Por um mundo com menos “roqueiros” no Dia do Rock.

Paulo Argollo

Já aconteceu com todo mundo que toca numa banda de rock. Você está numa festa onde não conhece quase ninguém. Alguém chega e puxa papo com você, papo vai, papo vem. Surge o assunto música e você comenta que toca numa banda de rock e tal. No ato, sempre tem uma senhora que est[a ali ouvindo a conversa e já manda de cara a célebre frase: “Nossa, então você está odiando as músicas que estão tocando aqui, não é!? Aqui o pessoal só gosta de sertanejo…”. Sem conseguir evitar um suspiro de desânimo você se limita a dizer que na verdade gosto bastante do Chitãozinho e Xororó, que é o que estava tocando no momento, e que gosta de música boa, seja qual for o gênero.

Todo mundo que tem predileção pelo rock n’ roll, mas que gosta de música de maneira geral, certamente já cansou de passar por conversas desse tipo. Comecei falando isso porque sempre tendo a rejeitar o rótulo “roqueiro”, e esse sentimento tem aumentado cada vez mais, mas não tem como eu evitá-lo. Por mais que eu ame escutar muitas coisas diferentes, o coração bate diferente quando tem aquela guitarrinha suja, aquele baixo pesado e uma bateria cavalar. E, desde os 13, 14 anos, foi o rock n’ roll que moldou boa parte da minha personalidade. E é aqui que eu quero chegar.

O rock mudou minha vida, mas não foi só com a música. Foi com palavras, desenhos, fotografias… com ideais e princípios. Eu colecionava revistas e mais revistas que contavam as histórias das minhas bandas favoritas entre páginas com letras traduzidas e pôsters de duas páginas. Também lia livros que meus heróis citavam esporadicamente em entrevistas. Enfim, não foi só o meu gosto musical que o rock moldou, mas também a minha personalidade.

À medida que fui conhecendo mais sobre o rock n’roll, mas tomava predileção pelo punk e me encantava com o viés de contestação e inconformismo atrelado ao estilo. Na verdade, o rock de maneira geral sempre foi subversivo. Claro, foi moldado e embalado para ser facilmente consumido. Mas as apresentações explosivas de Jerry Lee Lewis, as danças sedutoras de Elvis, não estavam de acordo com o que a sociedade considerava aceitável. Em seguida os Beatles deixaram o cabelo crescer além da conta, falaram sobre drogas, falaram sobre paz e contra a guerra do Vietnã, veio o movimento hippie, depois o punk… em outras vertentes também sempre houve posicionamento contra o establishment. Por mais que o heavy metal, o progressivo e até o pop versasse pro temáticas mais variadas, muita gente se posicionava enquanto artista.

O dia 13 de julho marca o Dia Mundial do Rock , por conta do Live Aid, que aconteceu neste dia em 1985, um mega show com os maiores nomes do rock mundial, com o objetivo de arrecadar dinheiro para combater a fome na Africa. Isso é muito legal porque, além de ser um ato de bondade, participar de um evento assim também é um ato político, onde você se posiciona dizendo, vamos nos unir e fazer as coisas acontecerem independente de governos e etc.

Há de se dizer que o rock em todas as suas vertentes nunca foi lá muito exemplar. Afinal sempre foi um espaço de brancos e homens. São raras as bandas de destaque com integrantes negros, mulheres ou gays assumidos, entre o metal e o progressivo principalmente. Voltando ao início do texto, é neste ponto que sou tão resistente a assumir o temo “roqueiro” para mim. Eu amo o rock n’ roll, amo tocar, expor minhas ideias e sentimentos nas músicas que componho. É como eu me posiciono a favor e contra seja lá o que for que eu queira dizer. Me decepciona e entristece ver que alguns artistas que eu admiro se posicione reforçando este comportamento machista e conservador, caras como o John Lydon, que já gritou a favor da anarquia no Reino Unido, atualmente apoiando seres repugnantes como Donald Trump.

Aliás, é uma coisa que eu nunca vou entender é essa coisa de roqueiro conservador. O roqueiro conservador pra mim não entendeu nada e nem devia ser chamado de roqueiro. É verdade que muito do rock é diversão  Eu mesmo toco numa banda pra me divertir, não ganho dinheiro com isso, mas não consigo sequer cogitar deixar de tocar por causa disso. Mas além da diversão, o rock n’ roll em sua essência é contra o autoritarismo, contra a violência, contra a desigualdade, contra o abuso de poder, é contra! Em pleno 2021, com gente morrendo aos montes e com o governo vomitativo que se apresenta, mais do que nunca precisamos desse lado do rock. O rock n’ roll em sua essência nunca foi tão necessário.

HOJE EU RECOMENDO

Disco: Kick Out The Jams

Artista: MC5

Ano de lançamento: 1969

Nada melhor para o Dia do Rock. Disco seminal para o movimento punk e para o rock de protesto. Música boa e com muito a dizer, discursos que valem ainda hoje.

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