Enquanto ficou sem emprego, Silva pagou as contas com o dinheiro que recebeu da rescisão do contrato. Tentou vaga na aviação executiva, mas o segmento também havia sido atingido pela crise. Colocou como prazo julho deste ano para conseguir um emprego no setor aéreo. Se não conseguisse, planejava reabrir a escola de música do seu pai e mudar de carreira.
No fim de maio, no entanto, foi chamado para um processo seletivo na mesma empresa que o demitira no ano anterior e acabou sendo recontratado em 5 de julho – poucas semanas antes de vencer o prazo que havia se dado.
O comandante é um dos 92 tripulantes que a Latam Brasil contratou neste ano. O número corresponde a apenas 3,4% dos 2,7 mil demitidos pela empresa em 2020, mas indica que o setor começa a se recuperar – uma boa notícia para os tripulantes.
Em agosto de 2020, quando Silva foi demitido, foram transportados pelo Brasil 2,2 milhões de passageiros, apenas 28% do registrado um ano antes. Apesar de baixo, já era uma melhora significativa quando comparado com os 400 mil de abril do ano passado. Agora, esse número já ronda a casa dos 5,9 milhões.
“Na quarentena, tinha a sensação de que estava descendo de um navio num bote salva-vidas. A rescisão era esse bote com um furinho, porque todo mês saía dinheiro dali e tinha de continuar. Mas eu imaginava que ia voltar (a pilotar). Só não sabia quando”, conta Silva.
Além dos tripulantes que ficaram sem emprego, outros milhares ficaram sem salário no ano passado, apesar de manterem o vínculo com as empresas. Na Azul, dos 13,8 mil funcionários, 11,7 mil aderiram a um programa de licença não remunerada.
A empresa não divulga quantos ainda estão nessa situação. Na Gol, considerando apenas tripulantes, foram 2,1 mil em regime semelhante – de um total de 5,2 mil que se tinha à época. Outros 47 entraram no programa de demissão voluntária.
Piloto há quase 13 anos – 10 deles na Azul -, Raphael Scalzaretto, de 37 anos, ficou de licença não remunerada por dois meses no ano passado. Inicialmente, não queria aderir ao regime, mas acabou cedendo ao ver que a situação era crítica. Nesse período, viveu com a poupança que havia guardado, se desfez de um carro e negociou na escola dos filhos para postergar o pagamento das mensalidades.
Quando voltou ao trabalho, ainda em meados de 2020, a realidade era bem diferente da anterior à pandemia. No começo, voava de cinco a dez horas por mês. Teve mês em que realizou um único voo e, com isso, a remuneração variável continuou quase nula.
Os primeiros sinais de melhora, ele viu no fim do ano, quando voou 45 horas por mês (antes da pandemia, chegava a 75 horas). No último julho, finalmente pode comemorar a realização de mais horas de voo do que antes da pandemia. A tendência, porém, é que haja uma queda agora, dado que acabou o recesso escolar, diz Scalzaretto.”Ainda não é o cenário perfeito, até porque a economia está muito mexida, o dólar, alto. Mas a incerteza que a gente tinha há um ano passou. Não tenho mais aquela insegurança de que vou ficar desempregado no mês que vem.”
Luis Gago Jr., de 49 anos, chegou a ser demitido há um ano. Ele trabalhava em Omã, na Oman Air, e o país fechou completamente os aeroportos para tentar controlar a pandemia. Voltou em outubro para o Brasil, onde ainda tinha um contrato com a Gol – havia pedido uma licença não remunerada em 2016 para viver um período no exterior.
Gago Jr. conseguiu manter seu vínculo com a Gol, mas voltou a voar apenas em julho. Ainda tem trabalhado pouco quando se compara com o pré-pandemia – cerca de 50 horas por mês. Mas já é um começo para quem chegou a ficar meses longe da cabine do avião. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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