias.
A mesma tendência foi encontrada para a vacina da AstraZeneca, que 14 dias após a aplicação da segunda dose apresentou uma eficácia de 69% contra a Delta. Com uma queda menos abrupta, este índice chegou a 61% passados 90 dias depois da segunda aplicação.
Carga viral é maior, mesmo entre os vacinados
Outra descoberta do estudo foi a de que a carga viral entre pacientes infectados pela Delta, mesmo após receberem as duas doses da vacina, era muito maior do que aquela encontrada entre os casos de infecção pela Alfa, por exemplo. Ainda não é claro o que isso significa exatamente, mas uma das implicações é a confirmação de que a Delta é altamente mais transmissível do que outras formas do vírus.
A pesquisa também apontou que indivíduos já imunizados e que foram previamente infectados pela covid-19 apresentaram mais proteção contra o vírus do que aqueles que nunca haviam contraído a Sars-CoV-2. A diferença foi de 88% para 68%, entre aqueles imunizados com a Astrazeneca; e de 93% para 85% entre quem recebeu as duas doses da Pfizer.
Ambos os imunizantes também oferecem mais proteção às pessoas mais jovens, de acordo com o estudo. No caso da Pfizer, a eficácia caía de 90% para aqueles entre 18 e 35 anos, para uma taxa de 77% entre quem tinha de 35 a 64 anos. Para a Astrazeneca, as taxas variaram de 73% a 54% nas ambas faixas etárias, respectivamente.
Debate sobre 3ª dose ganha força
O aumento de infecções e óbitos entre idosos já vacinados – como foi o caso do ator Tarcísio Meira, que morreu aos 85 anos na semana passada – levou o Ministério da Saúde a avaliar a aplicação de uma 3ª dose em grupos mais vulneráveis, como idosos. Nesta quarta-feira, 18, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendou que o governo federal considere essa estratégia para quem tomou a Coronavac.
“Uma vez que essa é uma tendência da população geral, dar um reforço pode ser algo significativo, principalmente para essa faixa etária”, aponta Luana Costa, professora de microbiologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “A gente nunca vai saber, na verdade, se a 3ª dose é necessária ou não. No cenário de incertezas, o que a gente quer é interromper a circulação do vírus e a criação de novas variantes, e essa medida pode ajudar.”
Ela alerta ainda que, tanto a dose extra como a antecipação da segunda aplicação para pessoas dos 30 aos 60 anos são necessárias com o avanço da Delta. “Pensar nas duas frentes é fundamental para evitarmos o espalhamento desta e de outras variantes.”
Outros países – como Israel, Chile e Uruguai – já começaram a adotar essa injeção de reforço. Nesta semana, o governo americano também anunciou que vão aplicar essa dose extra na população a partir de setembro. Os Estados Unidos têm sofrido com uma alta de infecções e voltou a superar o patamar de mil mortes diárias.
Especialistas se dividem sobre a estratégia de aplicar uma 3ª dose da vacina no Brasil. Parte dos médicos e cientistas fala em risco de mais infecções diante de uma queda da proteção vacinal. Já outros acreditam que a melhor medida é ampliar a parcela da população adulta vacinada e, assim, reduzir o contágio. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já se posicionou contrária à injeção de reforço, sobretudo pelo fato de uma grande parte dos países – como na África – ainda estarem no início de suas campanhas de vacinação.
Imunidade de rebanho ainda distante
Mesmo antes do estudo divulgado pela Universidade de Oxford, especialistas em saúde afirmam que a imunidade de rebanho para o coronavírus é uma realidade ainda distante, se é que ela um dia chegará. “A gente ainda estuda se é possível atingir isso para os coronavírus já existentes ou para vírus respiratórios de forma geral. É uma questão que está aberta”, explica Luana. “O fato de existirem variantes só demonstra que precisamos de outras ferramentas da contenção do vírus. E que só a vacinação, pelo menos nesse estágio em que o mundo está, não é por si só suficiente.”
Rodrigo Stabeli, pesquisador e diretor da Fiocruz em São Paulo, afirma que ainda é muito cedo para pensarmos em imunidade de rebanho, principalmente quando o Pàís tem menos de 30% da população total com a vacinação completa. “Alguns países fizeram essa projeção e erraram”, alerta. “Israel, EUA e o próprio Reino Unido mostraram que, mesmo com uma grande proporção de vacinados, a doença ainda está circulando e o contágio ainda tem efeito nos óbitos e nas hospitalizações, porém em proporção muito menor quando comparamos com os não-vacinados.”
Ele também defende a adoção de medidas não-farmacológicas para a contenção do coronvírus e diminuição da tranmissibilidade, principalmente no cenário em que a Delta se faz presente. “Precisamos de políticas coordenadas, como o bloqueio de lugares com alto surto da variante e a recuperação econômica, para que as pessoas tenham incentivo de não se movimentarem nesse momento”, aponta. “Mas o que a gente acompanha no País agora é uma política desorganizada pela presidência da República.”
Para Monica Levi, presidente da Comissão de Revisão de Calendários e Guias da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a pesquisa divulgada pela Oxford acusa principalmente a importância de os jovens tomarem cuidado ao transmitirem a doença, especialmente se tiverem contato com pessoas idosas, imunossuprimidas ou com comorbidades. “Algumas vacinas não têm a capacidade de esterilizar, que é interromper a capacidade do indivíduo de transmitir o vírus. O ideal é que todos estejam esterilizados, mas nesse momento da pandemia não é isso que estamos buscando, e sim proteção contra a morte e quadros graves.”
Todos eles, entretanto, são unânimes ao afirmar que os quatro imunizantes disponíveis no Brasil devem ser tomadas e ajudam a diminuir os quadros graves e óbitos em decorrência da covid. “As novas variantes sempre vão surgir e sempre pode existir um escape imune”, diz Monica. “Pode haver a perda de proteção contra quadros leves e infecção, mas todas as vacinas têm demonstrado, mesmo com as novas cepas, altas taxas de proteção à morte.”
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