“Temos uma preocupação com a Olimpíada por ser na Ásia, neste ano. Lá tem muita aposta, a Ásia é o centro mundial das apostas esportivas. É cultural deles”, disse ao Estadão o diretor jurídico do COB, Luciano Hostins. “A manipulação de competições ligadas às apostas é considerada no meio desportivo mundial uma das maiores ameaças à integridade do esporte. Não seria diferente no contexto dos Jogos Olímpicos.”
Como os esportes olímpicos ainda não são o principal alvo dos manipuladores, o COB se inspirou no futebol para elaborar a sua Política de Enfrentamento à Manipulação de Resultados. Para tanto, recorreu a conhecido especialista do futebol brasileiro. Paulo Schmitt, com história de 12 anos no Superior Tribunal de Justiça Desportiva da modalidade e presidente do Comitê de Integridade da Federação Paulista de Futebol, ajudou a elaborar o documento.
“Sabemos que há uma incidência gigantesca de problemas de manipulação de resultados no futebol no mundo inteiro. Mas já temos notícias e indícios fortes de que os manipuladores estão migrando para outros esportes. É algo que preocupa o COI (Comitê Olímpico Internacional), que criou o seu código contra manipulação. E agora o COB tem essa preocupação por conta dos Jogos de Tóquio”, afirmou ao Estadão Schmitt, que lembra dos riscos de lavagem de dinheiro em alguns casos.
Para o especialista, a chegada de empresas de apostas online no Brasil também é uma preocupação. “O nosso mercado e a nossa legislação deixam a desejar. Não está totalmente regulado. Já cheguei a encaminhar propostas no momento em que o decreto estava sendo elaborado. O decreto não tinha menção à integridade, por exemplo.”
Ao mesmo tempo, estas empresas devem atuar como parceiras do COB. “Elas são parceiras porque são vítimas também. Quando um cara aposta, eles têm que bancar. E há outras empresas que prestam serviço aos sites de apostas para detectar manipulação de resultados analisando o comportamento das apostas”, explicou Hostins.
O COB prevê parcerias também com entidades e órgãos de investigação, como a Polícia Federal e a Interpol. A Política de Enfrentamento à Manipulação de Resultados vai contar com um comitê especializado para investigar as denúncias. “É algo difícil, mas precisa ser feito. Vamos usar os recursos do próprio COB, com as limitações naturais de um ente privado”, afirmou o diretor jurídico.
Dependendo da investigação, o caso poderá ser encaminhado para autoridades policiais, que têm mais recursos para investigação. “As normas do COB podem levar à suspensão e ao afastamento. Mas as autoridades poderão abrir um processo criminal por fraude que pode levar o infrator à detenção.”
Entre os esportes olímpicos, o tênis é um dos que vem registrando o maior número de casos de manipulação nos últimos anos. A demanda é tanta que as principais entidades da modalidade no mundo formaram a Unidade de Integridade do Tênis (TIU, na sigla em inglês). Um dos casos investigados pela TIU foi o do brasileiro João Souza. Feijão, como é conhecido, acabou sendo banido do esporte profissional e multado em US$ 200 mil (quase R$ 1 milhão) no início de 2020.
A nova política do COB se baseia em três pilares: educação, denúncias e inteligência, e adequação de normas. Por isso, atletas e dirigentes de todas as modalidades olímpicas terão acesso a uma cartilha com orientações para a Olimpíada. No futuro, também haverá cursos e palestras sobre o tema. Ao mesmo tempo, a entidade trabalha na elaboração de Código de Prevenção e Combate à Manipulação de Competições próprio.
“O COB tem por atribuição proteger os valores olímpicos e o combate à manipulação de partidas, assim como o combate à dopagem no esporte, é um dos pontos de atenção que assumimos como prioritária no Brasil apoiando esta importante iniciativa do COI”, afirmou Paulo Wanderley, presidente do COB.
A iniciativa da entidade brasileira já recebeu elogios do COI. “Saudamos o Comitê Olímpico do Brasil pela adoção da política de combate à manipulação de competições, baseada na estratégia de três pilares da Unidade do Movimento Olímpico. Esperamos continuar a apoiar o COB no desenvolvimento de atividades relevantes, na adoção de normas e no desenvolvimento de atividades de sensibilização e inteligência”, disse Friedrich Martens, chefe da Unidade do Movimento Olímpico na Prevenção da Manipulação de Competições do COI.
DENÚNCIAS – Para fazer denúncias de manipulação de resultados, é possível entrar em contato com o COB pelo próprio site oficial, na área de Transparência, ou por telefone (0800-512-6666) e e-mail (compliance@cob.org.br). De acordo com a entidade, estes canais de comunicação são “independentes, sigilosos e imparciais”, funcionam 24 horas por dia e podem ser usados pelo público interno ou externo.
Durante a Olimpíada de Tóquio, que começará no dia 23, foi criado um canal específico para a missão brasileira, com outros contatos: 0800 600 0197, (31) 98947-7889 (Whatsapp) e www.ouvidordigital.com.br/cob.
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